Centro Histórico de Luanda
Falar de centro histórico em Angola implica fazer metodologicamente um caminho sobre o seu conteúdo em duas escalas diferentes: a macro, que aborda a parte conceptual da cidade visando os aspectos teóricos que sustentaram a sua génese e evolução, e a micro, que interpreta estilisticamente o seu edificado, caracterizando a arquitectura tanto civil como religiosa e militar.
Através desta caracterização, poder-se-á compreender melhor a estrutura complexa do espaço que é o Centro Histórico de Luanda e encontrar a melhor forma de propor soluções que permitam a integração desta entidade na modernidade, no crescimento da cidade no nosso século, respeitando a sua condição de património à luz do estabelecido pela lei. Esta intenção, baseada no conceito de património estabelecido na Carta de Veneza1, visa, em primeira instância, a alteração da sua categorização urbana e, com isso, a melhoria da qualidade de vida do cidadão no perímetro municipal. Este processo passa por diversas etapas como a identificação e registo patrimonial (classificado ou não), definição dos elementos ordenadores da salvaguarda e consequente processo de revitalização local.
A génese pluriétnica da cidade de Luanda exige uma visão estratégica que promova a multiculturalidade que, no caso específico, tem sido alvo de polémica em múltiplos sectores da sociedade civil.
Em termos humanos, sociais e culturais, o centro histórico da cidade de Luanda significa a origem da forma urbana no país e, como tal, conhecê-lo terá sempre como objectivo a preservação patrimonial, a valorização económica do local através da dinamização do comércio e serviços, gerando emprego e riqueza, a requalificação e novos usos a edifícios do passado à interacção cultural criando produtos turísticos de qualidade com suporte na informação científica. Tudo isso proporcionará a criação de respeito e orgulho pelo património por parte dos seus cidadãos já que estará afecto a esse bem material o testemunho imaterial e, assim, a forte representatividade da sua identidade cultural.
O estudo sobre a cidade de Luanda constituirá sempre um subsídio válido para a constituição de um Plano Territorial Especial de Criação, Recuperação Salvaguarda e Requalificação do Centro Histórico de Luanda e Envolvente Protegida conforme define a Lei de Ordenamento do Território e Urbanismo2 e considerando acima de tudo o momento que o país está a ultrapassar, onde a mudança, como em qualquer parte do mundo, implica sempre a alienação de elementos que por razões diversas nunca são considerados necessários no processo histórico a não ser a posteriori.
Este estudo de caracterização do seu território, tem vinndo a ser feito como resultante de uma metodologia definida pelo Conselho Escolar do Departamento de Arquitectura da Universidade Lusíada de Angola que através das suas acções públicas nos Fora de 2006, 2007 e 2008 conseguiu reunir um conjunto de reflexões à volta do tema e que se podem tornar em propostas válidas, sustentadas cientificamente e que poderão estrategicamente afirmar Luanda como elemento matricial do urbanismo angolano e o seu centro histórico como o local mais importante para dinamizar culturalmente a cidade.
Esta ideia de defesa de uma expressão culturalmente híbrida como a cidade de Luanda foi defendida pelo nosso Presidente, Eng. José Eduardo dos Santos, no 3º Simpósio de Cultura Nacional3 subordinado ao tema “na forja da Angolanidade”, no seu discurso de abertura:
“(…) Já há muito foi reconhecido e aceite que é na diversidade e no cruzamento das formas próprias de expressão de agrupamentos humanos de diversas origens e características que se geram as formas mais complexas de riqueza espiritual e mesmo de realização socio-económica. Assim sendo, temos de assumir e entender que Angola absorveu ao longo de séculos elementos culturais de povos oriundos do interior e do exterior do Continente, que configuram o seu perfil actual como Nação soberana e independente.
Negar ou escamotear essa realidade, que nos coloca numa posição singular no contexto de África, seria negar-nos a nós próprios ou amputar-nos de elementos essenciais para a definição da nossa identidade
É tendo em linha de conta todos estes aspectos que consideramos a questão da Cultura como uma variável estratégica de grande importância, com efeitos imediatos na coesão interna da nossa sociedade, bem como na nossa marcha em direcção aos objectivos globais que nos propomos atingir, tais como construir uma nação unida, desenvolvida e próspera com uma cultura fluorescente e um Estado de Direito, Democrático e Social. (…)”.
Estas palavras abrem hoje espaço para abordagens a temáticas como esta de propor a revitalização do Centro Histórico para a Cidade de Luanda como referencial cultural angolana.
Texto publicado em “Centro Histórico da Cidade de Luanda”. (Dissertação de Mestrado), Ângela Mingas.
- 1. A noção de monumento histórico compreende a criação arquitectónica isolada, bem como o sítio urbano ou rural que dá testemunho de uma civilização particular, de uma evolução significativa ou de um acontecimento histórico. Estende-se não só às grandes criações mas também às obras modestas, que tenham adquirido, com o tempo, uma significação cultural. in Artigo 1o, Definições, Carta de Veneza. Maio de 1964.
- 2. Capítulo II – Instrumentos do Ordenamento do Território, Secção II – Planos Territoriais, Artigo 28o, ponto 3o, alínea a; Planos Especiais: os que abrangem áreas determinadas em função de fins específicos de ordenamento do território, designadamente as áreas agrícolas, área de turismo, áreas de indústria, áreas ecológicas de reserva natural, de repovoamento, de defesa e segurança, recuperação, reconversão, requalificação, revitalização, reabilitação de centros históricos, remodelação de infra-estruturas especiais como portos e aeroportos.
- 3. O Ministério da Cultura – MINCULT – realizou no dia 11 de Setembro de 2006, no Palácio dos Congressos, em Luanda, o III Simpósio sobre Cultura Nacional focalizando a análise do estado actual do sector, bem como a recolha de contribuições para o aprofundamento da Política Cultural definida pelo Estado angolano. Com a realização do III Simpósio, o Mincult pretendeu criar um fórum de reflexão destinado a aperfeiçoar os programas de acção cultural. Constaram igualmente dos objectivos, promover a reflexão sobre as três décadas do conflito armado, seu impacto e consequências no património cultural material e imaterial, criar bases para a constituição de um banco de dados e contribuir para o fomento e a democratização da cultura. Foi ainda seu propósito, a definição de uma política cultural dinâmica, capaz de criar o paradigma que permita projectar um futuro melhor para o entendimento global das várias dimensões da cultura nacional.