Burkina Faso – Uagadugu - a capital das duas rodas

Aldeia ou cidade, onde é o princípio, onde é o fim?

Falo de “Ouaga” pois é assim que a capital burquinense, Uagadugu, é chamada pela voz do povo. A primeira impressão foi mais ou menos decepcionante! Muitas motorizadas velhas - a cidade é também conhecida como a “capitale à deux roues” (capital das duas rodas) - carros muito antigos, alguns dos quais provisoriamente remendados, e bicicletas - na sociedade burquinense andar de bicicleta é sinal de que se pertence a uma classe social mais baixa  – povoam a rua. Casas planas e rectangulares, de um piso, por vezes de betão, outras de argila, marcam a paisagem. As casas circulares tradicionais desapareceram há muito, sinal do retrocesso… A cidade, que submerge e desaparece a meio da savana, um pouco desolada à primeira vista…

Vamos para Ouaga

Em comprimento e largura, descontrolada e desenfreada, Uagadugu continua a crescer. Cada dia novos imigrantes vêm e trazem o seu modo de vida agrícola tradicional na bagagem. Assim, o crescimento da população é constante. Uma cidade que integra cada vez mais a periferia. Recentemente contam-se as aldeias adjacentes na área da cidade. A cidade ganha cada vez mais um carácter rural. Os cientistas falam de “Rurbanição” da metrópole, um termo técnico para a mistura da ruralização e urbanização.

Desde a independência do país, em 1960, a população aumentou mais de vinte vezes. Hoje em dia, a capital burquinense tem mais de um milhão de habitantes, o que significa simultaneamente a existência de uma multiplicidade de etnias e línguas, com Mooré como língua do maior grupo, dos Mossi, que predominam. Não há conflitos. Muitos podem expressar-se em francês, a língua oficial, que garante que as diferentes etnias sejam capazes de entender-se entre elas. Muitos burquinenses adquiriram as suas competências de francês na Costa do Marfim, onde têm trabalhado nas últimas décadas como imigrantes, mão-de-obra em plantações, na área urbana de Abidjan, ou em outras cidades onde tentaram a sua sorte.

Segundo o modelo de Paris, Uagadugu é dividida em 30 sectores, o que facilita a orientação. Nesta cidade não é possível encontrar um centro tal como o conhecemos nas cidades europeias. Apenas um ou outro banco, alguns hotéis e a Grande Mesquita dominam o centro. O grande mercado é o ponto de gravitação do mar de gente. Mulheres com roupas coloridas vendem alimentos, homens negoceiam, oferecem serviços de conserto, sentam-se juntos, discutem. No meio, isolados, estão os loucos e novos discípulos do Alcorão, que pedem dinheiro com as suas caixas de lata vermelhas.

Bairros chiques e ricos

Com megalomania gaba-se o novo bairro urbano no sul, Ouaga 2000, onde fica o hotel mais caro de Burkina Faso e um pavilhão desportivo multifuncional. Um novo bairro de Embaixadas está em construção, elegantes vivendas privadas brotam da terra e um novo palácio presidencial revela a desigualdade maciça de um dos países mais pobres do mundo. Mas não só como burquinense abastado ou estrangeiro se pode viver bem. Também outros bairros, como Zone du Bois ou Petit Paris, oferecem um oásis de prosperidade: supermercados modernos, cafés e boutiques elegantes agradam às classes com maior poder de compra. Com o troco necessário pode ser bom viver nesta metrópole do Sahel.

Os Ouagalais

Seja rico ou pobre, à noite pode encontrar os Ouagalais - como os moradores da cidade são chamados - num dos muitos Maquis da cidade, a forma Oeste africana das cervejarias. Apesar do encarecimento dos alimentos básicos e protestos massivos contra “la vie chère” (a vida cara) brinda-se com as cervejas locais, como Brakina, Sob.bra, Flag e a cerveja de milho Dolo, a uma vida despreocupada porque a esperança é a última a morrer. E se há uma ocasião especial, um Poulet télévisé, não perca. O nome Poulet télévisé é utilizado porque há vários anos que os frangos são rodados num grelhador eléctrico numa vitrina de vidro, até estarem bem passados, como se veria na televisão.

História e Revolução

“Wodgo”, como se chamava a cidade nos séculos passados, era a capital do reino Mossi no século XIV. Desde 1919, Uagadugu é a capital do país, no tempo da colonização francesa Alto Volta, na qual os franceses gastaram pouca energia. Nas décadas seguintes, foi por causa da ausência de um programa de planeamento urbano específico que a expansão se tornou descontrolada: um laboratório caótico de cimento e chapa ondulada foi o resultado. Só com a revolução (1983 – 1987), sob ordens de Thomas Sankara, a área urbana foi reorganizada. 85 por cento dos bairros ilegais foram parcelados (60 mil até 65 mil lotes de terreno) e equipados com uma infra-estrutura básica (latrinas, água corrente e electricidade). Slogans como “une famile, un toit” (uma família, um teto) e “un ménage, un logement” (um fogo, um alojamento) predominaram e adiantaram o “Projet urbain révolutionnaire” (projecto urbano revolucionário).

Presente

Os bairros ilegais surgiram de forma contínua até hoje. O espaço urbano não é suficiente para a população. Isto resulta numa periferia arranjada, pequenas casas de construção selvagem, argila e chapa ondulada. “8 tôles en non-lotie” (8 mq casa de chapa ondulada numa zona não-parcelada) que devem ser entregues ao Estado para beneficiar do parcelamento e receber um terreno.

Do ponto de vista cultural, Ouaga tem um valor muito especial. Porque a cada dois anos acolhe o maior Festival de Cinema em solo africano, o festival pan-africano FESPACO (Festival Panafricain du Cinéma et de la Télévison de Ouagadougou), assim como, para os amantes de arte, a SIAO (Salon international de l`artisanat de Ouagadougou), uma feira de artesanato.

por Sebastian Prothmann
Cidade | 11 Novembro 2011 | agricultura, cidade, mercado, periferia, ruralização, Uagadugu, urbanização