A filmografia sobre a «Ásia portuguesa» realizada em Portugal durante o Estado Novo é limitada. Produzida tardiamente, projectou uma retórica luso‑tropicalista que propagandeava a importância — mítica, porque já passada — de um império outrora vasto. Durante a ditadura, as colónias orientais mantinham sobretudo um valor simbólico.
Analisando a filmografia existente, Vento Leste propõe que a escassez de filmes sobre o «Oriente português» decorre sobretudo do valor simbólico destas comunidades imaginadas, evocadas com certa indefinição porque a sua relação com a metrópole estava há muito em desagregação, assentando em projecções e ruínas. Com o surgimento de tensões entre Portugal e a Índia quanto à autonomização da «Índia portuguesa», a filmagem das colónias orientais surgiu da necessidade de a ditadura sedimentar um discurso luso‑orientalista, que, não obstante, ignorou as especificidades locais e a miríade de diferenças entre a África e a Ásia e entre os territórios colonizados nessas regiões.
Maria do Carmo Piçarra: “É o culminar de um processo de investigação que me ocorreu fazer no pós-doutoramento quando, durante os visionamentos no CNC, em França, percebi que aqui estávamos a começar a estudar as representações filmadas das ex-colónias africanas - que perduram ainda hoje -, mas não aquelas relativas a Macau, Timor e à chamada (durante a ditadura) Índia Portuguesa. É sempre um gosto ser acolhida pela Livraria Linha de Sombra, onde amanhã, às 18h, o investigador Ricardo Roque e o director do Museu do Oriente, João Amorim, me dão o gosto de apresentar o livro. Também é o primeiro livro que publico com as Edições tinta-da-china e tem sido muito bom trabalhar com a sua equipa. Os cinco capítulos são ilustrados com fotografias que “garimpei” em várias colecções (Cinemateca, MUHNAC, Arquivo do Ultramar, Fundação Oriente). Tudo magnificamente paginado pelo Pedro Serpa (T-d-C), que também assina a capa, muito bonita. A seguir ao lançamento, haverá uma sessão com a Linha de Sombra que inclui a projecção de filmes programados por mim, com o apoio do FILMar - obrigada ao seu coordenador, Tiago Bartolomeu Costa -, em que haverá a possibilidade de ver pela primeira vez a versão digitalizada de Os pescadores de Amangau, filme de Miguel Spiguel exibido na VIII edição do Festival de Cinema de Berlim, e uma montagem de materiais filmados por Ruy Cinatti (entre filmes de propaganda explícita). Fecha um ciclo da minha vida, e não só de modo simbólico. Agradeço a presença das amigas e amigos que possam partilhar este momento comigo. Com o FILMar, estarei também no Porto/Post/Doc (e com a sua magnífica equipa), a lançar o livro, a dar formação a professores, a debater filmes e muito mais. Será uma alegria.”