‘BANZO’, DE MARGARIDA CARDOSO

O filme BANZO, de Margarida Cardoso, fará a sua estreia nacional dia 30 no Indie e a estreia internacional na 58ª edição do Festival Internacional de Cinema de Karlov Vary, na Chéquia, que decorre entre 28 de Junho e 6 de Julho. O filme integra a secção competitiva Crystal Globe, ao lado de outras 11 longas-metragens. 

“A selecção oficial do 58º KVIFF, o núcleo do programa anual do festival, que inclui as competições Crystal Globe e Proxima, bem como o programa de Projecções Especiais, oferece um epicentro único de géneros e temas que vibram no cinema contemporâneo. Um novo olhar revisionista sobre os cânones estéticos de um filme de época. Um olhar equilibrado, cuidadoso, mas também provocador, sobre o destino de uma mulher na sociedade contemporânea em qualquer momento da sua vida. A influência imediata dos acontecimentos políticos na vida de um ser humano individual em qualquer parte do mundo. Os meus colegas e eu descobrimos que estes temas atravessavam a nossa selecção de filmes. Quinze dos 32 filmes apresentados na selecção oficial são estreias e não podíamos estar mais entusiasmados”, refere o director artístico do festival, Karel Och, em comunicado.

A acção de BANZO, rodado entre São Tomé e Príncipe e Portugal, situa-se no começo do século XX. Acompanhamos Afonso, que recomeça a vida numa ilha tropical na costa africana como médico de uma plantação de cacau, onde terá de curar um grupo de serviçais “infectados” pelo Banzo, a nostalgia dos escravizados. Morrem às dezenas, de inanição ou suicidando-se. Por receio que a nostalgia profunda se espalhe, o grupo é enviado para um morro isolado, chuvoso, cercado pela floresta. Ali, Afonso tenta curar os serviçais mas a incapacidade de entender o que lhes vai na alma revela-se mais forte que todas soluções.

Os elementos para a narrativa de BANZO começaram a aparecer durante a pesquisa e as filmagens de Understory (2019), ensaio pessoal de Margarida Cardoso sobre o cacau e todas as suas ramificações culturais e económicas, também apresentado no IndieLisboa. “Tive oportunidade de passar alguns meses na ilha do Príncipe, vivendo em contacto com muitas pessoas diferentes e conhecendo bem a geografia através das viagens e caminhadas que tinha de fazer durante o trabalho. As extravagantes ruínas das roças são uma constante na paisagem da ilha. Há algo de estranhamente fantasmagórico naquelas estruturas, não só pelo lado mais evidente da decadência, mas porque tudo parece estar paralisado no tempo, como se as pessoas que hoje habitam essas ruínas estivessem ali há quase tanto tempo quanto os decrépitos edifícios. Parecem presas num limbo histórico à espera que o violento e absurdo passado se funda lentamente com a natureza até se dissipar”, diz a realizadora. 

Regressada a Lisboa, a cineasta decidiu mergulhar nos arquivos das roças. “Li todo o tipo de documentos: correspondências internas e externas, pessoais e comerciais, gráficos, relatórios dos Curadores dos Serviçais, boletins oficiais da colónia, vi filmes de arquivo e centenas de fotografias (…). Quanto mais me embrenhava na revisitação do passado, mais se tornava evidente que o que ali se passou, num tempo que nos parece tão distante é, no fundo, uma ‘história contemporânea’.”

Assim começou a desenhar-se BANZO, terceira longa-metragem de ficção de Margarida Cardoso. O filme conta no elenco com Carloto Cotta, Hoji Fortuna, Rúben Simões, Gonçalo Waddington, Sara Carinhas, João Pedro Bénard, Maria do Céu Ribeiro, Matamba Joaquim, Romeu Runa e Cirila Bossuet. Tem a participação especial de Beatriz Batarda e Albano Jerónimo.


MARGARIDA CARDOSO
Margarida Cardoso começou o seu trabalho como realizadora em 1995, explorando temas que cruzam as suas experiências históricas pessoais com questões pós-coloniais proeminentes na história recente de Portugal, como a revolução portuguesa e a guerra colonial em África. O seu trabalho prévio inclui Sita: A Vida e o Tempo de Sita Valles (IndieLisboa, 2022) Understory (IndieLisboa 2019 ) Yvone Kane (Tallinn Black Nights, 2015), A Costa dos Murmúrios (Veneza, 2004, IFFR, 2005), Kuxa Kanema - The Birth of Cinema (FIDMarseille, Cinéma du Réel, Visions du Réel, 2003) e a curta-metragem Entre Nós  (Locarno, 1999).

UMA PEDRA NO SAPATO
Produtora independente sediada em Lisboa, fundada em 2008 pela realizadora Filipa Reis. As mais recentes produções incluem GRAND TOUR de Miguel Gomes (Cannes Competição 2024), BAAN de Leonor Teles (Locarno Competição 2023), LÉGUA de Filipa Reis e João Miller Guerra (Quinzena dos Cineastas Cannes 2023), GREAT YARMOUTH de Marco Martins (San Sebastián Competição 2022) e DIÁRIOS DE OTSOGA de Miguel Gomes e Maureeen Fazendeiro (Quinzena dos Realizadores Cannes 2021), com destaque para o prémio Urso de Ouro na Berlinale Shorts 2016 por BALADA DE UM BATRÁQUIO de Leonor Teles.

29.05.2024 | par martalanca | BANZO, Margarida Cardoso