Políticas de Juventude e Cultura
Sendo que a grande maioria da população de São Vicente é constituída por jovens, fácil seria depreender-se que:
se há uma elevada taxa de desemprego, os jovens deverão os mais afectados;
se há vários grupos musicais, noites caboverdeanas, novas vozes a despontar, muitos deles são jovens;
se há um novo fenómeno de violência – gangs – muitos dos seus constituintes deverão ser jovens;
se existem grupos de dança, de teatro, artistas com talento, muitos deles deverão ser jovens;
a existirem poetas, escritores, artista plástico e artistas nas mais variadas áreas, provavelmente muitos deles serão jovens.
Fácil de encontrar uma relação, não? Talvez. Mas vamos então assumir que a grande massa artística de S. Vicente é constituída, grosso modo, por jovens. Vamos assumir que a juventude com arte está dedicando horas da sua inspiração (graças, muitas vezes, à falta de ocupação) a escrever versos que te farão suspirar, contos que te farão viajar e a pintar quadros de rara beleza. Essa mesma juventude está agora a esculpir obras de se admirar mas também está dedicando horas da sua inspiração memorizando textos porque você quer mais e melhor teatro, afinando a voz e a guitarra porque você exige boa música ao jantar.
Com tantos jovens que andam pela rua com um instrumento musical às costas, outros com os cadernos cheios de versos e personagens ou outros a caminho de casa (às vezes de madrugada) depois de mais um ensaio, constate-se que, se não pela arte, tanto esforço só pode dever-se ao incentivo. Sim, porque somente pelo incentivo é que se compreende que um jovem poeta ou escritor dispensa horas dando vida a personagens e a sentimentos que verá brevemente publicado em livro. Ou que um jovem pintor pinte quadros, paredes, papéis ou outra coisa qualquer que encontrar na certeza de ver o seu trabalho exposto e reconhecido. Somente pelo incentivo é que um jovem dançarino treina novos passos ou que um jovem músico toca até sentir cãibras nos dedos.
Porque, não se iluda, há uma competição secreta e feroz entre os jovens artistas para ver quem consegue ficar com incentivo. É tão secreta que não se fala nem se escreve sobre ela. De tão secreta que é, diz-se que não existe. Pronto! Revelei-vos um segredo: de que ela não existe. A competição, não o incentivo.
O que é que se entende por Cultura em São Vicente? Que evento cultural juvenil recebe o incentivo? Que evento cultural juvenil? São Vicente precisa com urgência de uma política cultural juvenil. A cultura é uma das poucas áreas em que o trabalho está quase todo feito. O jovem artista já tem a sua obra quase pronta. O jovem artista é uma obra. Só precisa do incentivo para expô-la. Pois sim, poderiam argumentar, o incentivo é usado pelo Carnaval para premiar com melhor andrajo. Também, o incentivo é usado no Festival da Baía das Gatas em grupos que durante a sua estadia não fazem uma única troca de experiência com os jovens artistas.
O segredo foi revelado. O incentivo existe. Agora o próximo passo é usá-lo em benefício da grande massa da população de São Vicente: os jovens. Porque faz-se necessário usar o incentivo em áreas culturais como:
Literatura e Música, Artes Plásticas e Teatro, etc e tal.
Criar condições para que, após concurso, os jovens artistas possam ver seus trabalhos tornados públicos. Que seja uma obra conjunta. Um jovem poeta ficará imensamente mais feliz de ver um único poema seu publicado do que todos eles somente no seu caderno de rascunhos. Idem aspas para um jovem músico. Com uma política cultural juvenil definida para uma publicação por ano, teríamos quatro obras disponíveis no mercado nacional em quatro anos e muitos jovens artistas felizes.
Desenvolver políticas de valorização do artista para evitar que um jovem pintor tenha que vender seus quadros para poder comprar tintas e pincéis para pintar novo quadro. Outro ciclo vicioso a ser quebrado é o do jovem talentoso que não consegue fazer uma exposição por não ser conhecido e não ser reconhecido por não fazer exibições. Novamente, um jovem artista irá preferir expor em conjunto do que ter todos os seus quadros encostados numa parede da casa.
Nota-se que hoje em dia a cultura que não é comercializável não incentivada. Não se pode negar o peso nos roteiros turísticos do Festival da Baía e do Carnaval do Mindelo mas também não se pode esquecer que originalmente essas manifestações culturais não foram projectadas a pensar no turista, mas que conseguiram ganhar este peso e estatuto ao longo dos tempos. Foram precisos muitos anos de árduo trabalho para se chegar a esse estágio. É esse mesmo empenho que é necessário para projectar e impulsionar a criação artística na nossa juventude.
Com uma política de juventude e cultura séria e credível será possível a médio prazo, apresentar ao público jovens artistas de qualidade nas mais diversas áreas. E, se com isso conseguirmos ter turistas a visitar galerias de arte, a assistir teatro e a comprar livros e álbuns musicais, tanto melhor. A Cultura e a Juventude agradecem.