Páginas em branco: a indústria literária e o livro enquanto objeto
Parto do princípio de que falar em Literatura envolve sempre o reconhecimento do paradoxo que são o silêncio e a solidão compartilhados tanto por quem escreve, quanto por quem lê. O leitor faz-se sempre presente pois é dele a tarefa de continuação do livro: é o responsável por buscarnuma conjugação de passado e presente alguma significação para o minúsculo eu que habita. Porém, o livro que seguramos nas mãos não simbolizaapenas um ato do espírito e, por isso, fujo ao romantismo para tentar compreender a relação do leitor com o livro na sua condição de objeto e como essa relação dialética, em tempos de rápida comunicação, possibilita o surgimento de uma indústria literária estruturada de forma extremamente organizacional e atenta às lógicas de mercado.
O impacto que a evolução tecnológica provoca no acesso à Literatura altera, também, a relação do indivíduo com o livro (enquanto objeto) e a forma como cada qual assume uma identidade específica consoante a interação. A transformação de significado sofrida pelo ato da leitura envolve um processo paralelo de afirmação identitária das próprias editoras enquanto entidades corporativas, com estratégias de diferenciação e marketing que visam o lucro pela venda de versos. O contexto escolhido para analisar tais modificações é o da indústria literária no Brasil, fortemente voltada para o acúmulo de direitos autorais (mais precioso ativo no mercado editorial atualmente).
O “objeto-livro” não deixa de ser uma forma de materialização da cultura na qual reconhecemos signos e símbolos característicos ao nosso contexto de consumo. Quando escolhemos um objeto, optamos também por todas as relações envoltas em sua produção. Não surpreende, portanto, que em tempos de extremismo digital, proliferem as artimanhas em busca de uma aproximação entre o objeto e o contexto. Com as especificidades gráficas e a expansão para outras áreas como, por exemplo, a da distribuição, as editoras buscam formas de manter uma imagem corporativa que permita o sustento dentro do jogo do mercado.
O desenvolvimento digital permitiu a criação dos e-books (livros digitais) e do self-publishing, mas também implica em uma nova prática de leitura e escrita, considerando-se a alteração na natureza do produto e a estas novas práticas associa-se toda uma estrutura de códigos comportamentais no âmbito literário. A transformação do livro em produto regido pelas regras de mercado implica em um controle da Literatura por meio de uma hierarquia de autores, obras e temas que consolidam uma forma específica de se narrar (e construir) a História. O enfoque antropológico na análise da indústria literária permite uma melhor compreensão de sua estrutura, uma vez que a interpreta enquanto sistema organizado e estruturado de práticas referentes a inúmeras redes de microssociabilidade. Não é, necessariamente, um estudo que busque compreender a relação do homem com âmbito organizacional do ramo literário, mas uma tentativa de esclarecer a complexidade e o efeito da mercantilização do livro na produção de significados, uma vez que estes são socialmente construídos.
Em nome da leitura plural e da narrativa livre, é importante questionarmos a bitolação da Literatura em nome do lucro. A dificuldade de publicação por parte de novos autores e a ditadura de temas imposta pelas grandes editoras significam o exercício de um poder ideológico e a instrumentalização do livro enquanto mero ato de consumo. A subordinação da arte ao mercado não é exclusividade dos tempos correntes, mas a produção em larga escala e o totalitarismo da reprodutibilidade característicos ao presente contexto são obstáculos óbvios ao desenvolvimento de novos tipos de Literatura que fujam ao padrão imposto. Considerando-se a divisão do mercado editorial no Brasil em quatro grandes segmentos, é importante relembrar que o ramo jornalístico não será aqui abordado, pois implicaria em um estudo mais aprofundado de mercado e em outros questionamentos ontológicos.
Dentre as inúmeras proibições na colônia antes da chegada da família Real portuguesa em1808 encontrava-se a produção de livros de qualquer teor. Tal fato não gera apenas uma dificuldadede disseminação da literatura nacional, mas impede o desenvolvimento de técnicas, além limitar o ambiente cultural ao pensamento homogêneo. Ainda que a travessia de D. João VI tenha trazido alguns frutos no que tange à diversificação da vida local (principalmente com a criação da Biblioteca Nacional), até 1821 a publicação de livros manteve-se subordinada à censura, com monopólio de produção pertencente à Imprensa Régia. Grande parte dos volumes encontrados no Brasil até a década de 20 encontravam-se ligados ao pensamento europeu e eram, em sua maioria, de autoria estrangeira. Apesar da importação de livros para a elite local, grande parte da população mantinha-se analfabeta.
No Rio de Janeiro e em São Paulo, pólos da produção cultural e política, iniciam-se, após1821, as primeiras edições e impressões locais de qualidade. Grandes livrarias da época, como a Garnier e a Livraria Universal transformaram-se, com o tempo, em editoras reconhecidas que, apesar de publicarem autores nacionais fugiam à publicação de autores pouco conhecidos. Curioso é refletir sobre a manutenção da hegemonia do eixo Rio-São Paulo sob aspectos da vida cultural no Brasil até o tempo presente e o por quê de ainda vivermos os reflexos das perdas e ganhos da exploração do café. A marginalização das produções locais de cidades do Nordeste/ Norte brasileiro continua a existir, assim como na década de 1970 editoras em Recife, Salvador e Porto Alegre tinham sua produção editorial menosprezada frente a São Paulo e Rio de Janeiro. O caso do estado do Piauí é marcante, por simbolizar o esforço realizado pelos autores na publicação de volumes e a completa falta de incentivo estatal à Literatura, seja por meio da educação ou de financiamentos.
Assim como toda e qualquer indústria, o ramo editorial está ligado às circunstâncias políticas e econômicas, além de obedecer diretamente às alterações de câmbio e inflação. A Depressão de1930 tem impacto forte na importação de livros no Brasil, principalmente quando combinada com o governo Vargas, cuja censura era exercida pelo Departamento de Propaganda e Imprensa (DIP). A função exercida pelos órgãos de censura que marcaram a história do livro no país difere pouco:desde a Colônia vivemos a repressão à liberdade de expressão como modo de controle social, assim como durante o Estado Novo e, principalmente, a ditadura militar. Pode-se argumentar que, de certa forma, até a abolição da censura em 1985, a produção literária sofreu grandes perdas e não chega a ser surpreendente que grande parte daquilo que é produzido, até hoje, seja comprado pelo próprio governo.
Ainda que consideremos os movimentos de publicação independentes e as editoras de pequeno porte cujo foco são áreas específicas da literatura, como a Zarabatana Books (publicaçãode HQ’s) e a Patuá (referência em poesia); e o todos os grandes festivais e feiras do livro que ocorrem no país, assombra-me o fato de querermos clientes/compradores e não leitores. A busca das editoras pelo lucro descaracteriza a condição de leitor e desestimula, considerando o preço geral dos volumes, o interesse pela leitura. Em um país onde quase 27% (IBOPE/Instituto Paulo Montenegro) da população é analfabeta, todo e qualquer entrave à Literatura está também ligado ao desenvolvimento do sistema educacional e a todas as suas falhas. O país é retratado como um local no qual a indústria editorial está em expansão, mas enquanto pensarmos em termos de rendimentos e direitos autorais não trabalharemos questões importantes, como as oportunidades conferidas a novas editoras e autores. De forma semelhante às propostas de Zemp (1996) no que se refere ao pagamento dos músicos e retorno dos lucros para as comunidades, o comércio transnacional de livros distancia o autor e o leitor, que passam a vivenciar uma relação de compra e venda. Assim como a indústria internacional de música retém parte do que deveria ser remetido a comunidades em trabalhos de etnomusicologia, as grandes editoras mantém um monopólio sobre a produção literária e seus lucros.
A hierarquização de modelos textuais e temáticos, em conjunção com o sensacionalismo crescente em torno da figura dos escritores leva à questão ontológica sobre a preterência da imagem sob o conteúdo. Apostar nos padrões é excluir a possibilidade de representatividade por meio do texto e adestrar o leitor a limitar-se à leitura de determinadas obras como, por exemplo, os livros de auto-ajuda. O registro da História na Literatura é marcado não só pelo conteúdo temático dos volumes, mas também por suas características técnicas, diretamente ligadas às possibilidades tecnológicas. A ênfase na imagem do autor é simbólica: a Literatura em tempos dominados pelas técnicas audiovisuais e pelo espetáculo é aquela em que a produtividade e a demanda transformam o autor em escravo do mercado e promotor de suas obras.
Relações e situações sociais estão sempre associadas a coisas/objetos que, em sua trajetória, acabam dotados de uma vida social própria e os livros não passam por situação diferente. São agentes a partir do momento em que determinam a construção de identidade e simbolizam mecanismos específicos de regulação social e política que influenciam na escolha dos indivíduos por determinados volumes. A relação existente entre as editoras, o mercado, o produtor (autor) e o consumidor (leitor) é dialética e representa uma dinâmica de sociabilidade que envolve indivíduos e corporações, salientando um comportamento (ou uma preferência) específico. A utilização de Moeran (2005) do conceito de field é interessante, pois retrata a exata dinâmica do mercado editorial no Brasil: uma proposição específica de possibilidades (temática e autores) hierarquizada por meio das funções desempenhadas e posições ocupadas por cada ator nas relações estabelecidas. A sobreposição de fields é nítida quando consideramos a compra de volumes por parte do governo, os efeitos das variações econômicas sob as editoras e os movimentos de coletivos ou indivíduos em busca da publicação independente.
A lógica de funcionamento desse sistema estimula a construção e alteração de significados como o papel do autor, do leitor e a relação estabelecida entre os dois. As relações estruturais (a nível institucional) impactam a sociabilidade a nível individual, além da relação entre o livro e aquele que o lê, alterando toda a percepção que temos do processo de leitura. Se o consumidor no ato da compra leva consigo uma série de relações sociais que alteram a existência daquele objeto, é inegável que o indivíduo também seja influenciado por sua escolha e por toda a rede de significações nela representadas. A manutenção das hierarquias sociais passa, em grande parte, pelo acesso ao capital social e simbólico, o que ajuda a compreender como o alto preço dos livros no Brasil e a manutenção da Literatura como habitus das classes abastadas são mecanismos de retificação da ordem estabelecida e não deixam de representar uma forma de violência simbólica.
Entre o livro-objeto e os e-books: tecnologia e literatura
Analisado o ramo editorial a partir de uma perspectiva organizacional, é impossível escapar aos questionamentos acerca do impacto das mídias digitais na compreensão que temos da Literatura e nas diretrizes assumidas pelas editoras e livrarias envoltas no processo de publicação. As linhas de ação adotadas, em ambos os níveis de análise, representam um processo social ainda em curso e, de certa forma, a percepção que temos do comércio de livros no país. O desenvolvimento do cinema e da fotografia impactaram de forma substancial a escrita, sendo possível reconhecermos inúmeros movimentos literários cujo ângulo de percepção estava associado ao visual. A tão corriqueira fotografia do autor nas abas dos livros foi objeto de insegurança e curiosidade para muitos, que abarcaram a ideia ou que a ela resistiram durante tempos, assim como diferentes autores são reconhecidos pelo uso do imagismo poético. A expansão da Literatura para o meio digital, porém, representa um processo diferente, no qual decorre a mecanização e alteração de objeto e não necessariamente de percepção. O cinema e a fotografia, cada qual a seu modo, possuem tempos diferentes que, para serem compreendidos, necessitam de percepções diferentes. Será o livro digital apenas uma alteração de formato ou também de significado?
O efeito experienciado pelo mercado da música após a digitalização das faixas e discos (diminuição das compras) não é o mesmo registrado pelo mercado literário com a criação dos livros digitais em 1971 por Michael Hart no âmbito do projeto Gutenberg. O lançamento do primeiro e-book em 1993 possibilitou o desenvolvimento de um novo setor no mercado literário mas não garantiu sua expansão. No Brasil, apenas 5% (Instituto Pró-Livro/IBOPE Inteligência) dos leitores entrevistados tem preferência pela versão digital, porcentagem localizada nas zonas mais abastadas do país (Sudeste e Centro-Oeste) o que desafiaa máxima de que a digitalização permite maior acesso à Literatura.
Apesar da adesão de inúmeros leitores à leitura digital, a grande maioria continua ligada acaracterísticas sinestésicas da leitura, associadas ao livro enquanto objeto. As vantagensapresentadas pelos e-books não foram, até o presente momento, suficientes para substituir as páginas amareladas: a suposta diminuição do impacto ambiental (por conta da diminuição no uso de folhas de papel) é facilmente rebatida por conta dos custos ambientais de produção e manutenção de leitores e aparelhos digitais; assim como as facilidades de uso e transporte tornam-se obsoletas quando consideramos a dependência de eletricidade. O aproveitamento do discurso ambientalista é característico a quase todos os nichos de mercado da atualidade e caracteriza a produção de livros digitais por parte das grandes editoras como forma de sociabilidade corporativa na qual as empresas garantem a venda de produtos e uma imagem favorável de si próprias.
Apesar das vantagens e jogadas de marketing utilizadas na promoção dos e-books, não foi registrado, no Brasil, um crescimento constante ou exponencial das vendas (SNEL: Sindicado Nacional dos Editores de Livros). A queda e estagnação nas compras são também apontadas no mercado estadunidense e no europeu, por conta das dificuldades de negociação dos direitos autorais e de conteúdo. O embate entre as editoras e sites de varejo como a Amazon pelo novo mercado demonstra que, apesar da adesão ao novo modelo, o livro tradicional e o digital tendem a conviver, uma vez que atingem a públicos diferentes. Assim sendo, a digitalização pode ser considerada como mudança de formato e de significado, capaz de alterar o processo criativo, que passa a comportar inúmeras formas de interatividade, e o consumo, já que desconstrói a lógica sequencial da leitura e permite o compartilhamento de um ato antes singular por meio do social reading.
O livro-objeto também simboliza uma renovação no conceito de leitura, apesar de apontar para outras direções. O hibridismo destes volumes instiga o leitor por meio do cruzamento entre a linguagem e a estética. O texto representa um produto artístico, estético e cultural quando considerado em toda a sua confluência e flexibilidade. A concepção do livro-objeto permite o reconhecimento do texto enquanto local de encontro entre as artes e de constante superação de limitações de gênero e temática. A relação entre o material e o imaterial resulta na quebra de conceitos enraizados como, por exemplo, a associação entre o livro-objeto e a Literatura infantil.Enquanto o e-book aproxima o livro da tecnologia e funcionalidade, o livro-objeto aparece como forma de resgate da singularidade de cada volume e caminha em direção oposta à massificação característica das edições comuns.
O mercado editorial: retrato cultural
A Literatura brasileira, apesar de seu passado extremamente fértil, sofre de um distanciamento com relação à população que retrata. As dificuldades de acesso ao livro estão intimamente ligadas à concentração da produção e divulgação de autores nos grandes centros, reflexo da desigualdade social e das leis de competição do mercado. Na balança entre a influênciadas estruturas sociais e a agencialidade, se considerarmos a conceituação de ritmo proposta por Ingold & Hallam (movimentos e nuances contidos em uma repetição), é simples compreendermos os movimentos de improviso que surgem por parte de autores e editoras, dado o contexto em que se encontram. O grande problema é que, dada a mercantilização do ramo, a improvisação (que é ato relacional) não encontra grande espaço para fuga dos padrões comportamentais.
O universalismo de padrões estéticos, impulsionado pelo mercado editorial, impede a superação de determinados cânones literários voltados para a criação de uma memória coletiva padronizada que não necessariamente representa as realidades sociais de um país. A diversificação editorial é um processo que reflete a situação política e social, considerando-se a relação entre os níveis macro e micro de análise e a influência das estruturas sociais no comportamento. As editoras independentes, apesar de estranguladas pela legislação e pelos custos impostos, conseguem produzir para além do âmbito das feiras literárias graças à aposta em pequenas tiragens (o que facilita o retorno dos custos) de autores desconhecidos, sem restringirem-se à Literatura anglo-saxã e ocidental.
A ligação entre grandes livrarias e editoras é outro ponto a ser questionado, uma vez que as livrarias tendem a apostar em best-sellers e em volumes cuja venda seja garantida, o que dificulta a entrada de editoras independentes no mercado. A inclusão de livros mais diversificados no catálogo das livrarias é impedida pelo monopólio formado por grandes redes de livrarias (muitas das quais são também editoras) e reflete a forma de organização do mercado editorial brasileiro. O uso do termo cultura corporativa, nesse caso, aproxima-se menos de relações limitadas ao contexto empresarial e mais da forma de organização de um setor composto por inúmeras relações interpessoais sobrepostas e influenciadas pela estrutura transnacional da qual fazem parte.
O caráter dúbio da Literatura, que oscila entre o hedonismo e as relações de poder, caracteriza também uma oscilação entre o individual e o coletivo. O texto figura como registro da alteridade, como forma de encenação do homem e de sua cultura, o que implica em uma constante ressignificação e reafirmação de símbolos e estereótipos por meio do livro. O principal questionamento a que temos de nos voltar é a condição do texto enquanto resultado ou origem de práticas: a relação dialética entre cultura e indivíduo é refletida nas relações assimétricas de poder experienciadas a todos os níveis da sociedade (incluindo suas instituições). As classificações de gênero, estilo e categorias identitárias acabam por limitar o universo das obras literárias e verticalizar práticas de expressão cultural, o que resulta em dicotomias como cultura erudita X popular.
A horizontalização proposta para a Literatura permite compreendermos diferentes fatos culturais e as relações de poder inseridas em uma sociedade, além de enfatizar a linguagem enquanto “sistema modalizante primário” capaz de emancipação do indivíduo. Assim sendo, as limitações impostas pela lógica de mercado ao ramo editorial são uma forma de restrição à escolha individual e ao registro de diferentes formas de expressão, o que constitui poder ideológico e simbólico. Uma análise da Literatura enquanto fato social permite enxergá-la para além do academicismo, enfatizando a mercantilização da mesma e a bitolação do mercado editorial.
A objetificação do livro foi aqui questionada como meio para melhor compreensão do significado da Literatura no contexto do Brasil moderno, assim como a proposta de análise da hierarquização do ramo editorial visava ao reconhecimento da Literatura enquanto instrumento ideológico. O mercado editorial tornou-se uma ampla rede de corporativas que obedecem às lógicas de lucro e competição, além de representarem a dinâmica cultural que caracteriza os tempos correntes. O livro passou por um processo de massificação que sequer o tornou mais acessível, mantidos o alto preço e a concentração geográfica da produção editorial.
Apesar das inovações e projetos que envolvem editoras independentes e novos autores, é inegável uma padronização que perpassa as inúmeras etapas de produção do livro, desde características gráficas até a escolha de temas. Essa aposta no status quo é clássica das redes de sociabilidade que representam as relações entre esferas institucionais e indivíduos nas quais, muitas vezes, o ato de reflexão é substituído pela mera repetição de hábitos e por uma reiteração ideológica e simbólica dos mesmos. Considerando-se que, atualmente, as instituições e organizações possuem grande poder de decisão e influência, é interessante reconhecer até que ponto a produção cultural cedeu espaço à lógica mercantil internacional.
A condição de autor/leitor é alterada de acordo com o mercado editorial e seus desenvolvimentos, principalmente os de ordem tecnológica. A compreensão que o indivíduo possui do livro não está apenas limitada pelo seu habitus de classe, mas também pelas tendências que pertencem à esfera organizacional do mercado editorial, que contribui para o esboço de uma realidade que, não raramente, em nada corresponde às criações textuais recentes, que raramente encontram qualquer tipo de apoio. Dificultar a entrada de novos escritores no ramo editorial é impor um obstáculo à produção cultural e às novas formas de expressão, além de fomentar a ilusão de que a produção literária contemporânea é pouco fértil.
A mercantilização do livro acaba por confirmar a Literatura enquanto pertencente a uma rede de práticas discursivas abrangente, e constitutiva das estruturas sociais. A interação entre autor-obra-leitor está extremamente pautada pela globalização e pelos desenvolvimentos tecnológicos, assim como pela indústria responsável pela distribuição dos volumes. Assim sendo,compreender o mercado editorial a partir da perspectiva das organizações e instituições permite repensar categorias gerais há muito estabelecidas, além de iniciar um debate verdadeiramente aberto acerca das possibilidades da Literatura em tempos modernos.