De como se constrói um imigrante

Peço o título emprestado a um artigo de Ana Bigotte Vieira publicado no BUALA – Cultura Contemporânea Africana. A autora apresenta, sem sentimentalismos e excessos na escrita, a situação que se vive próximo de Ceuta, em solo marroquino, lugar onde se reúnem pessoas de várias nacionalidades, à espera do momento certo para tentarem o salto desesperado e esperançado contra o arame farpado. Contra elas, a exaustão, a fome, os abusos dos donos das redes de imigração ilegal, mas também das polícias marroquina e espanhola, e o SIVE, um sistema de detecção e bloqueio dos barcos dos imigrantes em alto mar, composto por radares, câmaras de vigilância e ligação por satélite, que permite às autoridades impedirem o acesso à costa.

Ao ler o artigo de Ana Bigotte Vieira, lembrei-me de um dos meus livros favoritos. Eldorado, de Laurent Gaudé (ed. ASA), veio parar nas minhas mãos por acaso. Comecei a ler com alguma indiferença - não tinha mais nada para ler naquele dia - mas rapidamente a escrita do autor francês me captivou e não consegui largar o livro até o acabar. Esta é a história do comandante Italiano Salvatore Piracci que durante vinte anos patrulha o Mediterrâneo e intercepta as embarcações dos imigrantes clandestinos, muitas vezes abandonadas em alto mar pelos traficantes. Um dia, a sua fé na missão é profundamente abalada quando é confrontado por uma sobrevivente que perdeu o seu filho durante a viagem. O comandante abandona tudo e todos e segue o caminho dos imigrantes, tornando-se um deles. Paralelamente, seguimos a história de dois irmãos que saem do Sudão esperando poder chegar à Europa, o novo Eldorado. Só um deles chegará ao destino.

Foi também ao livro de Laurent Gaudé que pensei quando olhei pela primeira vez para a obra do artista camaronês Barthélémy Toguo Road for Exile, integrada na exposição Islands Never Found, apresentada no Museu Estatal de Arte Contemporânea de Thessaloniki, Grécia. Mesmo antes de saber qual era o título da obra, a fragilidade no equilíbrio das peças amontoadas no barco, a falta de espaço, a transparência do mar feito com garrafas de vodka (bonito, mas duro e enganador ao mesmo tempo), lembrou-me as histórias contadas por Gaudé, o universo por ele descrito. Barthélémy Toguo criou até agora cinco versões da peça Road for Exile. Uma delas foi apresentada no ano passado no Carpe Diem no Bairro Alto (ler artigo no BUALA).

Recentemente li mais um romance cujo tema era a imigração. Leaving Tangier (não traduzido para português), do poeta e escritor marroquino Tahar Ben Jelloun, é um livro que conta a história de dois irmãos marroquinos que procuram uma vida melhor em Espanha. Um livro sobre uma realidade que em grande parte desconhecia (sobre o regime marroquino ou sobre as relações amorosas e a homossexualidade num país árabe), o contraste sempre presente entre o tradicional e o moderno, e também entre a Europa e a África do Norte. A abordagem a estas temáticas torna-se mais interessante pelo facto de o autor estar radicado em Paris há quarenta anos, vivendo entre (ou dentro de) as duas culturas.

Maria Vlachou

tirado do blog Musing on Culture

08.01.2011 | por martalanca | Barthélémy Toguo, deslocação, imigração

CHILE DESLOCADO

Um conjunto de exposições, ciclos de debates e conversas com artistas, cinema e performances invadem a cidade de Santiago do Chile em DISLOCACION, de 01 septiembre a 15 noviembre 2010

+ El interés particular de DISLOCACION como proyecto, es la globalización, con sus causas y efectos. El proyecto da a ver un tipo de ‘nomadismo reproducido’, lo que concretamente implica como personas viven en un desfase, sea tanto económico, histórico y/o cultural. Me interesa cuestionar el contexto de la globalización, que es donde surge la pregunta por la trascendencia de la migración, la desterritorialización, las diferencias sociales, las diferencias culturales y las diferencias políticas relacionadas con la economía y política global.

Para DISLOCACION he invitado a artistas y teóricos europeos y chilenos que he encontrado en estos últimos 20 años de trabajo, definiendo con ellos un ambiente de investigación específico en Chile. La exposición DISLOCACION será un ensayo con diferentes procesos estéticos en diferentes lugares de Santiago de Chile, con el fin de realizar investigaciones sobre realidades geopolíticas relacionadas con nuestra historia local y global.

…las preguntas ya no son: ¿Qué exponer? ni ¿Cómo exponer? La pregunta más bien es: ¿Qué se puede producir a partir de DISLOCACION?  Y precisamente, ¿Qué tipo de producción se puede generar en un país como Chile? donde la desterritorialización, la deslocalización, la desarticulación, el exilio y la migración son temas históricos y por la misma razón, más que nunca, actuales.

En DISLOCACION somos conscientes de que la ausencia de una decisión común conduce a todo proyecto colectivo de exposición a la adaptación del mismo en diversos espacios. Esto se materializará a través de intervenciones específicas y pertinentes considerando sobre todo que toda norma demasiado estricta somete a la participación de cada uno/a a una demostración y justificación conceptual por cada proyecto para DISLOCACION.

Curadoria: Ingrid Wildi Merino

Artistas:

Ursula Biemann/Boisseau & Westermeyer/ Juan Castillo/ OOO Estudio
Thomas Hirschhorn/ Alfredo Jaar/ Voluspa Jarpa/ Josep-Maria Martín/ Mario Navarro/ Bernardo Oyarzún/ RELAX (chiarenza & hauser & co)/ Lotty Rosenfeld/ Camilo Yáñez/ Ingrid Wildi Merino

 

01.09.2010 | por martamestre | arte contemporânea, chile, deslocação, globalização