A África na literatura para crianças: por uma estética do cabelo
A África na literatura para crianças: por uma estética do cabelo
Ninfa Parreiras
De origem, de influência, de temática africana, o certo é que há uma literatura que tem abordado a África e tudo o que pode se atribuir a ela: a diversidade, a multiculturalidade, as etnias, as tradições milenares, as artes, a culinária, os rituais… Mas para falar da África, de uma cultura multifacetada, não podemos esquecer que falamos de um continente antigo, com extensões gigantescas, de tradições culturais variadas, de muitos países, povos, línguas, dialetos, tribos, religiões. A África são muitas Áfricas! A África são muitos povos!
A produção de obras literárias para crianças e jovens se insere no que podemos chamar de um mercado editorial, em que os editores produzem para atender ou criar demandas. E os professores e pais e outros adultos adquirem as obras, por compra ou empréstimo, até que o livro chegue às mãos dos pequenos. Na verdade, há uma grande feira de livros, onde podemos escolher o que há de melhor para as nossas crianças.
Há textos de autoria de escritores africanos, cuja temática principal não é a África; há outros com abordagens étnicas e culturais sobre esse continente. Dentre os textos de autores brasileiros, alguns privilegiam a África, outros trazem personagens negras e situações bastante estereotipadas sobre o povo africano.
Em 2003, no Brasil, foi decretada a lei federal nº 10.639, que mudou a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), ao estabelecer a obrigatoriedade do ensino e transmissão de cultura africana e afro-brasileira nos estabelecimentos de ensino públicos e privados de todo o País. Há debates a favor e contra essa decisão, com receio de que haja mais segregação ao se destacar a história do povo negro de outros temas curriculares. Além disso, o sistema de cotas implantado no Brasil trouxe, à discussão, a participação de negros e pardos na vida socioeconômica brasileira. Logo, há vagas garantidas nas universidades para negros e pardos. Como essas questões educacionais e sociais podem ter interferido na produção editorial de livros para a infância com foco na África?
Nitidamente, esses movimentos aqueceram a edição de livros infantis literários e informativos, o que pode ser verificado na produção recente nacional. Muitos livros, brasileiros e traduzidos, têm circulado nas feiras e livrarias dedicadas ao setor. Alguns deles com o cuidado que os leitores merecem: informações sobre o país africano, o povo a que se refere a história, por exemplo.
Outros livros, sem maiores cuidados, trazem a África como uma unidade cultural, com conhecimentos rasos e superficiais e, muitas vezes, preconceituosos. A produção caracterizada como literatura afro-brasileira, o que seria? A literatura feita por autores negros? A literatura que aborda a África? A literatura que desenvolve o hibridismo entre Brasil e África? Na África não há apenas uma religião, nem podemos afirmar que os orixás são deuses africanos ou que os cultos nagôs ou yorubanos são os principais do continente africano. Não podemos, tampouco, tratar as línguas que vieram para o Brasil como dialetos. Sabemos que havia dialetos lá, mas o que veio para o Brasil foram línguas (a exemplo da nagô, quimbundo, umbundo, mandinga).
Os negros que desembarcaram na Bahia, por exemplo, são de origem e cultura diferentes dos que desembarcaram no Rio de Janeiro ou em Pernambuco. Sorte a nossa! Isso engrandeceu a herança cultural que devemos a eles (religião, língua, oralidade, hábitos, habilidades corporais, plásticas e musicais…).
É lamentável que em muitos recontos, histórias e textos de informação dirigidos ao público infantil essa diversidade se perca e venha como um único produto descendente negro. A África está além da nossa capacidade de conceituação, exatamente porque as culturas são dinâmicas e interativas. Entendemos que afro-brasileira é toda produção cultural nossa, nacional, brasileira. Afinal, somos todos filhos da África!
Fomos constituídos também pela cultura africana, além da europeia e da indígena. Não recebemos influências dos africanos aqui aportados. Eles também constituíram os brasileiros, assim como os indígenas, os portugueses e outros povos. Melhor seria chamar esta produção editorial de literatura de herança, de temática africana. Assim, seríamos mais justos com a riqueza cultural africana e com as variações brasileiras de traços oriundos do Velho Continente Africano.
Como a literatura infantil tem suas raízes na oralidade folclórica de diferentes povos (a exemplo dos contos de fadas), no Brasil isso não é diferente. A nossa literatura dirigida à infância nasce e se consolida com traços do folclore nacional, de culturas variadas, como a africana, a indígena, a portuguesa, a árabe. Monteiro Lobato foi genial ao inaugurar uma literatura voltada às nossas origens e ao que há de mais autêntico no hibridismo cultural do qual fazemos parte.
A estética do negro tem sido explorada nas edições de livros para a infância, principalmente, a cor da pele e o tipo de cabelo: crespo. Seriam dois traços característicos dos povos africanos? Seriam exclusivos deles? Sabemos que há povos brancos e árabes no continente africano. A estética negra que aparece nos livros merece um estudo na tentativa de entendermos que identidades estão presentes nessas construções de personagens na literatura infantil. E que a identidade dos africanos não fique presa a determinados traços de pele e de cabelo. Por que o apelo visual e a aparência são recursos de afirmação identitária?
Num mundo de nítida valorização do corpo e das aparências, o apelo às características negras, como o cabelo crespo e a pele escura, pode ser uma conquista para a evidência do ser negro. Pode ser também uma abordagem reducionista e preconceituosa, se não for tratada como parte de uma diversidade.
Que venham os livros de histórias ilustradas, de contos, de novelas, nos moldes da produção do pioneiro autor Joel Rufino dos Santos, também historiador, que começou a publicar na década de 70 do século passado, ainda quando se formava a literatura infantil contemporânea que hoje conhecemos. Em sua obra, Joel tem primado pelo respeito à oralidade, que é marca da tradição cultural africana e dos povos que dela herdaram características de linguagem. Além disso, dá voz a personagens do povo brasileiro, a outros folclóricos, sábios de uma cultura popular de raízes africanas. Deixamos aqui umas palavras do consagrado Mia Couto sobre a África:
“Este Continente é, ao mesmo tempo, muitos continentes. A cultura africana não é uma única, mas uma rede multicultural em contínua construção.”
O teu cabelo não nega
Vânia Salek
Quem nunca ouviu falar nas tranças de Rapunzel? E que a força de Sansão estava nos seus cabelos? Algumas situações nos provocam arrepios, outras nos deixam de cabelos em pé!
Pois essa é a linguagem dos cabelos, que nos diz tantas coisas. É claro que os cabelos não falam pelos cotovelos: na maioria das vezes se expressam pela maneira como são penteados ou cortados.
Os romanos, por exemplo, raspavam a cabeça dos prisioneiros que eram feitos escravos, assim como os nazistas faziam com os prisioneiros dos campos de concentração. Em ambos os casos, a cabeça raspada era um sinal de inferioridade na hierarquia social.
Por outro lado, em algumas religiões, manter os cabelos curtos ou raspados representa um sinal de devoção e humildade. Entre os antigos egípcios, por exemplo, prescrevia-se a depilação total, pois eles temiam que seus cabelos pudessem ser usados em feitiçarias.
Já Luís XIV (1638-1715), rei da França, tornou-se conhecido pelas perucas extravagantes, símbolo de luxo e opulência. Essa moda lançada por ele prolongou-se por cerca de 150 anos, tanto nas cortes europeias quanto nas colônias do novo mundo.
Para as mulheres da Idade Média, não cortar os cabelos era uma demonstração de castidade.
Na década de 1960, o conjunto inglês The Beatles causou frisson por causa de sua música inovadora e… devido ao penteado de seus componentes. Logo em seguida foi a vez dos hippies: seus longos cabelos eram uma forma de protesto contra a rigidez dos costumes; eram um símbolo de liberdade.
Nessa mesma época, as vastas cabeleiras tornaram-se uma marca do Poder Negro (Black Power) – movimento surgido nos Estados Unidos, cujos objetivos, dentre outros, eram enfatizar o orgulho étnico e combater o preconceito contra os negros.
Talvez por isso os cabelos também estejam presentes na literatura infantil, em alguns dos livros que procuram abordar as semelhanças e diferenças entre etnias. Afinal de contas, o cabelo imprime uma marca e, de um modo geral, pode diferenciar homens de mulheres.
E o mundo conta suas histórias
Emilia Machado
Se no nosso imaginário só houvesse lugar para princesas caucasianas, de reinos europeus, estaria mais do que na hora de aumentarmos esse imaginário. O mundo encantado dos contos de fadas pertence a todos os tempos e povos que a humanidade criar.
A festa da princesa, de Elias José (editora DCL), é mesmo uma beleza! Baseado no conto folclórico A princesa de Bambuluá, apresentado para nós pelo folclorista Câmara Cascudo, o autor nos traz uma princesa de modos, moral e conduta de uma verdadeira heroína. Uma mulher que sabe ser firme e, ao mesmo tempo, frágil. Uma princesa encantadora e capaz de nos enfeitiçar do mesmo modo que faz com os outros personagens.
Tarefa nada fácil, no entanto, é convertê-la em imagem. Basta um erro no traço ou uma proposta desgastada para que o encanto se perca. Porém, a ilustradora Rosinha Campos soube manter a magia viva com sua sugestão de uma princesa de pele morena e cabelos cheios e ondulados. Que beleza! A artista soube aproveitar da densa cabeleira negra para delinear a atitude altiva e misteriosamente sedutora da princesa. Seus desenhos aguçaram o sabor da história por todo o percorrer do livro.
Tesoura no cabelo, navalha no coração
Emilia Machado
A divisão social é um tema que recebe o olhar crítico da literatura desde a época dos gregos, com suas tragédias, até hoje. E os textos para crianças estão impregnados desse tema, basta ler os clássicos, as fábulas e as histórias de fadas para constatar que aí está tanto o abominável quanto o louvável das classes dominantes. Reis bons, madrastas más, príncipes tolos, servas trabalhadoras, enfim, representações variadas e cheias de contrastes.
Sonia Rosa, em Palmas e Vaias (ilustrações de Salmo Dansa, editora Pallas), escolhe o caminho do realismo para tratar do tema e fala da experiência de ser negro em um ambiente social predominantemente de brancos. Aqui no Brasil, onde o racismo é negado, essa é uma questão que aos poucos se avoluma, pois se dizia que o nosso problema era de estrutura social, mas não de preconceito. Será?
A personagem sofre, e muito, com a discriminação dos colegas de escola. O marco da consciência da menina sobre sua diferença em relação às outras crianças da escola acontece quando ela corta suas tranças, que usou desde pequena, e deixa seu cabelo solto.
O cabelo, que desde sempre estivera contido nas tranças, depois de cortado, deixou livre os cachos que se aglomeravam num topete. Esse fato serve para catalisar toda a estranheza que uma menina negra podia causar em um ambiente socialmente mais abastado e, em consequência, majoritariamente, de pessoas brancas.
Na mudança do cabelo está tanto a ruptura com a sua infância, como a vontade de se expandir livremente pelo mundo. Quando a menina, aos onze anos de idade, passa a tesoura nas tranças, ela chora como se naquele gesto intuísse que seus dias de inocência ficaram para trás. Entrava na adolescência e, além de toda a afirmação e descoberta de si, ela agora enfrentaria a rejeição por sua diferença étnica.
Cabeça nobre
Emilia Machado
As histórias dessa pequena coletânea (Ulomma: a Casa da Beleza e outros contos, autoria de Sunny, com ilustrações de Denise Nascimento, edições Paulinas) de contos africanos estavam na memória do autor. Ele as ouviu em criança, sempre acompanhadas de música e dança, nas noites festivas da família. Todas elas contêm ensinamentos para os valores importantes da vida.
Dos cinco contos escritos pelo nigeriano Sunny, Ulomma, que dá nome ao livro, se passa em um reino remoto em que o soberano deseja, ardentemente, ter um filho homem para sucedê-lo no trono.
O rei da historia é extremamente poderoso e rico. A narrativa traz aspectos ancestrais que nos fazem lembrar histórias da Antiguidade, como o relato de Moisés, que em bebê foi escondido dentro de uma cesta e lançado ao rio para ser salvo do Faraó.
Enquanto a realeza da princesa de Elias José foi graficamente representada pela cabeleira cacheada, neste conto a nobreza dos personagens está na cabeça completamente nua. Os vastos colares que adornam o pescoço realçam a silhueta marcada pela cabeça bem raspada. Com essa imagem, Ulomma – que significa a casa da beleza – incorpora a distinção real.
Crianças em preto e branco
Mariucha Rocha
Algumas histórias da produção editorial brasileira, quando abordam temas relativos à africanidade, ainda vêm carregadas de conflitos, propondo-se a fazer pequenas denúncias, a marcar as diferenças para mostrar como o negro também é belo, a resgatar suas origens, com frequentes relatos folclóricos e, por vezes, estereotipados.
Se pensarmos sob o ponto de vista da criança de qualquer etnia, poderemos perceber que a construção de sua personalidade se faz pela vivência imediata com seu meio. Seu pensamento se constrói pelo que a sociedade lhe apresenta.
Em 2007, foi publicado pela Companhia Editora Nacional, o livro O cabelo de Lelê, de Valéria Belém. A autora conta a história de uma menina negra que, em conflito com seu cabelo tenta descobrir o porquê de tantos cachos.
Seria essa história o reflexo da miscigenação da população brasileira? A criança negra, personagem central desse livro, parece não identificar suas características físicas com o seu meio. Mas como? Por acaso, seus pais também não teriam cabelos cacheados? Quem seria sua família? Com quem viveria?
Com frequência, uma criança em processo de desenvolvimento, em busca de suas identificações, tende a questionar as suas características físicas. O equilíbrio entre sua imagem interna e externa está associado ao reconhecimento e à aceitação familiar e social.
Para tornar a personagem consciente de si mesma, a autora bem intencionada opta por enviá-la à África, longe de sua rotina. Lá ela se reconheceria em seus pares.
“Depois do Atlântico, a África chama
E conta uma trama de sonhos e medos
De guerras e vidas e mortes no enredo
Também de amor no enrolado cabelo”.
Por quê? A população negra não tem expressividade no Brasil? Só a ancestralidade conforta?
Para acompanhar o texto, as ilustrações de Adriana Mendonça mostram a menina reflexiva em seu canto, no início da história. Após o percurso por inespecíficos países africanos, onde ela descobre múltiplas possibilidades de penteados, o leitor vai encontrar a criança feliz, em harmonia com outras crianças, brancas, louras e ruivas.
Desde épocas antigas o cabelo imprime marcas em variadas etnias, mas será diferente e/ou mais forte com o negro?
Em outra produção para crianças, Kofi e o menino fogo (editora Pallas), Nei Lopes, escritor e grande sambista carioca, aborda também a questão das diferenças, dessa vez sob o ponto de vista do negro. Entre relatos de costumes de alguns países africanos, narra a chegada do homem branco a uma aldeia situada no território onde é hoje Gana.
Pelas imagens da francesa Hélène Moreau, podemos perceber o espanto de duas crianças - negra e branca - que se estranham mutuamente ao se olharem. A curiosidade inerente à criança está impressa no olhar das duas, sem distinção. É possível existir alguém que não seja como eu, que não tenha a pele ou o cabelo como os meus? Parecem refletir.
O imaginário da criança negra frente ao desconhecido está bem retratado pela parceria ilustração / texto. Como seriam os meninos de cabelo amarelo? Teriam jubas como os leões? E os de “pele clara como o milho antes de madurar…”, como seriam? Os desenhos nos revelam o pensamento criativo da criança, suas dúvidas, porém centradas em seus próprios traços.
Posto que negro é negro e branco é branco, as diferenças continuam presentes, mas são ressaltadas pelo autor de forma que nada impeça o convívio entre as etnias:
“Kofi envelheceu… ficou sabendo que os brancos não queimam como fogo…, (e), entre seus melhores amigos, vários são brancos, que também sabem que a pele dos pretos não solta tinta”.
Laços que unem
Tatiana Kauss
Menina bonita do laço de fita (de Ana Maria Machado, com ilustrações de Claudius, editora Ática) é um dos primeiros livros infantis brasileiros a abordar as diferenças e os contrastes relacionados à etnia negra. De forma delicada, a autora apresenta o assunto e encanta crianças de várias idades.
Conta a história de um coelho branco que tenta descobrir o segredo da menina para ser tão pretinha… O sonho do coelho é ter uma filha preta e linda como a menina. Assim, pela fantasia, com um personagem humano e um animal, traz questões do universo adulto e aguça a curiosidade dos pequenos ouvintes ou leitores. Pelas vias da fantasia, a história promove um debate importante para os leitores: o ser negro.
É o coelho quem desperta o questionamento da beleza; as lacunas deixadas pelas respostas inusitadas da menina demonstram certa ingenuidade dos fatos pelo olhar da criança e serão preenchidas por informações dadas ao longo do conto. A estética dos cabelos crespos e a da pele negra ganham relevo, assim como a miscigenação das etnias e a importância da hereditariedade. A obra mostra laços de família e de amizade e também a beleza nos olhos de quem vê.
A ilustração de Claudius valoriza a beleza negra ao mostrar penteados diferentes na menina e na mãe. Com seus desenhos de fotografias de família, agrega ao texto de forma esclarecedora e irreverente.
Quando o coelho entende o mistério da menina bonita resolve se casar com uma coelha pretinha. O resultado são filhotes multicoloridos como o povo brasileiro. Tem, inclusive, a filhota tão desejada… linda, linda e de laço de fita!
Das tranças à raiz
Tatiana Kauss
Era uma vez uma menina. Sua história está no livro As tranças de Bintou (de Sylviane A. Diouf, editora Cosac Naify), obra repleta de cultura dos povos africanos. A pluralidade e a imensidão são características daquele continente, berço de toda a humanidade. No texto, não fica clara a localização da aldeia onde mora a menina, nem que a aldeia está na África. Há lacunas e pequenos detalhes que nos levam a crer que a história se passa na África.
São as ilustrações de Shane W. Evans que situam a história na África Negra e revelam suas riquezas. O colorido do ambiente acompanha a diversidade africana e detalhes explícitos em seus desenhos informam e acrescentam ao conteúdo escrito.
Na narrativa, encontramos muitos aspectos locais, como a alimentação, o vocabulário e os nomes próprios, o papel da mulher, o respeito às gerações anteriores, o reconhecimento da coragem como virtude, o dia a dia do povo e seus costumes, como, por exemplo, o ritual de batismo, onde o nome do bebê é revelado e ele tem sua cabeça raspada no oitavo dia de nascido. Tudo isso contado de forma lúdica enaltece as raízes históricas de todo o continente. Com espontaneidade e sem falar diretamente de África, a autora apresenta em sua escrita ausência de preconceito.
Enquanto sonha com ninhos de passarinhos amarelos e azuis, Bintou encanta o leitor com um olhar próprio do seu universo. A menina deseja profundamente longas tranças, mas, como manda a tradição, seus quatro birotes não lhe saem da cabeça.
Assim se faz presente a questão estética. Apresenta o visual dos cabelos das mulheres sempre ornamentados com pedras, turbantes ou conchinhas em penteados criativos como ponto forte, e também a indumentária colorida e original usada pela comunidade em dias de festa.
Entre birotes infantis e tranças enfeitadas, aprende-se que, por lá, vaidade é coisa para as mais velhas. Crianças podem ser livres desse sentimento e brincar, aprender, fazer amigos, voar.
Era uma vez uma moça brasileira que se chamava Teresa. Essa personagem, não por acaso, passa pela vida de Bintou… faz pensar num Brasil trançado com a África. Esse hibridismo traz a beleza revelada pelas tranças tão sonhadas da menina.
Na África, continente pluriétnico, multicultural e multilíngue, a beleza negra é valorizada. Isso nos mostra que é tempo de repensar o belo em nossa sociedade. A realidade de Bintou não está tão distante de nós, brasileiros, filhos da miscigenação.
A obra nos possibilita ampliar a visão que temos de nossa própria cultura, constituída também pelas diferentes culturas africanas que aqui chegaram séculos atrás. Abre caminhos para falar de diversidade com as crianças, sempre tão curiosas e interessadas pelo passado e pela memória.
Coordenação: Ninfa Parreiras
Pesquisadoras: Emilia Machado, Mariucha Rocha, Vânia Salek e Tatiana Kauss