Pode a educação plurilingue constituir-se como educação antirracista?

Resumo

Neste artigo, propomos um enquadramento comparativo entre diferentes experiências de educação bilingue/plurilingue que tiveram lugar em Portugal nos últimos 40 anos. A análise procura discutir a cultura de educação monolingue e monocultural vigente nas escolas de ensino público, por contraste às intervenções cujas abordagens implicaram metodologias de alfabetização com uso do cabo-verdiano, com resultados no empoderamento dos alunos e famílias envolvidas, numa maior abertura e consciência comunicativa e nas atividades de escrita e leitura. Discutimos, posteriormente, em torno de representações sobre língua de escolarização associada a noções de objetividade, adequabilidade, naturalização, desvio e défice, ligadas a processos históricos de estigmatização linguística e cidadã. Concluímos com uma reflexão crítica sobre a utilização da educação bilingue e das línguas menorizadas, discutindo a sua valência numa abordagem educativa antirracista e por oposição a uma educação monolingue e monocultural.

Introdução

O ensino público em Portugal tem sido palco de abordagens inovadoras ao nível de experiências de educação bilingue/plurilingue nos últimos 40 anos. Enquadradas em projetos nacionais e internacionais, a valência destas experiências reside no reconhecimento de que, nas escolas portuguesas, a constituição de turmas se faz com falantes de português como língua materna, falantes de português como língua não materna e alunos sem proficiência em português. Tal diversidade é integrada nas metodologias de alfabetização– aqui, pelo uso do português e cabo-verdiano, do jardim de infância ao 2.º ciclo, esta última língua tendo sido desvalorizada histórica e socialmente nos espaços de ensino formal.

Todas estas intervenções decorreram em escolas públicas da Área Metropolitana de Lisboa (AML), onde se concentra a maioria de falantes de cabo-verdiano, realizando-se à margem do sistema educativo por se diferenciarem das constrições do ensino e das políticas linguísticas oficiais. Estas experiências demonstraram ainda que, no ensino público, a comunicação em sala de aula acontece predominantemente em português, tida como a única língua de integração e de escolarização, remetendo as restantes línguas ao silenciamento nas aulas, toleradas nos espaços privados/familiares/comunitários, mas percecionadas como bloqueadoras da integração das comunidades. O ensino vigente tem-se, assim, caracterizado por abordagens monolingues em relação a toda a comunidade escolar, ancorando-se em políticas linguísticas não centradas nos falantes, mas em processos de oficialização de normas padrão nacionalizadas com maior prestígio económico. Esta tem sido a base de uma educação supostamente multilingue por centrar apenas no ensino de línguas em modelos monolingues, de diversificação da “oferta de línguas numa escola ou num sistema de ensino específicos, incentivando os alunos a aprender mais do que uma língua estrangeira, ou, ainda, diminuindo a posição dominante do inglês na comunicação internacional”1, mesmo se neste último ponto a evidência tem sido contrária2.

Neste artigo3, propomos um enquadramento comparativo entre as diferentes experiências referidas, cuja relevância reside não no ensino de línguas no sentido estrito, mas na sua utilização como parte integrante de projetos educativos mais alargados de educação bilingue e plurilingue4. Recorremos à consulta de documentos publicados relativos a cada experiência e respetivos arquivos, entrevistas realizadas junto de testemunhas privilegiadas de cada projeto a especialistas em políticas linguísticas em Portugal (total de oito entrevistas), analisando ainda o conteúdo de um evento científico que contou com a participação das coordenadoras de cada projeto e outros participantes5. No final, propomos uma reflexão crítica sobre a utilização da educação bilingue e das línguas menorizadas no ensino, discutindo a sua valência numa abordagem educativa anti-racista e por oposição a uma educação monolingue e monocultural.

Educação bilingue e bicultural com cabo-verdiano

As primeiras experiências iniciaram-se no bairro de construção espontânea 6 de Maio (Amadora), com um primeiro estudo, «Criança Cabo-verdiana: Que Integração?», realizado por Maria Manuela de Duque Vieira e Sousa em 1986-19876. Este estudo consistiu numa comparação entre crianças cabo-verdianas do Centro Social 6 de Maio7 , e dois grupos de controlo, um de crianças cabo-verdianas e portuguesas no bairro da Cova da Moura, e outro de crianças portuguesas num bairro em Lisboa. Em 1997, a mesma autora realizou uma comparação com os primeiros dados do Jardim-de-infância do Centro Social 6 de Maio, «Educação e Minorias Étnicas numa Perspectiva Intercultural – Uma Caminhada de Dez Anos»8.

Posteriormente, no âmbito do Programa Sócrates/Comenius e de uma parceria internacional entre Dinamarca, Reino Unido e Portugal, surge o projeto «Orientações e Práticas Educativas no Jardim-de-infância em Contexto Bilingue» (1998-2000). Em Portugal, a experiência decorreu em dois jardins-de-infância (6 de Maio, na Amadora, e Marvila, em Lisboa), dois contextos com crianças de origem cabo-verdiana, guineense, santomense e portuguesa, que apresentavam dificuldades de aprendizagem semelhantes, independentemente de serem ou não de origem imigrante ou falantes de uma língua materna diferente da língua de ensino na escola9. Todas estas intervenções desenvolveram metodologias educativas de combate ao insucesso escolar através da aplicação de estratégias de educação intercultural e multilingue no ensino pré-escolar.

No concelho de Oeiras teve lugar o Projecto Piloto de Educação Bilingue e Bicultural Pré-Primário e Primário: na Pedreira dos Húngaros (1990-1994) 10, outro bairro de construção espontânea onde 90% eram famílias de origem cabo-verdiana organizadas por fortes redes de apoio familiar e de vizinhança. O projeto envolveu uma turma de 25 crianças de origem cabo-verdiana acompanhadas do jardim-de-infância ao segundo ano do 1.º ciclo, focando no ensino da língua materna e do português como língua segunda em imersão linguística na sala de aula (Baker, 1993: 356-35711). Pretendia-se uma transição mais harmoniosa para a escola primária, momento em que o acompanhamento extracurricular continuou em educação não-formal (3 horas diárias). O modelo pedagógico consistia em três vertentes: 1) desenvolvimento linguístico, cognitivo e afetivo dos alunos; 2) fortalecimento de capacidades educativas e a emancipação cultural e sociopolítica do meio (família e comunidade); 3) democratização, abertura e adaptação das instituições que direta (Centro Social; escolas) e indiretamente (Câmara Municipal, Ministério da Educação, Centro de Saúde, Centro Regional de Segurança Social, Embaixada de Cabo Verde, media) se responsabilizavam pela integração dos alunos.

Duas outras experiências decorreram na investigação-ação Vamos Conversar na Escola – Nu Ben Papia na Skola (2002-2005), seguindo as orientações de ensino intercultural do Conselho da Europa12, a partir de um protocolo entre a Escola Superior de Educação (ESE) João de Deus e o Instituto Pedagógico do Mindelo (IPM). Foram envolvidos educadores de infância, professores do ensino básico e crianças dos 5 aos 12 anos de idade de Portugal e Cabo Verde 13. O foco da intervenção eram crianças de origem ou nacionalidade cabo-verdiana, a maioria oriundas de famílias com baixos rendimentos, apresentando simultaneamente riscos de indisciplina, retenção, abandono escolar e recurso ao trabalho precoce (sobretudo em Cabo Verde). Estes são dois contextos escolares em que o português é língua oficial, mas que ainda hoje apresentam especificidades sociolinguísticas diferenciadas. Em Cabo Verde, as turmas são linguisticamente mais homogéneas, com domínio do cabo-verdiano mas diminutas competências em português à entrada da escola, sendo que os professores dominam a língua materna cabo-verdiana aliada ao português como segunda língua. Em Portugal, o domínio das línguas portuguesa e cabo-verdiana dos alunos é variado, e os professores apresentam competências em português enquanto língua escolar e língua materna, e raro conhecimento do cabo-verdiano. Os conteúdos do projeto foram estruturados em duas vertentes. A vertente Ensinar Conversando dividia-se entre: 1) enquadramento conceptual, reunindo referências para a educação linguística e ensino de línguas, centrando no papel fulcral da conversação no desenvolvimento linguístico e pessoal; 2) planificação em contextos de diversidade cultural, com sugestões de operacionalização, instrumentos e materiais práticos de ensino, guiões de análise e seleção e elaboração de materiais de aprendizagem; 3) investigação para o ensino, com estudos de caso em Portugal e Cabo Verde, incentivando novas iniciativas com professores e educadores. A vertente Aprender Conversando era suportada por ficheiros de imagens legendadas acerca de matérias curriculares nos dois países, incluindo desenhos e textos produzidos pelas crianças.

Entre 2007-2012, surge o projeto Turma Bilingue, no 1.º ciclo da Escola Básica n.º 1 do Agrupamento de Escolas do Vale da Amoreira (AVEVA, Moita). Este projeto foi coordenado pelo então ILTEC14, atualmente CELGA-ILTEC, consistindo numa experiência de alfabetização através de bilinguismo imersivo em português e uma hora de e em cabo-verdiano por dia, onde participaram 28 alunos numa Turma Bilingue (TB), e 29 alunos numa Turma de Controlo (TC) com ensino monolingue em português. Ambas as turmas eram constituídas por alunos de origem portuguesa, cabo-verdiana, guineense, angolana e marroquina, falantes ou não da língua cabo-verdiana, constituindo-se vários grupos sociolinguísticos: alunos inicialmente monolingues em português e alunos com contacto desde a infância com o português e uma língua africana. O objetivo da comparação centrava-se na aquisição de conhecimento em português, noutros campos da consciência linguística e nas atitudes perante as diferentes línguas em presença. Numa segunda fase, surge o projeto Uma Escola Multilingue (2012-2013), numa turma de 2.º ciclo na escola sede do AVEVA, contando com alunos da Turma Bilingue (TB), da Turma de Controlo (TC) e novos alunos (17 alunos no 5.º ano, e 19 no 6.º 15). Em dois tempos letivos da disciplina de Português e num tempo letivo da disciplina de Inglês, promoveu-se a análise linguística contrastiva, metodologias de tradução e pedagogias multilingues incluindo outras línguas menorizadas na sala de aula, principalmente o cabo-verdiano, mas também o romani e o fula. Ao longo dos 6 anos, envolveu-se a comunidade escolar, nomeadamente os pais, professores e funcionários das escolas.

A importância dos diagnósticos

A variedade dos contextos sociolinguísticos de cada intervenção motivou a elaboração de diagnósticos por categorias (pais, professores, funcionários e alunos), identificando os pontos de partida linguísticos individuais e familiares, e potenciais transmissões intergeracionais de uma baixa autoestima linguística (Brizic, 2006). Onde havia grupos de controlo, aplicaram-se provas de seleção linguística e fichas sociolinguísticas a cada grupo, equiparados no seu contexto sociolinguístico16. No bairro 6 de Maio, estes diagnósticos deixaram um conjunto de sugestões e linhas de guia como auxílio a professores e educadores em futuros diagnósticos (Pereira 2006: 75-105). No Vale da Amoreira, foram aplicados testes linguísticos, fichas sociolinguísticas e atividades linguísticas, recolhendo material escrito e audiovisual que permitiu uma avaliação contínua e periódica do progresso dos alunos nas duas línguas e nas suas atitudes linguísticas17.

Combater mitos sobre as línguas maternas

As diferentes intervenções defrontaram-se com a receção inicial de receios dos pais e restante comunidade escolar de que o ensino bilingue, e do cabo-verdiano em particular, prejudicasse a aprendizagem do português dos alunos, mesmo quando as diferentes línguas faladas pelos alunos eram aceites (como no 6 de Maio e em Marvila). Face a tais resistências, na Pedreira dos Húngaros as aulas iniciaram com apenas 30-60 minutos semanais, enquanto no Vale da Amoreira se administrou uma hora de cabo-verdiano por dia – ambas situações longe das condições de educação testadas internacionalmente18. Os projetos focaram-se em desconstruir os medos acerca dos perigos da biliteracia19 com cabo-verdiano, promovendo a consciência sobre o valor positivo das línguas maternas e outras em presença. Especificamente no Vale da Amoreira, trabalhou-se o confronto linguístico entre dois sistemas de escrita diferentes mas próximos, junto dos alunos da TB, esclarecendo a restante comunidade escolar que se pretendia promover uma alfabetização mais rápida e sistematizada, um maior desenvolvimento da capacidade de reflexão metalinguística e de tradução, e a interiorização da ideia de que as línguas são parte integrante de cada indivíduo, podendo ser usadas de forma autónoma e adequadas a diversas situações e intenções comunicativas. Além disso, a valorização da língua menorizada permitiu reforçar o sentimento de pertença (ao grupo de pares, à família, à comunidade) em territórios estigmatizados por representações sociais negativas, e sobretudo desenvolver a sua consciência metalinguística, ou seja, a capacidade de refletir sobre a natureza e funções da língua (Bowey et al 1984).

Produção de materiais e formação desenvolvida

Todos os projetos procuraram uma adequação específica ao contexto de identificação e valorização cultural e linguística, abordando particularidades gramaticais com base nas dificuldades e interferências verificadas, destacando problemas relacionados com concordância, artigos e conjugação verbal, com o propósito de evitar a interferência linguística entre o português e o cabo-verdiano. Os materiais foram produzidos pelas equipas, em colaboração com as crianças, ou ainda com a comunidade, como na Pedreira dos Húngaros20. No bairro 6 de Maio, produziram-se materiais pedagógico-didáticos para uso em sala de aula (jogos de linguagem, livros de estórias, cartazes com diferentes línguas), e avaliação de atividades (vídeos de formação, gravações e análise de produções linguísticas dos alunos)21. No projeto entre Portugal e Cabo Verde, produziu-se material de apoio ao ensino intercultural do português (como língua materna ou não) e de valorização linguística e cultural de cada aluno, complementares a outros materiais didáticos, como gramáticas e referenciais de planificação para o ensino inicial de português como língua não materna. Os métodos centravam-se na expressão de cada identidade e experiência, estimulando a aprendizagem e a motivação para a aquisição de novos conteúdos (aprendizagem reflexiva)22.

Pretendia-se que os resultados dos projetos orientassem educadores e professores sobre a evolução linguística dos alunos, direcionando o ensino para as dificuldades e necessidades de cada criança. Esta foi uma questão central no Vale da Amoreira e no 6 de Maio, com ações de formação junto de pais, professores, educadores, auxiliares de educação e funcionários, pretendendo sensibilizar, definir estratégias e planear atividades orientadas para o desenvolvimento do pluringuismo e educação bilingue. Entre Portugal e Cabo Verde, adaptaram-se modelos teóricos praticados no ensino do português como língua segunda, aplicando o princípio de igualdade entre línguas não pelo prestígio mas pela funcionalidade comunicativa de cada língua em presença (incluindo línguas com sistemas de escrita distintos, ou sem tradição escrita), oferecendo um espaço de legitimidade de prática e aprendizagem em ambiente escolar.23

Limitações na participação das escolas

Os estabelecimentos escolares demonstraram uma atitude de observação externa pouco consequente na sua rotina diária após o término dos projetos. A coordenadora do projeto na Pedreira dos Húngaros declarou-se incapaz de implementar uma formação contínua na área do ensino do português aplicável à docência com crianças de origem de cabo-verdiana24, concluindo que a escola manteve uma ausência de preocupações linguísticas nas estratégias pedagógicas, abordando a(s) língua(s) materna(s) como uma desvantagem e não como uma riqueza linguística a ser explorada. O agrupamento escolar do Vale da Amoreira não desempenhou o seu papel complementar de avaliação do projeto inicialmente previsto, nem se apropriou da cultura de multilinguismo. Durante a aplicação de um inquérito sociolinguístico junto de professores e funcionários, os primeiros mostraram-se pouco dispostos a participar. Já a amostra dos funcionários permitiu demostrar que 43% tinha outras origens, falavam uma outra língua que não o português na sua infância, tendo partilhado as suas histórias sociolinguísticas com os alunos.

As conclusões do projeto entre Portugal e Cabo Verde são, a este nível, esclarecedoras. A formação evidenciou lacunas na formação prévia dos professores, seja na sua inadaptação a contextos multilingues seja na preferência por abordagens pedagógicas prescritivas mais centradas no professor e nos manuais escolares, e menos nos saberes trazidos pelos alunos. Estas abordagens relevaram-se obstáculos na prática de modelos de ensino e aprendizagem diferentes dos tradicionais, tendo os professores reagido às novas metodologias como uma interferência nos processos padronizados, e uma sobrecarga no seu trabalho. Diferentemente, no 6 de Maio registaram-se melhorias na qualidade das intervenções pedagógicas dos educadores e auxiliares, consolidando conhecimentos e práticas de educação multilingue e intercultural, lembrando que a instituição de ensino era, neste caso, a coordenadora das intervenções.

Efeitos nos alunos e nos pais

Todas as intervenções registaram um empoderamento nos alunos envolvidos, refletindo-se numa maior curiosidade e abertura comunicativa e nas atividades de escrita e leitura. Observou-se uma maior consciência linguística pela valorização da cultura cabo-verdiana e uma identificação positiva com as duas línguas e culturas, assim como um entendimento do papel e valor de diferentes línguas e culturas, e, não menos relevante, a importância da tradução no plano comunicativo. Estes efeitos manifestaram-se nas competências linguísticas em português (como segunda língua nalguns casos), no conhecimento e melhorada diferenciação entre as duas línguas, assim como desinibição na utilização das línguas, incluindo uma adaptação mais adequada das mesmas aos interlocutores e contextos apropriados, tanto na escola como na família, num rápido code-switching25, embora com esperadas desvios da norma e interferências.

No Vale da Amoreira, a biliteracia, e mais propriamente o modelo de educação bilingue em que ela se insere, constituiu valências para um desenvolvimento linguístico e sociolinguístico precoces26. Se no início da avaliação (2010) a TC apresentou vantagem nos resultados linguísticos em português, os restantes momentos de avaliação (2010-2012) revelaram melhores resultados da TB27, com raros casos de interferência entre as duas línguas28. Em termos de resultados escolares em sentido estrito, na Escola Multilingue a percentagem de alunos participantes sem negativas era superior à de outras turmas29; no final do 5.º ano, não existiam casos de abandono escolar e havia apenas um aluno em absentismo, sendo a única turma (em 9 turmas da escola do 2.º ciclo) sem casos de indisciplina. Na Pedreira dos Húngaros, registou-se uma taxa de assiduidade às aulas entre 95 e 100%, com uma taxa de retenção de 40% no 2.º ano, não havendo, no final do 3.º ano, acumulação de retenções nem quebra na taxa de assiduidade (98%).

Nos projetos que promoveram a participação dos pais, verificaram-se atitudes mais positivas face à utilização quotidiana da língua cabo-verdiana, em contexto de sala de aula e através de métodos promotores de biliteracia. Os efeitos tiveram também impacto na participação cidadã. Na Pedreira dos Húngaros, registou-se maior participação nas reuniões de pais, indicando um aumento da segurança e confiança nas instituições e seus representantes, a par de uma maior consciência sobre o exterior do bairro e as formas de o navegar. No Vale da Amoreira, os pais dos alunos da TB assumiram–se formadores dos pais dos outros alunos da Escola Multilingue, partilhando as vantagens e efeitos positivos do modelo de educação, e servindo simultaneamente de integração dos novos pais.

Educação antirracista numa cultura monolingue?

Sabemos hoje que o bilinguismo é uma valência independentemente de uma das línguas em causa ser uma língua africana tradicionalmente desvalorizada na educação formal (Andrade & Fanha 1979; Mateus, Pereira & Fischer 2008: 20-27; Cardoso 2005). Interessa-nos, por isso, discutir o potencial da educação bilingue e plurilingue integrada numa estratégia de educação antirracista, pela inclusão de línguas menorizadas no contexto de ensino formal em Portugal. E partindo de uma abordagem da consciência crítica da linguagem (Flores & Rosa, 2015 referindo Alim, 2005), propomos repensar a criação de espaços e ferramentas para que os alunos e restante comunidade escolar possam criticar os contextos sociopolíticos que deslegitimam as suas práticas linguísticas e outras em presença, tornando-os conscientes das hierarquias linguísticas existentes e do seu próprio comportamento comunicativo. Trata-se de dar continuidade às propostas das experiências descritas, pensando a diversidade linguística enquanto forma de contestação das desigualdades, mas reformulando a sua inclusão na educação não pela via do discurso de adequação e défice das práticas linguísticas dos estudantes, mas pela necessidade de desnaturalizar a própria ideia de categorias linguísticas objetivamente padronizadas e adequadas.

A noção de língua padronizada ancorada à língua de escolarização produz discursos sobre adequação e défice que refletem perceções ideológicas e não linguísticas, implicadas em processos de estigmatização linguística. Isto porque as categorias normativas da língua são idealizações em torno de uma língua nacional padronizada enquanto a norma a que todos os sujeitos nacionais se devem submeter (Flores & Rosa, 2015), mas não refletem práticas linguísticas empíricas propriamente ditas, no sentido em que nenhum sujeito pratica e usa essa mesma norma exceto em contextos técnicos. É-nos, por isso, necessário questionar a ideia de objetividade e naturalidade associada a práticas linguísticas padronizadas (lecionadas nas escolas), apanágio das resistências aos projetos acima descritos. Uma tal empresa implica aprofundar o nosso entendimento em torno das condições históricas e atuais que têm produzido a norma do português lecionado nas escolas enquanto símbolo de identidade nacional monolingue e monocultural, e o seu papel enquanto parte integrante de processos de reprodução da estratificação social que exclui falantes da língua, e falantes de outras línguas – identificando assim a natureza da violência simbólica que rejeita e exclui legados culturais e linguísticos que se distinguem da norma dominante padronizada (Bourdieu and Passeron 1977).

Em si, a diversidade da língua portuguesa resulta da expansão e ocupação de territórios, e consequentes desigualdades políticas, sociais e económicas que se refletiu nos contactos entre indivíduos de diferentes estatutos sociais e raciais. Falamos de uma governamentalidade colonial que criou hierarquias entre línguas europeias (superiores) e não europeias (inferiores), num acesso extremamente limitado a formas ditas legítimas das línguas europeias (Fanon, 1975). Durante a colonização portuguesa, existiram distintas categorizações legais dos grupos populacionais na Guiné-Bissau, Angola e Moçambique – estatuto de indígena português e cidadania portuguesa (de 1836 a 1954, terminando em 1961) – em que um dos critérios de diferenciação era exatamente a proficiência no português padronizado pela metrópole (a segunda das cinco condições para adquirir cidadania portuguesa, Pinto 2001:88-89). Ainda hoje se observam atitudes fortemente estigmatizantes em relação às línguas dos africanos e de como fala(va)m português, tidos como falantes de formas de linguagem incoerente – desde a «língua de preto» (remetendo a obras de 1455, 1522, 1524, ver em Henriques 2009; Pereira 2002) ao «pretuguês/pretoguês» (Oliveira 2017). A língua cabo-verdiana tem sofrido deste preconceito linguístico quando vista como corruptela do português (Pereira 2002: 250), e mesmo quando reconhecida enquanto língua de base lexical portuguesa com uma forte presença demográfica e histórica em Portugal, é ainda percecionada como não-nacional, não-territorial, não-regional, não-nativa e não-europeia (Matias, 2017: 157).

Um ponto de reflexão crítico reside, por isso, no enquadramento histórico sobre a evolução das perceções europeias sobre sujeitos linguisticamente racializados como «Outros» (Rosa & Flores 2017 referindo Makoni & Pennycook 2007): desde falantes de línguas inferiores sub-humanas; a falantes de línguas humanas, mas inferiores em termos de desenvolvimento humano; a falantes de línguas com défice vocabular face à linguagem académica/escolar necessária à economia do mercado global. Apesar da tendência inclusiva, a abordagem base de défice e alteridade linguística30 mantém-se, motivando a suposta necessidade de modificar as práticas linguísticas dos sujeitos cujas práticas e usos linguísticos tidos como deficitários ou desviantes face à norma nacional padronizada – premissa-chave das instituições de ensino para trabalhar a ascensão social dos falantes, sendo esta uma preocupação inicial dos anteriores projetos.

No referente a medidas de combate às desigualdades sociais, propomos alternativamente colocar a tónica nas representações que habitam os sujeitos ouvintes que legitimam o que é uma norma-padrão e um falante legítimo dessa norma (Flores & Rosa, 2015 referindo Inoue 2006) - enquanto sujeitos percecionados como não racializados e linguisticamente hegemónicos. Estas representações não são decretadas por biografias individuais, mas antes por instituições, políticas e tecnologias referentes à noção de branquitude enquanto posicionamento histórico e contemporâneo de sujeitos racializados e não racializados, como brevemente referido acima. Este conhecimento ajuda-nos a compreender os processos através dos quais as práticas e usos de línguas de populações racializadas são percecionadas como desviantes aquando da aferição dos seus perfis, e, consequentemente, nas tomadas de decisões sobre o acesso aos seus direitos– nomeadamente nas tecnologias de vigilância e procedimentos institucionais onde as ideologias linguísticas dos sujeitos ouvintes legitimadores de normas nacionais padronizadas são ativadas, como nas avaliações no Português Língua Não Materna (PLNM), Prova de Língua Portuguesa para Aquisição da Nacionalidade (PaN), renovação de vistos, acesso ao mercado de trabalho e bolsas de estudo.

Gostaríamos de concluir sublinhando a necessidade de uma educação plurilingue crítica, reflexiva e antirracista como estratégia chave na contestação das desigualdades. Tal empresa terá impacto limitado se focarmos nas valências das experiências descritas e na inclusão do cabo-verdiano como língua escolar legítima, mas não reconfigurarmos o nosso entendimento em torno do papel da(s) língua(s) escolar(es) na prevenção de práticas e atitudes linguísticas resultantes de um legado de segregação histórica. É urgente aprofundar o nosso conhecimento sobre o papel que a língua tem desempenhado no racismo internalizado de toda a comunidade escolar, identificando as construções sociais que têm correlacionado características linguísticas a categorias raciais, e as suas implicações nos processos de aprendizagem dos alunos racializados (Hudley et al. 2018). Resumindo, uma premissa central da educação antirracista plurilingue implica questionar se é efetivamente possível identificar diferenças linguísticas objetivas entre práticas linguísticas académicas/escolares e práticas linguísticas (tidas como) racializadas.

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Artigo pubicado originalmente na Medi@ções – Revista OnLine da Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Setúbal, Cristina Roldão (coord), v. 7, n. 2 (2019): Educação (anti)racista: Que políticas, práticas e perspectivas?

  • 1. Diferentemente, o plurilinguismo faz referência à relação entre o indivíduo e o seu contexto, onde se observa a construção de “uma competência comunicativa, para a qual contribuem todo o conhecimento e toda a experiência das línguas e na qual as línguas se inter-relacionam e interagem.” In Conselho da Europa, 2001: 23.
  • 2. Destacando-se o reforço línguas estrangeiras com o inglês (desde 2014) e o mandarim (ensino básico desde 2012, ensino secundário desde 2015); o teste Key for Schools (desde 2013, em parceria com Cambridge English Language Assessment) o ensino público, particular e cooperativo; o Projeto Ensino Bilingue Precoce (inglês-português em parceria com British Council Portugal) em escolas públicas do 1.º ciclo do ensino básico desde 2011/2015, e o Programa Escolas Bilingues desde 2016/2017, alargado ao pré-escolar.
  • 3. Resultante do projeto “Konta bu storia: Padrões de aculturação linguística entre descendentes de imigrantes africanos no Vale da Amoreira” (financiado pela FCT / MCTES e em protocolo entre CIES-IUL, CES-UC e CELGA / ILTEC-UC).
  • 4. Distingue-se aqui da educação multilingue, sabendo que uma educação plurilingue foca antes em toda a experiência individual na construção de um repertório linguístico composto por várias línguas que se inter-relacionam e interagem, constituindo-se, assim, uma competência comunicativa individual. Conselho da Europa, 2001: 23.
  • 5. “Diversidade linguística e educação bi e plurilingue: em torno de quatro projetos pioneiros em Portugal”, 1 de março 2018, ISCTE-IUL, in Ciclo de 6 seminários Políticas e práticas linguísticas em Portugal: Que escolhas, imposições e resistências? https://www.om.acm.gov.pt/documents/58428/78692/1.%C2%BA+semin%C3%A1rio+...
  • 6. Integrado na Escola Superior de Educadores de Infância Maria Ulrich.
  • 7. O Centro Social 6 de Maio funciona desde 1980, envolvendo crianças de vários bairros das Portas de Benfica (6 de Maio, Estrela de África e Fontainhas), sendo uma Instituição Particular de Solidariedade Social (IPSS) desde 1991. À data de hoje, este bairro encontra-se em processo de desmantelamento final.
  • 8. Integrado na Escola Superior de Educadores de Infância Maria Ulrich.
  • 9. O projeto de 1998 tem por nome em inglês: Nursery Policy and Practice within a Bilingual Context, implementado em Portugal pelo Secretariado Entreculturas (na altura Ministério da Educação) sob a coordenação de Manuela de Sousa. Os parceiros dinamarqueses eram do Departamento «Crianças e Jovens» do Município de Odense, Jardim-de-Infância de Humliky. o Jardim-de-Infância de Bogelund, a Escola de Formação Ejerslykke Bornecenter; pelo Reino Unido, o Inner London Education, através do Collaborative Learning Project, e o Jardim-de-Infância Margaret McMillan. Ver em Acção II da Comissão das Comunidades Europeias, e em: http://eacea.ec.europa.eu/static/Bots/docbots/Documents/Compendium/Comen....
  • 10. Financiado da Fundação Calouste Gulbenkian (FCG), coordenação da linguista Raja Litwinoff, este projeto decorreu no Centro Social da Pedreira dos Húngaros, tendo o bairro sido demolido pelo então programa Plano Especial de Realojamento (PER).
  • 11. Quando a língua em questão não é apenas o tema de estudo, mas também uma ferramenta de ensino, proporcionando uma maior envolvência na língua que se pretende ensinar, e promovendo assim o lugar de língua de escolarização a ambas as línguas em questão.
  • 12. Conselho da Europa, 2001.
  • 13. Projeto financiado pela FCG, coordenado por Maria da Luz Correia (ESE João de Deus), em parceria com Margarida Santos (IPM), contando com a consultadoria linguística de Dulce Pereira (FLUL) e a avaliação externa de Luísa Solla (ESE de Setúbal). Participaram ainda a Associação Cultural Moinho da Juventude. Em Portugal: Agrupamento de Escolas de Alfornelos (Amadora) e EB1 n.º 3 do Cacém (Sintra). Em Cabo Verde, dois jardins-de-infância (Mindelo, São Vicente) e quatro escolas básicas integradas (Campim, Monte Sossego e Humberto Duarte, no Mindelo, São Vicente; e Alto de Peixinho, em Porto Novo, Santo Antão). Em Portugal, contou-se com a participação de duas turmas completas, com 20 a 23 alunos entre os 9 e 12 anos, de várias origens, e em Cabo Verde participaram apenas alguns alunos de cada turma. Desenvolveu-se, ainda, uma colaboração com o projeto de investigação-ação Continuar a Ser Criança (Margarida Santos (IPM), Cabo Verde), utilizando os textos utilizados do primeiro projeto na formação de professores.
  • 14. Integrado nos Territórios Educativos de Intervenção Prioritária (TEIP), este projeto foi desenvolvido pelo Instituto de Linguística Teórica e Computacional (ILTEC), coordenado por Dulce Pereira, sendo parte integrante do projeto Bilinguismo, Aprendizagem do Português L2 e Sucesso Educativo na Escola Portuguesa, financiado pela FCG.
  • 15. Num total de 25 alunos nesta segunda fase, incluindo 11 alunos da TB, 3 alunos da TC, 3 jovens da comunidade cigana, 1 aluna de origem guineense e 1 aluno de origem portuguesa com um background de emigração em Inglaterra (Reino Unido).
  • 16. No Centro Social 6 de Maio, as fichas consistiam em questionários destinados a apurar diversas informações sociolinguísticas, como a idade, naturalidade, frequência de jardim-de-infância, línguas faladas com o pai, com a mãe, com outros adultos com quem vive, etc. O material aplicado incidia não apenas sobre a identificação pessoal, mas também sobre o conhecimento de materiais, enunciação de opostos, compreensão de frases e número de substantivos aplicados num diálogo sobre uma gravura.
  • 17. Na TB, os testes sociolinguísticos consistiam em diversos instrumentos de análise, incluindo atividades de narrativa/descrição escrita e oral, de escrita ditada, de descrição e de reconhecimento de palavras; as fichas de caracterização sociolinguística complementadas com inquéritos e entrevistas sobre consciência linguística; na Escola Multilingue, realizaram-se três atividades de diagnóstico escrito em inglês (caracterização, nomeação e teste escrito), uma atividade de diagnóstico em português (silhuetas), duas atividades de tradução (inglês-português) e uma atividade de narrativa escrita em português.
  • 18. Onde pelo menos 50% do tempo letivo era atribuído à língua dita minoritária, ver Projeto de Ensino Bilingue Português/Alemão, de Hamburgo Cf. Duarte, Joana (2010).
  • 19. O termo biliteracia refere-se, aqui, a todas e quaisquer instâncias em que a comunicação ocorre em duas (ou mais) línguas dentro ou em torno da escrita, ver em Hornberger 1990: 213.
  • 20. A componente bilingue e bicultural nos primeiros dois anos foi desenvolvida pela educadora do projeto, uma auxiliar de educação e um professor de cabo-verdiano exterior ao bairro.
  • 21. Com a coordenação de Dulce Pereira, toda a experiência e os referidos materiais pedagógicos produzidos (fichas de diagnóstico e materiais para a educação intercultural e desenvolvimento da língua portuguesa) deram origem ao livro «Crescer Bilingue» e a um CD de apoio à formação para professores, educadores e pais.
  • 22. A equipa do projeto criou, em 2005, uma página online e um CD-ROM com conteúdos e materiais úteis para a formação de professores, nomeadamente sobre a aprendizagem e uso de línguas e o diálogo sobre este tema. Ver em http://www.ese-jdeus.edu.pt/projectos/pl2. (acedido em 31-10-2019).
  • 23. Recomendações expostas por Dulce Pereira (http://www.ese-jdeus.edu.pt/projectos/pl2/Apr_Conv/ac!dp_desenvling.htm).
  • 24. Litwinoff, 1994 : 52-53.
  • 25. Code-switching – alternância entre línguas ou variedades linguísticas dentro de um único discurso.
  • 26. Ver em http://www.iltec.pt/projectos/em_curso/turmas_bilingues.html (em migração para o site do CELGA-ILTEC). Vários dos resultados linguísticos foram publicados no livro de atas do colóquio «Educação Bilingue e Bilinguismo» (ILTEC) e na colectânea «Português Língua Não Materna - Investigação e Ensino» (LIDEL), e apresentados em eventos científicos.
  • 27. Nas atividades iniciais, registou-se uma diferença de 2%, medida através de uma classificação tripartida, aplicada aos diversos parâmetros de análise definidos para cada atividade (direcionalidade da escrita, coesão referencial, correção ortográfica, etc.). Nas 12 atividades analisadas que se seguiram (exercícios de regras de escrita, leitura, ditado, 4 narrativas escritas, 3 narrativas orais e 2 descrições), a TB evidenciou melhores resultados em 11. Em sete atividades em que se analisou a percentagem de correcção ortográfica, cinco delas revelavam vantagem para a TB, e nas restantes duas, ambas as turmas tiveram a mesma percentagem.
  • 28. Os problemas existentes prendem-se essencialmente com erros de concordância em português, por falantes de cabo-verdiano (tendendo estes para a fossilização, caso não sejam abordados).
  • 29. 53%, por oposição a percentagens entre os 30% e os 44%, noutras turmas (dados recolhido no final do 2.º período, do 5.º ano de escolaridade).
  • 30. Morello (2019).

por Raquel Matias e Pedro Martins
A ler | 11 Dezembro 2020 | Educação antirracista; Educação plurilingue; Língua de escolarização; Línguas menorizadas