18 e 19 de julho de 2024, Departamento de Línguas e Culturas, Universidade de
Aveiro Site
Sobre o congresso:
“O hábito não faz o monge”. A antiga expressão popular dizia que as pessoas não deviam ser julgadas somente pela sua aparência, mas também pelos seus atos e condutas. Tempos depois adquiriu uma conotação contrária. Hoje, afinal, também se pode dizer: “o hábito faz o monge”. Como escreveu José de Alencar, em 1854, no folhetim Ao correr da pena: “Hoje, apesar do rifão antigo, todo o mundo entende que o hábito faz o monge. Vista alguém uma calça velha e uma casaca de cotovelos roídos. Embora seja o homem mais relacionado do Rio, passará incógnito e invisível”. Isto é, mais do que uma veste medieval ou terno puído, ontem como hoje, o hábito diz respeito a uma série de costumes, regras, modos e dogmas frequentes e – muitas vezes – permanentes, que induzem maneiras usuais de agir, fazer, sentir e até mesmo de ser. Como postulou Pierre Bordieu, o habitus constitui-se como duro capital simbólico incorporado no modo de agir das pessoas através dos rituais de socialização institucional. Não há, pois, colonialismo nem pós colonialismo fora deste contexto. Escola, estado, trabalho, espaço público têm, assim, a “função de produzir indivíduos dotados de um sistema de esquemas inconscientes, o qual constitui a sua cultura”, as suas crenças arreigadas (Bourdieu, 1974, p. 346). Nesse sentido, o hábito faz o monge. Portanto, o hábito molda o colonizador e enforma também o preconceito.
Neste âmbito, tomamos emprestado esse significativo ditado para pensar criticamente e debater as Narrativas (literárias, performativas e outras) e Arte Ativistas, nos seus múltiplos formatos e suportes – plástico, visual, musical, escrito, videográfico, digital, podcasts e soundscapes diversos (Blaagard et al., 2023), mas incluindo também o próprio corpo, considerado como tela e espaço de criação (Martins & Campos, 2023) – articuladas em torno de conceitos como o Pós-Colonial (Castellano, 2021, pp. 262-264), o Anti-Colonialismo, a Colonialidade do poder (Grosfoguel, 2008), do saber (Lander et al., 2005) e do ser (Maldonado-Torres, 2007), o Contra-Discurso, a Descolonização, a Decolonialidade (Ashcroft et al., 2000), as Transperiferias Colaborativas (Windle et al, 2020); e linhas de pensamento como a Filosofia da Libertação de Dussel (2016), a Teoria da Dependência de Quijano (2005) e a Categoria Político-Cultural de Amefricanidade de Gonzalez (1988), etc.
Para tal, o evento, propositadamente de banda larga, destina-se a expressões académicas e filosóficas que se alimentem da postura crítica discutida pelas teorias e práticas pós-coloniais organizadas nos temas listados abaixo e outros que se enquadrem nesse âmbito:
– Artivismo pós-colonial transdisciplinar, inter e multiartes;
– Planeamento do território e práticas de resistência à segregação étnica, religiosa, cultura;
– Discursos e intervenções no tema reparações históricas;
– Narrativas nos media e confrontação política;
– A abordagem histórica no aparelho educativo da antiga metrópole e ex-colónias;
– A velha máxima do Luso-tropicalismo e suas ramificações;
– Artistas no exílio e perspectivas (anti-)coloniais, pós ou decoloniais;
– Habitus colonial e discursos ideológicos;
– O papel da ficção especulativa em narrativas pós-coloniais;
– Colonialidade do saber, epistemologias subalternas e a legitimidade do conhecimento;
– Colonialidade do poder contra as lutas identitárias de género, raça e classe;
– Colonialidade do ser e a influência das Narrativas em processos de subjetivação.
– Associações artivistas, comunas de artistas, cooperativas e movimentos artísticos unidos em torno de objetivos sociopolíticos;
– O corpo enquanto problemática e ferramenta artivista nos seus diversos usos;
– Estética artística e campo político: intersecções, porosidades, oposições;
– Artivismo vitalista: o corpo e a vida de ativistas enquanto obra de arte, narrativa e ficção vital;
Chamada de trabalhos:
O congresso irá recorrer ao uso da língua portuguesa como meio de comunicação entre todos os participantes. Ademais se alerta que não serão consideradas comunicações via zoom e também se encontram fora dos parâmetros seletivos o envio de gravações. Em linha com os objetivos deste congresso, pretende-se dar primazia às interações pessoais e, em conformidade, todas as comunicações serão presenciais.
As propostas devem ter entre 200 e 300 palavras, incluindo palavras-chave. Devem ser enviadas até ao dia 31 de janeiro de 2024, acompanhadas de uma breve nota biográfica (máximo de 100 palavras). O título do ficheiro com o resumo deve obedecer ao seguinte formato: “nomeResumo”. Exemplo: “AndréMirandaSantosResumo”
As comunicações ao congresso terão entre 15 a 20 minutos. Todas as propostas serão analisadas atempadamente e os autores notificados em tempo útil, tão breve quanto possível. As mesmas deverão ser enviadas para o seguinte endereço eletrónico: habitocolonizador@gmail.com
Todas as informações disponíveis em:
https://ohabitofazocolonizador.wordpress.com/
Referências
Ashcroft, B., Griffiths, G., & Tiffin, H. (2000). Post-Colonial Studies: The Key Concepts (2a). London: Routledge.
Blaagaard, B., Marchetti, S., Ponzanesi, S., & Bassi, S. (Eds.) (2023). Postcolonial Publics: Art and Citizen Media in Europe. (1 ed.) Edizioni Ca’Foscari, Venice University Press. Studi e ricerche Vol. 30 https://doi.org/10.30687/978-88-6969-677-0
Bordieu, P. (1974). A Economia das Trocas Simbólicas (Introdução, organização e seleção de
Sérgio Miceli). São Paulo: Perspectiva. Miceli, S., Barros, M., Catani, A., Catani, D., Montero, P., Durand, J. (trads.)
Castellano, C. (2021). Art activism for an Anticolonial Future. Albany: SUNY Press
Dussel, E. (2016). Transmodernidade e interculturalidade: Interpretação a partir da filosofia da libertação. Sociedade e Estado, 31(1), 51–73. https://doi.org/10.1590/S0102-69922016000100004
Gonzalez, L. (1988). A categoria político-cultural de amefricanidade. Tempo Brasileiro, 92, 69–82.
Grosfoguel, R. (2008). Para descolonizar os estudos de economia política e os estudos pós-coloniais: Transmodernidade, pensamento de fronteira e colonialidade global. Revista Crítica de Ciências Sociais, 80, 115–147. https://doi.org/10.4000/rccs.697
Lander, E., Dussel, E., Mignolo, W. D., Coronil, F., Escobar, A., Castro-Gómez, S., Moreno, A., Segrega, F. L., & Quijano, A. (2005). A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino- americanas (E. Lander (ed.); J. C. C. B. Silva (trad.)). CLACSO, Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales. http://bibliotecavirtual.clacso.org.ar/ www.clacso.org
Maldonado-Torres, N. (2007). Sobre la colonialidad del ser: contribuciones al desarrollo de un concepto. Em S. Castro-Gómez & R. Grosfoguel (Eds.), El giro decolonial: reflexiones para una diversidad epistémica más allá del capitalismo global (pp. 127–167). Siglo del Hombre Editores.
Martins, J. C. F., & Campos, R. M. de O. (2023). The body as theme and tool of artivism in young people. European Journal of Cultural Studies, 0(0). https://doi.org/10.1177/13675494231163647
Quijano, A. (2005). Colonialidade do Poder, Eurocentrismo e América Latina. Em E. Lander (Ed.), & J. C. C. B. Silva (Trad.), A colonialidade do saber. Eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino-americanas (pp. 227–278). CLACSO, Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales. http://bibliotecavirtual.clacso.org.ar/clacso/sur-sur/20100624103322/12_...
Windle, J., Souza, A. L. S., Silva, D. N., Zaidan, J. M., Maia, J. O., Muniz, K., Lorenso, S. (2020). Por um paradigma transperiférico: uma agenda para pesquisas socialmente engajadas. Debate: Trabalhos em Linguística Aplicada, 59 (2). https://doi.org/10.1590/01031813749651220200706