Casa Odara celebra o Mês da Consciência Negra com uma série de eventos no Porto

Para celebrar o Mês da Consciência Negra, a Casa Odara organiza uma série de eventos durante novembro, promovendo a reflexão, o reconhecimento e a celebração da cultura afro-brasileira e africana no Porto. A programação visa fomentar o diálogo e o encontro, reafirmando a presença e resistência negra na cidade. Com uma agenda rica em debates, exibições, workshops e um sarau aberto, o espaço convida a todos para participar dessas atividades culturais e fortalecer o movimento coletivo e o direito à expressão cultural e artística da comunidade negra. A proposta ganha corpo e matéria no encontro com o MIA - Mês da Identidade Africana, promovido pela Bantumen, além do apoio de organizações como a UPTEC Baixa, a Associação AMOR, a Lereby Produções, a Lata Filmes e Elo Studios.

A programação inicia-se no dia 2 de novembro com o evento de abertura,  ‘Diálogos Feministas Transatlânticos’, com a autora e feminista brasileira Yasmin Morais, fundadora do projeto Vulva Negra, com mediação da artista moçambicana Inês Mutaca. Nesse evento, Yasmin Morais, que está em turnê pela Europa, trará discussões sobre questões caras ao movimento das mulheres como a defesa dos direitos sexuais e reprodutivos, o avanço da extrema-direita no mundo, a criação de estratégias para a nossa preservação e a importância do amor na vida das mulheres.

Já no dia 9 de novembro, no auditório da UPTEC Baixa, haverá uma sessão gratuita do filme “Medida Provisória” (2022, 94´), dirigido por Lázaro Ramos, ainda inédito nos cinemas do Porto. Após a exibição, haverá um debate com integrantes da Casa Odara e convidados especiais, que abordarão os temas centrais do filme, que propõe uma discussão profunda sobre identidade, direitos e pertencimento em um contexto distópico.

No dia 16 de novembro, às 17h00, acontece o workshop “Simbologia dos Òrìṣà” com Jorge Ciprianno, dançarino e estudioso da dança com base na influência dos elementos da natureza e da ancestralidade Africana Yorùbá na Diáspora Brasileira. A proposta busca oferecer aos participantes uma experiência imersiva, tanto cultural quanto artística, nas danças tradicionais dos Òrìṣà, figuras centrais das religiões afro-brasileiras.

Encerrando a programação, no dia 30 de novembro, a Casa Odara realiza a primeira edição do Sarau Afroafetos. Esse evento será um espaço aberto para artistas negros de todas as linguagens compartilharem suas expressões, construindo um encontro de celebração por meio das artes, corpos, vozes e afetos. Inspirado na trajetória e na resistência coletiva que fundamenta a Casa Odara nos seus pouco mais de um ano de existência, o Sarau Afroafetos promete ser um momento de conexão, alegria e fortalecimento.

Ainda que a comemoração do dia da consciência negra ainda não tenha se tornado oficial em Portugal, com suas raízes brasileiras, a Casa Odara reafirma, com essa programação, o compromisso de manter e ampliar espaços de resistência, dignidade e liberdade no Porto. Os eventos convidam a comunidade a celebrar a herança e a diversidade cultural afrodescendente e ressaltam a importância da coletividade e da expressão livre como ferramentas para o reconhecimento e a valorização do povo negro na sociedade. 

SERVIÇO Contato: Gabriela Carvalho - gestora cultural cultura.casaodara@gmail.com / +351 910969768

Realização: Casa Odara

Rua dos Mártires da Liberdade, 126, Porto

31.10.2024 | por martalanca | Casa Odara, consciência negra

O Dia da Consciência Negra

O Dia da Consciência Negra, celebrado ontem (20), em frente da estátua de Zumbi dos Palmares, na Praça XI, Riode Janeiro, foi festejado com grupos culturais, religiosos, ativistas, políticos, roda de capoeira e outros. Zumbi dos Palameres - líder do Quilombo dos Palmares e símbolo da resistência contra a escravidão, foi reverenciado com roda de samba, grupo Afoxé Filhos de Gandhi, lavagem do busto, cantorias de baianas, desfile de moda e várias outras atividades em frente à estátua de Zumbi. “Zumbi é um herói nacional e o único da história do Brasil que foi construído de baixo para cima, pelo povo, pela comunidade negra. Ele não é herói dos negros, pura e simplesmente, como se quer caracterizar, mas um herói da pátria. Ele está inscrito no Panteão da República e ainda não tem a reverência que deveria ter do Estado brasileiro”, afirmou o Prof. Dr. Babalawô  Ivanir dos Santos, interlocutor da Comissão de Combate à Intolerância Religiosa (CCIR) e da  Centro de Articulação de Populações Marginalizadas (CEAP).


Organizado por Luiz Eduardo Oliveira Negrogun, Presidente do Conselho estadual dos Direitos do Negro - A Festa no busto de Zumbi, acontece há 34 anos, na Praça XI, traz os festejos como forma de chamar atenção para a causa - “A questão básica é passarmos para essa juventude que ainda existe uma esperança e um caminho. Se nós estivermos unidos e conscientes, vamos avançar e ser vitoriosos. Temos que combater o racismo. Porque ele está entranhado de tal forma na sociedade que, somente com a união, nós vamos conseguir exterminá-lo. Sempre com muito orgulho com nossas raízes”, alegou Negrogun.  
Zumbi é símbolo da resistência negra ao escravismo e da luta dos afrobrasileiros contra o racismo, a discriminação e a exclusão social. O feriado é dedicado à reflexão sobre a inserção do negro na sociedade brasileira, a data contou ainda com outras comemorações espalhadas pelo Rio, como no Dida Bar e Restaurante, na Praça da Bandeira, hoje, a casa é reconhecida como um reduto da comunidade negra. No dia da consciência negra, recebeu o Restaurante do Quilombo do Campinho de Paraty, para uma viagem gastronômica aos quilombos e ancestralidades. A data também foi comemorada como reverência para outro líder, foi promulgada no dia 19, no Diário oficial do Estado do Rio de Janeiro, a Lei 8623/2019, dos deputados André Ceciliano e Waldeck Carneiro (PT), que inscreve o nome do marinheiro negro João Cândido Felisberto no Livro dos Herois e Heroinas do Estado do Rio. O “Almirante Negro” foi líder da chamada “Revolta da Chibata” na historiografia brasileira, no início do século XX.   

21.11.2019 | por martalanca | Brasil, consciência negra

A Kindumba da ANA: “Gente que se parece consigo mesma”

Imagem que explica a origem do nome “A Kindumba da ANA” em sua página no Facebook.Imagem que explica a origem do nome “A Kindumba da ANA” em sua página no Facebook.

Francisca Nzenze Meireles, a Chiquinha, é angolana e mora no Brasil há poucos anos. Seu interesse por ”cabelos naturais, curiosidade e amor aos cabelos naturais crespos” foi a inspiração para “A Kindumba da ANA”, seu primeiro trabalho de histórias em quadrinhos (HQs) que lhe trouxe destaque pelas tiras bem-humoradas e pela temática que sempre gira em torno de um personagem forte: o cabelo natural crespo. O nome ANA brinca com as iniciais de Angolanas Naturais e Amigos, um fórum online. As tiras podem ser acompanhadas na página da Chiquinha.


Francisca Nzenze Meireles, também conhecida como Chiquinha - “Na rua, vejo surgir aos poucos, outro modelo de gente. Gente que se parece consigo mesma”. Foto utilizada com permissão.Francisca Nzenze Meireles, também conhecida como Chiquinha - “Na rua, vejo surgir aos poucos, outro modelo de gente. Gente que se parece consigo mesma”. Foto utilizada com permissão.Na semana em que se comemora o 
Dia da Consciência Negra, conheça um pouco mais dessa artista, suas impressões sobre trabalhar entre diferentes culturas e sobre a afirmação das identidades. E, no espírito das lusofonias, aproveite para conhecer um pouquinho mais do sotaque e das coisas de Angola.

Global Voices em Português (GV): Fale um pouco sobre o cenário dos quadrinhos de Angola. (falamos em cenário, e não em mercado, para que não fique restrita ao mercado comercial. Ao contrário, preferimos que pense nos quadrinhos que te interessam). O que você leu e lê? O que você recomenda?

Chiquinha:
 Eu era leitora assídua de uma tirinhas Angolanas nos anos 90. O MANKIKO [en, pt], de Sérgio Piçarra, um Angolano. Era muito bom, mas já não existe. Aliás o mercado livreiro e editorial em Angola não é muito vivo. Não sei o que se produz agora. Fui convidada a participar de uma exposição de banda desenhada em Angola promovida pelo OLINDOMAR estúdios. Enviei alguns trabalhos, mas nem sei se foram expostos. Eles não voltaram a me contactar. Mas imagino que a banda desenhada, como se chamam os quadrinhos em Angola, estejam sim “vivos e bem de saúde”. Jovens talentosos lá há muitos! Problemas existem nas editoras.

GV: Seu trabalho começou em Angola e agora segue no Brasil. Isso mudou de alguma maneira a inspiração do dia-a-dia que alimenta seu trabalho?

Chiquinha:
 Em Angola eu tenho um livro infantil escrito e ilustrado por mim, mas não tinha nada feito nada parecido com ilustração em quadrinhos. Os quadrinhos A Kindumba da ANA começaram aqui mesmo no Brasil (onde hoje moro) a partir do meu interesse em cabelos naturais, curiosidade e amor aos cabelos naturais crespos. Foi quase por acaso que nasceu “a Kindumba da ANA”. Eu participava de um grupo do Facebook chamado Angolanas Naturais e Amigos, e lá se discutia muito sobre cabelos naturais.

Na conversa com outras meninas , sempre surgiam cenas do quotidiano engraçadas, chatas, polêmicas, tristes, alegres… enfim, como gosto muito de desenhar, decidi brindar algumas meninas com historinhas que teriam um final feliz e/ou engraçado. Assim nasceu a Kindumba da ANA.

O facto de estar no Brasil não mudou, porque a fonte de inspiração continua sendo cabelo crespo natural, e nada mais. Alguns episódios referem-se ao Brasil especificamente, mas sempre tendo o cabelo como protagonista principal.

A Kindumba da ANA. Tira em quadrinhos utilizada com permissão.A Kindumba da ANA. Tira em quadrinhos utilizada com permissão.

GV: Como é, para Chiquinha, trabalhar entre diferentes culturas?

Chiquinha:
 Eu não considero o Brasil tão diferente de Angola culturalmente falando. Aliás, Angola consome actualmente muita cultura do mundo inteiro. Principalmente os mais jovens. Nem a língua chega a ser um entrave à compreensão das tirinhas que faço. Aliás, a maioria dos fãs da Kindumba da ANA são Brasileiros. Não sei se porque a internet é mais acessível aqui no Brasil, ou se existem outros motivos para isso.

GV: Para os quadrinhos brasileiros, as possibilidades do mundo online e o aumento da participação de autores de outros cantos do país, fora do eixo Rio-São Paulo, parece estar levando a uma maior diversidade, com a inclusão de novos temas e outras visões de mundo nas obras que chegam aos leitores. Do seu ponto de vista, como estrangeira, acredita que é uma tendência? Como foi sua acolhida?

Chiquinha: 
Eu não conheço muitos quadrinhos Brasileiros. Conheço a Turma da Mônica, as charges do Laerte, Henfil… mas não sou leitora assídua de revistinhas em quadrinhos. Então não saberia responder se existe essa tendência de mudança e inclusão de novos temas.

Sobre a minha acolhida, devo dizer que a resposta tem sido bastante positiva. As pessoas gostam de se ver representadas. Eu tento dar à A.N.A uma personalidade leve e agradável, um tipo abordagem que permita que crianças e adultos considerem os cabelos naturais, simplesmente como eles são: cabelos naturais. A A.N.A vem para imprimir leveza a um tema que poderia facilmente ser revestido de polêmica.

A Kindumba da ANA. Tira em quadrinhos utilizada com permissão.A Kindumba da ANA. Tira em quadrinhos utilizada com permissão.

GV: Vivemos um tempo de afirmação das identidades em suas múltiplas variantes – etnia, gênero, religião, e outras. A manifestação dessas identidades é bastante perceptível online, e um dos exemplos é o seu próprio trabalho com A Kindumba da Ana. Entende que essa mudança consegue ultrapassar o mundo virtual e firmar-se nas ruas também.

Chiquinha:
 Acho que sim, e devo dizer que as redes sociais permitem que isso aconteça de um modo bastante abrangente. Eu mesma consegui voltar a usar o meu cabelo natural depois de pesquisar no You Tube o que fazer com o meu cabelo, porque eu de facto não sabia como cuidar dele. Não sabia o que usar, como pentear , estilizar, lavar… Depois foi o Facebook, troca de experiências, contacto com outras pessoas iguais a mim e a cada dia eu me sentia mais encorajada a perseguir um modelo meu, um modelo que não se vê na televisão , nas revistas, na literatura.

Na rua, vejo surgir aos poucos, outro modelo de gente. Gente que se parece consigo mesma. Gente que não quer se parecer com o padronizado da sociedade pré fabricada!

A Kindumba da ANA. Tira em quadrinhos utilizada com permissão.A Kindumba da ANA. Tira em quadrinhos utilizada com permissão.

Este artigo é parte da cobertura especial 20.11 – Dia da Consciência Negra. 
Leia a primeira entrevista: Estereótipos persistentes, preconceitos latentes: negros e histórias em quadrinhos no Brasil.

fonte: 
http://pt.globalvoicesonline.org/2013/11/21/a-kindumba-da-ana-gente-que-se-parece-consigo-mesma/

12.12.2013 | por herminiobovino | baía, Brasil, consciência negra