José Luiz Tavares
Tarrafal, Cabo Verde (1967). Nasceu no dia de Camões, 10 de junho, em Txonbon (cercanias do antigo Campo de Concentração), concelho do Tarrafal, ilha de Santiago, Cabo Verde. Estudou literatura e filosofia em Portugal, onde vive em exílio voluntário, dedicado à sua obra. Publicou vinte e dois livros desde a sua estreia em 2003, com Paraíso Apagado por um Trovão, que vêm pondo a nu a mediocridade do panorama poético cabo-verdiano, apesar dos seus inchados pergaminhos, via certo Caliban e outras mirabílicas misérias.
Em 2023 reuniu a sua poesia inacabada no volume Como um Segredo na Boca do Universo – Obra completa – Mente Inacabada, um tijolo de mil e quinhentas páginas, apropriado para entupir a boca dos seus inumeráveis, ainda que ocultos e merdosos, inimigos.
O seu último livro publicado (escrito em três dias) Um Preto de Maus Bofes, é um acerbo ajuste de contas consigo próprio, com o mundo, a literatura, a morte, a glória e a posteridade.
É o escritor mais premiado de sempre de Cabo Verde.
Recebeu, no seu país e no estrangeiro, entre outros, os seguintes prémios:
Prémio Cesário Verde/CMO;
Prémio Mário António de Poesia/Fundação Calouste Gulbenkian;
Prémio Jorge Barbosa/Associação de Escritores Cabo-verdianos;
Prémio Pedro Cardoso/Ministério da Cultura de Cabo Verde;
Prémio de Poesia Cidade de Ourense;
Prémio BCA/Academia Cabo-verdiana de Letras;
Prémio Vasco Graça Moura/INCM;
Por três vezes consecutivas recebeu o Prémio Literatura para Todos, do Ministério da Educação do Brasil;
Prémio Ulysses/ The Poets and Dragons Society
e Bolsa Fundação Eça de Queirós.
Foi, por duas vezes, finalista do prémio Correntes d’escritas;
Finalista do Pen Club Português;
Três vezes semifinalista: do Prémio Portugal Telecom de literatura e Oceanos de Língua Portuguesa.
Os seus livros integram o Plano Nacional de Leitura de Cabo Verde e de Portugal.
Está traduzido para inglês, francês, espanhol, italiano, alemão, mandarim, neerlandês, russo, finlandês, catalão, galês e letão. Traduziu Camões e Pessoa para a língua cabo-verdiana.
Não aceitou, até agora, nenhuma comenda ou medalha.
Possui meia-dúzia de fervorosos amigos.
Dá coices e espera receber. Será um dia de alegria.
A ferros, fez uma filha que por si própria se fez gente.
É consumidor de cerveja, de preferência stout, em doses homéricas.
A chimay blue, feita pelos padres trapistas, com água proveniente dos dois poços da Abadia de Scourmont, é, para ele, o céu das cervejas.
[Kume agu não foi inventado pelos cabo-verdianos, mas pelos antigos monges, que chamaram à cerveja pão líquido].
Entrevê o seu lustroso futuro exatamente nesse ramo, com previsão de risonha prosperidade.
Não é elo de nenhuma rede, social ou outra. Por isso vive clandestino na ditadura do mundo.
Quezilento ontológico (os pobres de espírito e curtos de verbo chamam-lhe arrogante, apodo esse que adotou como glamoroso e desafiante apelido), tem-se dedicado, no seu país, ao assalto e derrube de fortalezas, mistificações e subjugações culturais.
O neocolonialismo & o supremacismo linguísticos, padrastos do negacionismo glotofágico, são um dos seus alvos. As ratazanas literárias, outro. As flatulências políticas, outro mais.
Para a consecução desses fins, inventou um novo subgénero, o kotxipó literário, que não terá continuadores numa terra de falhos de colhões intelectuais.
Embora se sinta vulnerável na tarefa de elaborar uma poesia autêntica e nos embates com a doxa, não pode recusar a nietzschiana tarefa de demolição e, consequentemente, de fazer inimigos. Por isso não se esforça por encontrar uma audiência. Dá com os da sua estirpe livre sobre os penhascos.
É o único descendente intelectual do grande Eugénio Tavares.
É negro, mestiço arraçado de anjo, dizem uns. É o próprio diabo, asseveram outros.
Gostaria de ter asas, mas bastam-lhe as duas mãos, a boca e o cérebro.
Guardador de corvos nas lavras da vida, a sua arma preferida é a funda, embora não se ache um David, nem conheça qualquer Golias.
Anda o mundo inteiro a chateá-lo com o Prémio Camões, que não é glória, mas só pecúnia — que vão chatear o dito e o deixem produzir a obra que há de ficar (ou não).
Com isso não ambiciona nenhuma gaveta no frigorífico da glória literária, mas apenas manter-se vivo entre os homens insubmissos.
O seu último fôlego não há de ser um verso, mas uma libertadora imprecação mandando tudo àquela parte.
Que conste que quis por epitáfio: “voltarei para vos foder a todos, cabrões».
Artigos do autor
- A liberdade como exclusão (ou o nojo a tudo isto)*
- O estranho caso do escritor Germano Almeida [ou contra a pregação supremacista e o negacionismo glotocida]
- O patusco (Daniel) Medina, seus fajutos asseclas & os descaminhos da Academia Cabo-verdiana de Letras
- Uma selvajaria civilizacional [o caso da Escola Portuguesa da Praia]