Marketing comercial nas empresas de telecomunicações num contexto de pobreza: o caso da Guiné-Bissau

Qual é o efeito do marketing comercial onde há elevados níveis de pobreza? O que faz com que as empresas inseridas num contexto de fragilidade social, económica, e de escassez de recursos tais como a energia eléctrica, água potável, com a maioria da população vivendo com menos de dois dólares por dia e com a incerteza de receber o salário mensal escolham o sector de telecomunicações para investirem? Quais são os requisitos para que o cidadão comum guineense adquira um aparelho de telemóvel? Qual é o significado de possuir um telemóvel (celular)? Quais são os produtos e serviços associados à estratégia de marketing? Como é que os Media favorecem (ou não) a inculcação dos modelos e valores num meio onde maior parte da população é analfabeta e dominada pela cultura da oralidade? Mais do que deambular nos condicionalismos que a priori o fenómeno da pobreza impõe, este estudo inédito na Guiné-Bissau mostra alguns impactos desencadeados no mercado de telecomunicações pelas operadoras existentes, através da introdução da comunicação móvel, as alternativas criativas que são geradas pelo mercado e as estratégias dos consumidores/clientes face aos serviços/produtos oferecidos, enquanto um dos actores-chave do processo.

NOTAS INTRODUTÓRIAS

O telemóvel, aparelho de comunicação por ondas electromagnéticas que permite transmissão bidireccional, é considerado uma das invenções mais importantes da humanidade. O seu uso proliferou por todo mundo, desde a sua produção pelo laboratório Bell, nos Estados Unidos da América em 1947.

Actualmente, o simples acto de usar telemóvel deixou de ser um factor de luxo e de importância social, mas de necessidade e estilo de vida. As características do telemóvel, como: o formato, o tamanho e o peso são factores determinantes para associar os utilizadores a determinados estilos de vida. O telemóvel não é apenas usado para conversas telefónicas tradicionais, mas também é possível receber e enviar E-mails, realizar vídeo-conferência, mandar fax e aceder à Internet, tirar fotografias, ouvir música e rádio, etc.

Assim, os telemóveis são cada vez mais associados aos computadores, contribuindo todas estas características para a natural convergência das telecomunicações. Os registos históricos apontam que a primeira ligação de um telemóvel foi realizada no dia 3 de Abril de 1973, em Nova York por Martin Cooper gerente da empresa Motorola, através de um aparelho que tinha 25 cm de comprimento e 7 cm de largura, pesava cerca de 1 quilo e tinha uma autonomia da bateria não mais que 20 minutos.

O serviço de rede móvel chega a Guiné-Bissau através do Global System for Mobile - GSM, trinta anos após o primeiro contacto realizado via telemóvel, coincidindo também com o trigésimo aniversário da independência nacional. Com tecnologia da segunda geração (!) num dos países mais pobres do mundo1 e com infra-estruturas quase inexistentes.

Então, torna-se legítimo questionar: como funciona o marketing comercial nas empresas de rede móvel de telecomunicações num contexto de elevado nível de pobreza, neste caso, na Guiné-Bissau? Actualmente, o grande desafio dos profissionais de marketing é descobrir os motivos por detrás do comportamento da compra dos consumidores, considerando que essas compras são extremamente influenciadas pelas características culturais, sociais, pessoais e psicológicas (KOTLER, 2003: 119).

Diante de todos esses desafios, as empresas de telecomunicação na Guiné-Bissau, deparam com outro factor: a extensão e a profundidade do fenómeno da pobreza. Ora, se o conceito da pobreza, é a carência ou insuficiência dos recursos materiais indispensáveis para satisfazer as necessidades básicas da vida, qual é o comportamento dos guineenses em relação aos serviços de rede móvel no país, tendo em conta as suas condições sócio-económicas?

O nosso propósito é de tentar perceber os mecanismos que permitiram a viabilização do serviço de telecomunicações, inserido no contexto pouco propício. Mais especificamente procuramos neste artigo, problematizar a existência de um comércio de telecomunicação móvel num país que figura entre os primeiros oito (8) mais pobres do mundo.

Nesta base, através do recurso as metodologias essencialmente qualitativas - análise documental (legislação, decretos, programas, relatórios, projectos adoptados pelo governo e as empresas), entrevistas semi-directivas (a decisores, especialistas no domínio e clientes das empresas em estudo) e análise iconográfica (fotografias, outdoors, panfletos e peças de publicidades diversas) - a fim de perceber o carácter das mudanças desencadeadas, desde a liberalização do sector das telecomunicações até ao uso dos telemóveis por parte do cidadão comum, numa perspectiva comparada, convocando similitudes e diferenças entre si, de modo a visualizar o desempenho do mercado guineense. Da mesma maneira, durante três meses, a análise privilegiou uma perspectiva histórica e longitudinal no exame dos indicadores, mostrando sempre como é que o parâmetro em análise evoluiu nos marcos temporais pertinentes.

É com base nesses pressupostos que orientamos os nossos objectivos de pesquisa, não só no questionamento das funcionalidades do marketing das empresas de telecomunicações móveis num contexto de pobreza, mas sobretudo no impacto e efeito dessas estratégias na fidelização dos clientes e/ou na preferência do público.

Aspecto de  cabine de telefone num bairro da periferia de BissauAspecto de cabine de telefone num bairro da periferia de Bissau

CARACTERIZAÇÃO DO SECTOR DAS TELECOMUNICAÇÕES NA GUINÉ-BISSAU

As empresas de telecomunicações na Guiné-Bissau

Apesar de já existirem estruturas básicas e funcionamento de telecomunicação desde o período colonial (até 1973). A história de telecomunicações na Guiné-Bissau pode ser dividida em duas fases: - período do monopólio do sector da telecomunicações (1800…CTT a 2003), - e o período pós-liberalização (após 2003).

Fase do monopólio (CTT-2003)

Em 1989, foi criada a Guiné Telecom, S.A.R.L., com capitais mistos (51% Portugal-Telecom e 49% Estado guineense), a quem foi concedida a exclusividade de todos os serviços de telecomunicações de uso público na República da Guiné-Bissau, mediante um contrato assinado entre o governo guineense e a Companhia Portuguesa Rádio Marconi (CPRM)2. O mercado era dominado pela Guiné Telecom, como única prestadora de serviços de rede fixa de telecomunicações, com grande número de clientes sem qualquer concorrente directo no mercado nacional.

Segundo LAMBIN (2000: 357), quando existe monopólio a empresa detém, em princípio, um elevado poder de mercado, mas na realidade é muito rapidamente ameaçada por novos concorrentes atraídos pelo potencial de crescimento e de lucro. Apesar da Guiné Telecom beneficiar do monopólio3, optou por estratégias diferentes das adoptadas em outros países, onde a lógica do negócio difere da empresa privada: deixa de existir a lógica do lucro para dar lugar ao interesse geral e serviço público, contrário da empresa privada, onde a lógica é o lucro.

A previsibilidade do monopólio, foi um dado essencial que não foi levado em conta pela Guiné Telecom S.A.R.L: por um lado, o monopólio criou situação de conforto para a empresa, que consequentemente não demonstrou ter interesse no investimento em infra—estrutura e inovação, por outro lado, a falta de capacidade de visão a longo prazo na criação de estratégia de barreiras defensáveis à entrada de novos concorrentes. Todavia, importa também ter consciência de que um monopólio raramente é absoluto, pois, existem concorrência dos serviços sucedâneos.

Período pós-liberalização (pós 2003)

Como acima referido, o monopólio durou até 1999 (embora no que concerne aos serviços de telefonia durou de facto até finais de 2003), sendo os factores que o influenciaram, a adesão do país ao multipartidarismo (1994) e também as mudanças verificadas no partido do governo (pela primeira vez o Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo-Verde – PAIGC no poder desde 1973, perde as eleições a favor do Partido da Renovação Social – PRS, em 2000).

Entretanto, após o conflito-militar 1998-99, que levou a formação do Governo de Unidade Nacional - GUN, viu-se a necessidade de proceder a reformas profundas no sector das telecomunicações, com o objectivo de garantir maior acessibilidade dos serviços a todas as camadas da população e promover o desenvolvimento social e económico do país. Nesta óptica, tornava-se fundamental tomar medidas no sentido do cumprimento dos compromissos internacionais assumidos e acompanhar de uma forma gradual o ritmo do desenvolvimento da tecnologia de informação e comunicação, que se tornava (e torna) cada vez mais, acelerado a nível mundial.

Assim, através de uma série de pacotes legislativos foram aprovados em 20 de Agosto de 1999, um conjunto de decretos: Lei de Base das Telecomunicações (Decreto-Lei n.º 3/99); Estatuto do Conselho Superior das Telecomunicações (Decreto n.º 6/99); criação do Instituto das Comunicações da Guiné-Bissau (Decreto n.º 7/99); Regime de Acesso a Actividade de Operador e de Prestador de Serviços de Telecomunicações de Uso Público (Decreto n.º 8/99); Declaração de política Sectorial das Telecomunicações (Decreto n.º 9/99). Assim, o governo assumiu de forma inequívoca o seu propósito de liberalizar a prestação dos serviços de telecomunicações e mandou adequar o então contrato de concessão da Guine Telecom ao novo quadro legal4.

Contudo, não houve adequação efectiva, na medida em que não houve efectivamente a modificação do contrato entre as partes (PT e o Estado da Guiné-Bissau), facto esse, que resultou em conflito permanente entre as partes. Convém ainda referir que a Lei de base, foi modificada sucessivamente por decretos governamentais, que acabaram por restringir o acesso ao sector, ou seja restringir a liberalização plasmada na lei de base.

A Guinetel, existiu baseada na lei que concedia a Guiné Telecom uma licença móvel e pelo facto que já tinha direito pelo contrato de concessão a prestar serviço móvel. Já havia serviço móvel prestado pela Guiné Telecom até 7 de Junho, com tecnologia NMT da Noquia. Esse serviço paralisou em consequência do conflito político militar de 1998/99.

Após a aprovação dos decretos acima referidos, em 20 de Dezembro de 2003, a empresa GUINÉTEL, S.A5, uma sociedade composta por capital nacional e estrangeiro (Grupo PT)  GTM actual, resulta das negociações entre a PT e o Estado da Guiné –Bissau, que conduziram a um novo contrato de concessão para a Guiné Telecom e a adequação as exigências do Banco Mundial e da lei em vigor, começa a funcionar no país, oferecendo serviço de rede móvel com tecnologia GSM 900 da segunda geração na Guiné-Bissau6.

ete meses depois, a SOCIEDADE SPACETEL S.A. GUINÉ-BISSAU, denominada Areeba, começa a operar, que posteriormente, foi comprada pelo grupo MTN7 de capital Sul-africanos em 19 de Novembro de 2007. Em 2004, através do Decreto n.º 3/2004, é aprovada as Bases de Concessão do Serviço Público de Telecomunicações. E no dia 25 de Maio de 2007, a empresa SONATEL instala-se no mercado nacional com a denominação Orange Bissau, intensificando a concorrência no sector.Criatividade, adaptação e oportunidade de negócioCriatividade, adaptação e oportunidade de negócio

Cobertura da Rede de Telecomunicações e o Universo dos Consumidores/Clientes

Segundo os dados do Instituto de Comunicação da Guiné-Bissau (ICGB), em 2007, as três operadoras em conjunto tinham uma abrangência de 90% da cobertura ao nível nacional. Esta entidade reguladora, que também concede as licenças, indica que nesse mesmo período as duas operadoras (GTM e MTN) detinham, em conjunto, uma quota de mercado de cerca 70 mil clientes8. Mas segundo a International Telecommunications Union, o número dos telemóveis inscritos por cada cem habitantes era de 17.59

Com o início das actividades da empresa Orange, o mercado ganhou uma dinâmica interessante. No entanto, é em Bissau que se concentram a maioria dos usuários da rede móvel, e em seguida, nas cidades de Bafatá e Gabú, no leste, e ainda na vila de Quebo, no sul do país.

No que concerne à liderança do mercado, os Media nacionais apresentam a multinacional panafricana MTN como o operador mais bem posicionado no mercado. Embora não existam dados oficiais do ICGB que o validem, esta pode ser justificada pelo número de clientes e pela sua cobertura 80%10 ao nível nacional, abrangendo as oito regiões e o sector autónomo de Bissau11.

Estes resultados podem ser explicados, no nosso entender, através dos seguintes factores: por um lado, o económico – preços acessíveis do cartão SIM (chip – equivalente a 4 dólares), preços baixos de tarifas na introdução da marca/serviço no mercado associado ao sistema de venda a retalho12, técnicas de promoção, focados especialmente na redução de preços, através de descontos até 99%; e, por outro, a ousadia em investimentos nas infra-estruturas e inovação dos serviços, como serviços liga-me, transferência de crédito, serviço RAP – funciona como uma cabine móvel, onde a única condição de uso é pagar o tempo da chamada.

A GTM, a primeira a entrar no mercado, e que esteve durante sete meses livre da concorrência, não soube aproveitar essas vantagens ocupando actualmente a última posição no ranking do mercado de telecomunicação móvel, mesmo em relação à Orange que opera à menos de dois anos no mercado. Esse lugar no mercado pode ser explicado pela falta da visão e por uma perspectiva de imediatismo no lucro. Uma outra explicação, ainda, não relacionada directamente às estratégias das empresas concorrentes na abordagem do mercado, foi a expressiva queda do preço do aparelho de telemóvel (os primeiros telemóveis custavam no mínimo 190 dólares), consequência da inundação dos aparelhos no mercado, sobretudo através do comércio informal animado pelos Djilas13.

Analisamos, no ponto seguinte, as estratégias de marketing e comunicação das operadoras e as respostas dos clientes às mesmas, no contexto guineense.

PERFIL DOS CLIENTES FACE A ESTRATÉGIAS DE COMUNICAÇÃO E MARKETING DAS OPERADORAS

Públicos e Usuários da Rede Móvel

O uso do telemóvel generalizou-se a quase todas as esferas da sociedade guineense. O seu uso deixou de ser um factor de importância social, mas de necessidade e estilo de vida. Essas duas condições são muito relevantes, pois são factores que influenciam o comportamento do consumidor. Só quando existir uma necessidade é que as pessoas vão procurar satisfazê-la, normalmente as necessidades fazem parte do elemento básico da condição da acção humana. Por outro lado, o estilo de vida – padrão de vida de uma pessoa expresso na sua psicografia, que vai além da classe social e da personalidade da pessoa, e está mais condicionado à interacção do indivíduo com o mundo.Serviço de distribuição e venda de bananas nos arredores de BissauServiço de distribuição e venda de bananas nos arredores de Bissau

Do ponto de vista de estilo de vida, o público da rede móvel, pode ser enquadrado segundo a tipologia VLAS - values and lifestyles, (KOTLER, 2003: 125-126), em duas dimensões: quanto à auto-orientação, são consumidores orientados pela acção, são impulsionados pelo desejo, por actividade, variedade e risco, e quanto aos recursos, a maioria pertence a classe de baixa renda.

Segundo os dados da ITU-D (2007), verifica-se uma taxa de penetração de telefone móvel de 17.5%, ou seja, 272 mil pessoas usam o serviço de telemóvel na Guiné-Bissau. O uso do telemóvel no país correspondeu a um processo de aprendizagem baseado na acção, ou seja, quando as pessoas agem, elas aprendem. A aprendizagem por sua vez, conduz mudanças de comportamento – muitos dos comportamentos humanos são aprendidos com base na experiência. As interacções de impulsos, sinais, estímulos, reforços, entre o produto e o público contribuem para o seu uso através da aprendizagem.

Neste sentido, a GTM, que foi o primeiro operador a entrar no mercado, desempenhou um papel muito importante no estímulo e na educação do público para o uso do telemóvel. Os investimentos da empresa nas campanhas publicitárias impulsionaram o uso aos serviços de telemóvel e o seu progressivo aumento.

A liberalização do mercado e a entrada das empresas no sector favoreceu o acesso e a utilização do serviço de rede móvel, especialmente no que diz respeito à aquisição do cartão SIM e tarifas baixas. No entanto, a dinâmica do mercado nem sempre teve esse comportamento, pois, quando a Guiné-Bissau só tinha uma única operadora móvel (GTM), o privilégio de aderir à rede móvel era reservado às pessoas de elevado poder económico, considerando que o seu custo correspondia, na altura, a cinco vezes mais o salário mínimo14. Não obstante essas mudanças, desencadeou-se uma forte disputa do público, que acabou por proporcionar o reforço do acesso aos serviços disponíveis, quer em termos de preço, quer na melhoria da qualidade das tecnologias e atendimento ao cliente, mas também, no investimento em novos serviços e conquista de mercado através do marketing social.

Anúncio de venda de créditoAnúncio de venda de crédito

As condições básicas que determinam o acesso e uso do serviço da rede móvel referem—se sobretudo de dois elementos: o aparelho do telemóvel e o cartão SIM. A esses elementos associam-se o factor económico como condição de manutenção do uso, as infra-estruturas (acesso a rede eléctrica permanente) e o nível de instrução. Este conjunto de factores, num contexto como o da Guiné-Bissau, pode condicionar a exclusão de grande parte das pessoas do uso deste serviço.

O público-alvo, do ponto de vista organizacional, é composto por indivíduos que, de uma forma directa ou indirecta, podem afectar o desempenho da organização das empresas. Assim, justifica-se que estas três empresas dividam estrategicamente o seu público em dois grandes segmentos: pessoas de natureza colectiva e jurídica (instituições do Estado, empresas, ONG`s, Cooperativas…) e pessoas singulares (estudantes, profissionais liberais, djilas, chefes de família, bideira15).

Rádio - um espaço privilegiado para as publicidades

No universo dos Mass Media, a Rádio é na Guiné-Bissau o meio de comunicação de excelência e eleição, por ter uma característica familiar (de proximidade) e abrangente, mais acessível (quer em termos de preços e utilização), reforçado pela cultura da oralidade em primazia na nossa sociedade e também devido ao condicionalismo da falta de infra-estruturas, especialmente a energia eléctrica16.

Nesta base, as operadoras encontraram um suporte fácil, barato e familiar do público e consumidor que conseguem abranger todas as dimensões da população, mesmo os que estão excluídos dos centros urbanos, incluindo a população analfabeta (64%) e que jamais teriam possibilidade de um eventual contacto com essas empresas e os seus produtos. Ora, isso faz com que, o grosso dos investimentos em publicidade e marketing sejam direccionados de uma forma subtil aos ouvintes17.

As Rádios acabam por ser o eco de um meio e factor de educação de uma parcela da sociedade, não só no uso dos aparelhos, suas vantagens, utilidades e importância, mas sobretudo no apelo ao consumo. Desta forma, a Rádio, através do marketing empresarial assume o papel de arquitecto da sociedade de consumo (LAMBIN, 2000: 4).

Aproveitamento de Espaços e Festas Populares

Para além da rádio, uma das estratégias de marketing bastante explorada pelas operadoras, é o uso dos espaços públicos e das festas populares, especialmente nos grandes eventos nacionais (carnaval, natal e novo ano).

Nessas alturas pode-se observar-se publicidades com carácter de agressividade e competição nas duas principais cidades de grande consumo (Bissau – capital, e Gabú – situada nas proximidades da fronteira com a vizinha República do Senegal). O recurso a outdoors, panfletos, dísticos e cartazes, contribuem para uma autêntica poluição visual. Embora, o Código de Postura coloque algumas normas de utilização e publicidades visuais, que na maioria dos casos não são respeitados, quer pelo desconhecimento e ignorância por parte das empresas, como pela fraca capacidade do Estado, em especial serviços camarários, em matérias de fiscalização.

As festas populares também são muito aproveitadas, para concursos, sorteios, jogos, actividades lúdicas e patrocínios - merchandising.

A Lógica de Oferta e da Publicidade

Os apelos publicitários assumem várias características entre as três (3) operadoras. Percebe-se uma forte tendência ao apelo de carácter nacional, cultural e étnico, apesar dos líderes do mercado serem empresas estrangeiras.

Estes factos podem ser constatados quer ao nível dos outdoors, como nos cartões de carregamento de créditos que são baptizados por termos em crioulo18 e com imagens de figuras e paisagem nacional. Em relação a GTM, por exemplo, explora o seu “estatuto” nacional através de mensagens como «Ami i guineense n´ta fia na ki ki di tchon19». Já a Orange explora o facto de ser a última a entrar no mercado, persuadindo os potenciais clientes com apelos como «Orange i sabi20».

Cartões de crédito ou saldoCartões de crédito ou saldo

Para além dos apelos publicitários, as empresas investem consideravelmente nas promoções. Analisando as dinâmicas do mercado e do comportamento dos consumidores, constata-se que há uma forte tendência de adesão àquelas.

Este comportamento e sensibilidade dos consumidores demonstram que, no contexto da Guiné-Bissau, as estratégias de fidelização têm efeitos perversos, na medida em que o uso (ou não) de um serviço depende estruturalmente das vantagens nítidas, principalmente económicas, que podem ser traduzidas nas reduções do preço das tarifas e bónus no carregamento. Para enfatizar, podemos ilustrar o caso da campanha da empresa Orange, que durante as festividades de carnaval 2009, adoptou a estratégia de vender dois telemóveis pelo preço de um mas, finda a campanha, verificou-se uma notória descontinuidade em termos de uso e/ou dos números dos aparelhos vendidos.

Isso demonstra que os consumidores aproveitam a oferta em seu benefício e param de usar o serviço quando esse não constitui uma vantagem adicional, ou seja, por ser pobre, o usuário é mais atento aos gastos e não se rende ao “hábito” de consumir determinado produto quando não é o mais vantajoso no mercado. É o caso daqueles que utilizam a GTM exclusivamente para ligar para o estrangeiro e também quando as SMS são de graça entre a mesma operadora.

No caso da estratégia da MTN, que apela ao consumo «o mundo para ti não tem barreiras; fala ao segundo, paga por segundo», aproveitando a sua condição do patrocinador oficial do campeonato de mundo 2010 na África de Sul, um mecanismo demonstrativo de promoção do investimento em África, através da valorização do desporto, podendo tirar partido junto dos jovens e em particular a mobilização dos desportistas. Parece-nos todavia, totalmente fora das capacidades cognitivas do público, por isso, o seu impacto é diminuto.

Serviços prestados pelas operadoras

Um produto é qualquer coisa que possa ser oferecida a um mercado para satisfazer uma necessidade ou um desejo. Além dos bens tangíveis, podemos considerar como produtos os serviços – actividades ou benefícios oferecidos para venda, os quais são essencialmente intangíveis e não resultam na posse de nada (KOTLER, 2003: 4).

Apesar da GTM, MTN e Orange serem empresas vocacionadas para a prestação de serviços de telemóveis, também oferecem serviços periféricos que podem ser divididos em serviços facilitadores e diferenciados. Esses serviços variam em cada operadora. Os serviços diferenciadores são muito rapidamente copiados pela concorrência, por isso devem ser o objecto de constante inovação.Agência de carregamento de telemóveisAgência de carregamento de telemóveis

Como consequência, num curto espaço de tempo, tornam-se serviços facilitadores. Esta afirmação pode ser empiricamente constatada com o exemplo da introdução do serviço de atendimento ao cliente como um serviço inovador e diferencial, sendo que actualmente não seria compreensível a existência de uma empresa sem serviço de atendimento ao cliente, ou seja tornou-se algo rotineiro.

Um outro aspecto importante que se deve levar em conta, quando se trata da prestação de um serviço é a seu carácter peculiar: i) o seu carácter intangível não permite que seja apreciado, é preciso usar primeiro para perceber se corresponde às expectativas do consumidor; ii) a distribuição e o consumo do serviço ocorrem de forma simultânea, ou seja, a fábrica é o próprio ponto de venda e, consequentemente não podem ser armazenados, o que pode causar dificuldades no ajustamento entre a procura e a oferta (estratégia MTN zone); iii) a produção de serviço pressupõe uma relação directa entre a empresa e o cliente e; iv) a sua qualidade é heterogénea.

Serviços prestados por operadoras

SERVIÇOS

Operadoras

GMT

MTN

Orange

Liga-me

Não

Sim

Sim

MTN Zone

Não

Sim

Não

Quem sou eu

Sim

Sim

Sim

Mensagem de voz

Não

Sim

Não

Transferência de crédito

Sim

Sim

Sim

Quem te ligou

Não

Sim

Não

Caixa de correio de mensagem

Não

Sim

Não

Internet GPRS

Não

Sim

Em Projecto

“MIM” 646

Não

Sim

Não

Serviço de apoio ao cliente

Sim

Sim

Sim

RAP

Não

Sim

Não

EVI

Não

Sim

Não

Mobile Money

Não

Sim

Não

Livebox

Não

Não

Sim

Fonte: GMT/MTN/Orange (2009)

Elementos de Diferenciação

O mercado guineense da telecomunicação é actualmente caracterizado por forte concorrência, especialmente no que diz respeito à atracção da atenção dos clientes, notoriedade, persuasão, causando um comportamento da simpatia pela operadora, através da técnica do baixo preço como meio privilegiado de atracção e de benefício para o consumidor.

Essa prática (preço-baixo) justifica-se pelo contexto económico e social do país, caracterizado pela incapacidade do Estado em satisfazer as necessidades básicas da sua população (as condições são de sobre-vivência contingenciais, sendo como estratégia familiar da maior parte da população garantir uma refeição diária – um tiro!). Este facto, limita a demanda e torna as pessoas mais sensíveis aos preços do que aos outros atributos como atendimento, serviço, qualidade, segurança, utilidades do produto.

Assim, o factor preço acaba por determinar a exclusão e/ou inclusão no acesso ao serviço. Todavia, é evidente que a estratégia de redução do preço tem limitações pois, os custos estabelecem o patamar do preço que a empresa deve cobrar pelo serviço, considerando que aquele tem de cobrir todas as despesas de serviço (produção, distribuição, marketing, etc). A solução passa pelo desenvolvimento da oferta, entrega e imagem diferenciada. Todos esses elementos deverão incluir características inovadoras específicas, de acordo com o contexto, em que se destacam as ofertas dos concorrentes.

Neste quadro, a sobrevivência e a prosperidade dependem da criatividade de cada empresa, ou seja, da capacidade de gerar novas orientações estratégicas mais rapidamente que os concorrentes.

Uma estratégia de diferenciação aplicada tanto ao nível de produto, preço, promoção e praça - mix de marketing, implica que os consumidores encontrem uma vantagem importante, vantagem essa que não encontrariam no concorrente.

Seguidamente, procuramos analisar as concepções dos usuários relativamente ao telemóvel enquanto valor simbólico.

CONCEPÇÕES DOS USUÁRIOS DOS TELEMÓVEIS ENQUANTO VALOR SIMBÓLICO

Sentido Subjectivo (valor simbólico de ter telemóvel)

Para um guineense comum, o que significa ter um aparelho de telemóvel? Retomando as análises feitas nos referentes aos elementos de diferenciação, pode-se questionar ainda, o que pode significar a um jovem ter um telemóvel, numa sociedade onde são escassos dois dos seus principais recursos de uso – energia eléctrica e dinheiro?

Serviço de telefonia ambulanteServiço de telefonia ambulante

Ora, a questão fundamental que se põe a este nível é a da «pobreza». Na perspectiva de Baudrillard (2005), a felicidade constitui a referência absoluta da «Sociedade de Consumo», revelando-se como equivalente autêntico da salvação. Essa noção de felicidade não deriva da inclinação natural de cada indivíduo para realizar por si mesmo, mas sim, advêm-lhe do facto que o mito da felicidade é aquele que recolhe e encarna o mito da igualdade (BAUDRILLARD, 2005: 47).

Para este autor, tal como a escola, o consumo é instituição de classe: não só na desigualdade perante os objectos, no sentido económico - a compra, a escolha, a prática são reguladas pelo poder e compra, enquanto o grau de instrução, é a função de ascendência de classe -, mas de modo ainda mais profundo, há uma discriminação radical no sentido de que só alguns ascendam a lógica autónoma e racional dos elementos do ambiente - uso funcional, realização cultural. Daí que os objectos conseguem unicamente simular a essência do social – O ESTATUTO (BAUDRILLARD, 2005: 56-59).

Na cidade de Bissau, nos primeiros momentos do funcionamento dos telemóveis, a simples posse de um telemóvel por um membro de um grupo de colegas ou num espaço público (muita das vezes combinadas), era factor de admiração da pessoa em causa. Na actualidade, é ainda frequente encontrar nalguns espaços (mercado, cafés, bairros populares) indivíduos com aparelhos de telemóveis pendurados no pescoço (como colares).

Estas dinâmicas acabam por funcionar como mecanismos de manipulação. Constituem signos que distinguem o indivíduo quer filiando-o no próprio grupo, tornando-o como uma referência do ideal, quer, ao mesmo tempo, demarcando-o do respectivo grupo por referência a um (grupo), de estatuto superior.

Nesta base, todo o significado cultural é criado como o uso de símbolos e, todo o símbolo é qualquer objecto ou evento que se refere a alguma coisa, neste caso o aparelho de telemóvel. Entretanto, a descoberta dos significados dos símbolos passa pela compreensão dos significados que esses símbolos têm para os indivíduos, mas vai mais longe que isso - passa também pela compreensão do uso que os indivíduos fazem desses símbolos (PAIS, 2002: 127-128).

Fazendo recurso à conhecida escala teórica da hierarquia de necessidades de Maslow, estabelece-se que as necessidades individuais básicas são de natureza fisiológica; necessidade de protecção e segurança (saúde, saneamento básico, educação e segurança); necessidades sociais - supridas por diversidade, pauta de bens de consumo e serviços; necessidade de status - suprida pela convivência em ambiente em que todos desfrutam de altos padrões de desenvolvimento; por fim o reconhecimento em escala global – auto-estima. (RESSETTI, 2003: 2009- 2009).

Entretanto, se a escala de necessidades varia em função dos estádios do desenvolvimento das sociedades e das pessoas, no caso guineense, caracterizado pela pobreza e precariedade de vida, essa lógica é invertida, através de salto no degrau do sistema de valores, no qual privilegia-se mais o status do que a de satisfação das necessidades básicas (fisiológicas, de segurança e sociais). Este comportamento deve-se a uma racionalidade que valoriza enquanto resultado, o alcance do status como mecanismo de suprir os outros estádios, fazendo recurso a aceitação e ascensão social, reputação e respeito. Porém, importa salientar que essas categorias estão longe de implicar o «mérito social», tornando o processo em algo paradoxal.

Nesse contexto, o tempo e o espaço organizam-se também em torno do presente. A sua dimensão temporal tem de ser vivida no dia-a-dia (PAIS, 2002: 88). O espaço social e as diferenças que nele se desenham «espontaneamente» tendem a funcionar simbolicamente como espaços de estilos de vida (BOURDIEU, 2001: 144). Assim, o uso do telemóvel mediante a diferença das opções e a respectiva semelhança no interior da mesma sociedade é que nos leva a considerar o comportamento do usuário do telemóvel na Guiné-Bissau, em especial na cidade de Bissau, como fenómeno social.

Financiamento e mobilização dos recursos para o consumo enquanto conduta activa e colectiva

Ao longo deste ensaio, afirmamos que as capacidades económicas do cidadão comum guineense em financiar o uso e consumo das telecomunicações, muita das vezes, está acima das suas capacidades e possibilidades. Mas o papel jogado pela diáspora guineense, particularmente residente em Portugal, foi decisiva na injecção dos aparelhos de telemóvel, seguindo um circuito informal e funcional (envio de encomendas por portadores ocasionais) de abastecimento às famílias residentes nas diferentes cidades do país, podendo ser encontrados tanto nas principais avenidas como nos bairros periféricos, telemóveis de terceira geração21

Assim como o «livre mercado» desapareceu virtualmente em proveito do controlo monopolista, estatal e burocrático, o facto de possuir um telemóvel, funcionou (e funciona) na representação social dos seus utilitários como uma base de integração social.

A função da comunicação de massas, que só teve efeitos na aquisição dos cartões SIM através da publicidade, não advém dos conteúdos mas dos modos de difusão, privilegiando a rádio (na sua generalidade) e dos objectos manifestos (económicos e psicológicos). Para autores como Baudrillard, este processo não deriva nem do seu volume e do seu público real (embora isto tudo tenha importância e sirva de suporte), mas decorre da própria lógica do meio automatizado, ou seja, não orienta para projectos reais, mas de signo para signo, de objecto para objecto, de consumidor para consumidor. O consumo surge como conduta activa e colectiva, como coacção moral, como instituição. Compõe todo o sistema de valores enquanto função de integração do grupo e de controlo social (BAUDRILLARD, 2005: 81).

Contudo, temos consciência de que, há que distinguir os universos simbólicos que os indivíduos utilizam para desenvolverem as suas acções (contextos dos indivíduos) dos referentes simbólicos que a sociologia capta como instrumentos interpretativos ou explicativos (contextos analíticos). Os primeiros podem ser definidos como princípio cognitivos, tácitos ou explícitos, que os indivíduos utilizam no seu dia-a-dia e que dão sentido à sua vida quotidiana; os segundos são também princípios cognitivos – mas de um nível diferente – que as ciências sociais utilizam e que dão também sentido às interpretações que a propósito da realidade produzem (PAIS, 2002: 127).

Banca de recarga de bateria de telemóvelBanca de recarga de bateria de telemóvel

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A liberalização do sector de telecomunicações dinamizou o mercado, criando oportunidades e ameaças. Com o aparecimento das novas empresas no mercado, oferecendo produtos e serviços mais acessíveis (preço) contribuiu para maior aderência do público no acesso ao serviço de rede móvel. Consequentemente, tornou o uso do serviço móvel uma necessidade (quebrou barreiras do espaço e do tempo) e o aparelho de telemóvel um bem essencial, embora, isso não quer dizer que exista democratização no acesso ao serviço móvel, pois, apenas 17,5% da população tem acesso ao serviço.

Não obstante a isso, criou oportunidades de negócio para as empresas e emprego, sobretudo para os jovens (vendedores ambulantes), através das vendas de cartão de recarga como também a retalho. Um outro negócio inovador, surgiu da necessidade de recarregar as baterias, a maior parte da população não tem acesso a energia, foram criadas como negócios complementares, sistemas de carregamento de baterias pagos. Estes serviços podem ser encontrados especialmente nas feiras populares e zonas de maior fluxo de pessoas (bairros periféricos).

Ainda, a falta de infra-estruturas logísticas (serviços multibanco só funcionam nas agências bancárias e hoteleiras e sem opção de serviços de compra de crédito) leva a uma positiva abordagem do mercado por parte das três empresas, criando dinâmicas que possibilitaram a exploração de novas cadeias de mercado formal - quiosques, mercearias, balcões e informal - vendedores ambulantes para venda dos produtos (sobretudo os créditos), aproveitando a força de venda, sem vínculos contratuais com a empresa. Deste modo, a crença de que o êxito a longo prazo decorre da estabilidade, da harmonia, da regularidade, da disciplina e do consenso não é uma visão partilhada nos países do Sul, protagonistas de dinâmicas de informalidades no mercado, particularmente em contextos de contingência, pois luta-se quotidianamente para a sobrevivência. Aqui a lógica do êxito passa pela emancipação criativa em driblar as regras.

O mundo que hoje vivemos caracteriza-se por um novo papel da imaginação social. A imaginação tornou-se um campo organizado de práticas sociais, uma maneira de trabalhar tanto de labor como no de prática culturalmente organizada, e uma forma de negociação entre sedes de acção (APPADURAI, 1996: 48-49).

O funcionamento do mercado, que suscita paixões tanto a favor como contra, é um dispositivo básico através do qual as pessoas e instituições podem interagir umas com as outras e assumir actividades mutuamente vantajosas (SEN, 2003: 155).

Numa outra perspectiva, apesar de existirem leis que regulam o sector, como também uma Instituição encarregada de fiscalizar as empresas que operam no sector, ainda existem grandes debilidades nas questões como implementação e fiscalização das leis, transparência e prestação de contas, disponibilização de informação e estatística, defesa do consumidor, como também na aplicação das normas existentes por parte da ICGB.

No que concerne às actividades das operadoras, que exploram serviços públicos de telecomunicação móveis na Guiné-Bissau, deparam com grandes dificuldades impostas pelo mercado, sobretudo nas áreas culturais, politicas, económicas, demográficas e infra-estruturais. Para superar esses desafios e conquistar clientes, as empresas do sector recorrem a investimentos pesados nas infra-estruturas e nas revolucionárias técnicas de marketing.

Quanto à falta de infra-estruturas (energia, vias de comunicação), as empresas tiveram a obrigação e a necessidade de realizar investimentos pesados na aquisição de equipamentos e construção de infra-estruturas (compra e manutenção de geradores, aquisição de viaturas, recrutamento e formação do pessoal, construção de torres e montagem das antenas). Estes investimentos foram cruciais para determinar a liderança (no caso do MTN). Os altos investimentos e a dimensão da cobertura (instalação e manutenção dos equipamentos e pessoal) ocasionam elevadas despesas operacionais, condicionando estratégias de preços praticados, ou seja, as despesas operacionais determinam o patamar dos preços praticados.

A estratégia encontrada em relação aos preços passa primeiro pela captação de um número elevado de usuários, quanto mais usuários, menos custo unitário por cliente – produção em escala. Assim, a empresa pode praticar tarifas baixas, mas, deparará com factor crítico ligado as limitações técnicas, que serão causados pelo congestionamento da rede. A estratégia de desconto por zona (MTN Zone) foi uma medida proactiva encontrada para resolver o problema e conservar a maior parte dos seus clientes.

Em contra ponto a GTM, deparando com situações de baixo tráfego de utilização da rede, optou por desactivar as antenas localizadas nas zonas ociosas, concentrando-se nas zonas com maior tráfego de uso das antenas. Esta atitude somada com o cancelamento das vendas a retalho, levaram a empresa a perder drasticamente a sua posição no mercado para as outras empresas22.

É interessante enfatizar, que a GTM teve grande queda de receita quando suspendeu a venda a retalho, o que os obrigou a solicitarem novamente a sua emissão, apesar de constituírem grande custo da sua produção.

As novas formas de comportamento na sociedade guineense a partir do momento que os telemóveis foram introduzidos no mercado, não foram determinadas por estes (telemóvel). A análise do (des)envolvimento, em contexto de pobreza estudado por nós, requer uma compreensão integrada dos papéis das diferentes instituições (formais e sobretudo não formais) e as suas interacções com os indivíduos.

É claro que a tecnologia não determina a sociedade. Nem a sociedade escreve o curso da transformação tecnológica, uma vez que muitos factores, inclusive a criativa e a iniciativa, intervêm no processo de descoberta científica, inovação tecnológica e nas práticas sociais, de forma que o resultado final depende de um complexo padrão interactivo CASTELLS (2007: 5-4). Todavia o comportamento é influenciado pelo marketing.

O marketing é um instrumento relevante para as organizações, sobretudo no que diz respeito a conquista e manutenção dos clientes, e não só, diante das pressões de um mercado cada vez mais dinâmico e competitivo, surge como factor chave para o sucesso organizacional, especialmente no que diz respeito a influência no comportamento da compra dos consumidores.

Se por um lado, o triplo condicionamento sustentado pelos altos preços das chamadas telefónicos, a fraca capacidade de compra e o escassez de energia eléctrica limita o usufruto das oportunidades oferecidas aos jovens, em especial no aproveitamento dos serviços da internet e lazer, por outro lado, o contexto e a conjuntura socio-económica favoreceu ao apelou à criatividade e inovação nas estratégias de empregabilidade da mão-de-obra juvenil, através da venda de cartões de recarga e de carregamentos da bateria dos telemóveis.

Os condicionalismos e as representações sociais dos guineenses sobre o aparelho de telemóvel, o certo é que as comunicações via rede móvel conseguiu penetrar na cabaça das necessidades dos guineenses, mesmo sendo (mais) um peso, dinamiza as transacções nos mercados e está a contribuir para o re-equacionamento do tempo, espaços e recursos.

Análise estratégica da acção social – aumento pela consciencialização da capacidade negocial dos sujeitos, cujos compromissos interactivos gerariam uma sociedade mais adequada aos interesses colectivos, em paralelo à educação (formal) deverá passar pelo empoderamento em termos de conteúdo comunicativo dos Media de forma a influenciar os seus conteúdos e simultaneamente orientar as populações, em especial através das rádios, pois, a publicidade, promoções e outro estímulos de marketing não determina o comportamento do consumidor, mas sim a sua escolha, que podem ser influenciados através de factores culturais, económicos, sociais e políticas.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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  • 1. Situada na Costa Ocidental de África, a Guiné-Bissau é um pequeno país de língua oficial portuguesa com 36.125 km2. Com uma população de 1.6 milhões de habitantes, sendo que mais de um quarto reside na capital Bissau, a maioria da população é jovem e do sexo feminino (51%), a população com menos de 15 anos são cerca de 52%. A esperança média de vida é de 45,8 anos e o índice da mortalidade infantil está estimada em 1.100/100, com uma taxa de analfabetismo situada na ordem de 64%. Sendo um dos países mais endividados do mundo (922.2782 milhões de dólares) e quase que completamente dependente da ajuda externa e nos últimos dez anos viu aumentar os níveis da pobreza absoluta, com maior parte da sua população a viver com um dólar por dia. Na actualidade, a Guiné-Bissau ocupa o lugar 171 dos 179 países do mundo (PNUD, 2008; OMS, 2007).
  • 2. Fonte: Boletim Oficial nº 24 de 13/06/2005, Decreto nº 03/2004.
  • 3. Segundo Engº Isidoro Rodrigues, Administrador da empresa Guiné-Telecom, embora o contrato de concessão estabelecia um período de monopólio de durante 20 anos (1989-2009), já em 1998 havia um fornecedor de serviços de Internet - a SITEC ou EGUITEL, e em 2004, entrou em serviço a SPACETEL. Entrevista realizada em Bissau, Abril de 2009.
  • 4. As Bases de Concessão do Serviço Público de Telecomunicações, aprovadas por estes diplomas, consubstanciam os princípios de liberalização preconizados no novo enquadramento jurídico, bem como os termos de concessão do serviço público de telecomunicações.
  • 5. Para maior familiarização ver em: www.gtelecom.gw.
  • 6. Ver Suplemento ao BO n.º 7/2005.
  • 7. Para maior aprofundamento ver em: www.mtn-bissau.com.
  • 8. Dados recolhidos em: http://consuladogeralguine-bissau.org/cpnot.php?id=21, acedido em 18/04/2009.
  • 9. Para mais informações ver: Telecommunication Development Bureau (ITU-D), MEASURING THE INFORMATION SOCIETY – THE ICT DEVELOPMENT INDEX, Geneva, 2009.
  • 10. MTN lidera mercado com novos produtos e novas tecnologias. In Semanário ” Nô Pintcha”, XXXII, n.º 2026, p. 12-13.
  • 11. Com base nos contactos efectuados pela equipa de investigação junto as operadoras, afirmaram que detinham os seguintes números dos clientes, com base na compra do cartão SIM: - GTM 76.500 mil; - MTN (364 mil); - Orange (157 mil). Salienta-se que esses dados requerem a validação, pois foram fornecidos informalmente.
  • 12. Quer dizer vendas por fracção. O cartão mais baixo no mercado custa 1 dólar, mas pode-se adquirir créditos através deste sistema no valor mínimo de vinte cêntimos de dólar.
  • 13. Designa vendedores ambulantes
  • 14. Em 2004, segundo o BO. Nº 23/2004, o salário de base para função pública foi afixado em 32 dólares mais 6 dólares somando um global de 38 dólares, equivalente a um saco de 50 kg de arroz de qualidade média no mercado nacional.
  • 15. Mulheres com actividade económica autónoma – “bida” – vida (in crioulo da Guiné-Bissau).
  • 16. A Guiné-Bissau não tem conseguido criar condições para o abastecimento do país em termos da energia eléctrica. Só 5,7 % da população tem acesso e ainda de forma irregular. Esta proporção é de 12 % na capital, Bissau (DENARP, 2005).
  • 17. Em matéria de Marketing, esta estratégia designa-se por Marketing Multi-Nível.
  • 18. Lingua nacional da Guiné-Bissau e principal base de comunicação e não pertence a nenhum dos grupos étnicos.
  • 19. “Sou guineense e acredito no que é da terra”
  • 20. Orange é saboroso!
  • 21. As empresas de telecomunicações, ao perderem esse fragmento de mercado se que haja uma “visível”concorrente ao seu alcance, viram-se obrigadas instintivamente em investir nos aparelhos de “ funcionalidade prática” - tipo telemóvel de padida - que fornece iluminação como uma lanterna e de grande uso pelas mães, atendendo a permanente falta da energia eléctrica, a um preço considerado ao alcance do cidadão comum.
  • 22. Salienta-se que a empresa GTM poderá vir a melhorar a prestação do seu serviço e eventualmente a sua posição no mercado, atendendo o facto de estarem previstos grandes investimentos do governo chinês na empresa.

por Alexandre Na Lamba, Lucy Monteiro e Miguel de Barros
Vou lá visitar | 12 Outubro 2011 | comércio, criatividade, estratégia, Guiné-Bissau, investimento, marketing, mercado, oportunidade, pobreza, telecomunicações