O poeta, cantor, figura icónica da música negra e precursor do rap Gil Scott-Heron morreu ontem à noite em Nova Iorque, aos 62 anos, por causas ainda não divulgadas.
O anúncio foi feito por Jamie Byng, o seu produtor no Reino Unido, através da rede social Twitter, onde escreveu que o seu “amigo e uma das pessoas mais inspiradoras” que alguma vez conheceu morreu na última noite.
Gil Scott-Heron nasceu em Chicago, nos Estados Unidos, em 1949 e lançou o seu primeiro disco em 1970 com o título “Small talk at 125th and Lenox”, onde tecia duras críticas à classe média americana, os activistas negros e o consumismo norte-americano. O trabalho ficou célebre pela sua canção mais icónica: “The revolution will not be televised”. Durante muitos anos foi apresentado como o “Bob Dylan negro”, pela costela política. Mas sempre foi mais directo ao assunto, ou não tivesse escrito uma canção sobre segregação racial na África do Sul chamada “Johannesburg”; ou outra sobre alcoolismo, “The bottle”. No final dos anos 60 e primórdios dos 70, num período de lutas cívicas, convulsões económicas e mudanças sociais aceleradas, poucos conseguiram capturar as contradições de um país como ele.
Apesar de ser muitas vezes apontado como precursor ou padrinho do rap, este era um título que não agradava a Gil Scott-Heron, que preferia descrever o seu trabalho como “bluesology”, isto é, uma espécie de fusão entre poesia, soul, blues e jazz, com uma grande consciência social e fortes mensagens políticas, nomeadamente sobre temas como as armas nucleares ou o apartheid, descreve o jornal inglês Guardian. Dos livros para a música Inicialmente através da escrita publicou o primeiro livro, “The Vulture”, aos 19 anos. Mais tarde, quando ia publicar o terceiro livro, e depois de ter conhecido o músico e produtor Brian Jackson que o viria a acompanhar durante mais duas décadas, entendeu que o método de comunicar teria que mudar e a soul, o funk ou o jazz tornaram-se no veículo de difusão da sua paixão: a poesia. Nesse período debitava acima de tudo para audiências negras, aprendendo com a “spoken-word” do poeta e activista Amiri Baraka ou com o jazz de Coltrane e Miles Davis. Mais tarde, no final dos anos 70 e primórdios dos 80, quando o hip-hop irrompeu, foi considerado um dos pioneiros do género. Grupos como Public Enemy ou Disposable Heroes Of Hiphoprisy citavam-no e novas gerações, de todas as cores, redescobriam-no. Mas Gil Scott-Heron assumia-se sobretudo marcado pela sua avó, que viu morrer no sul dos Estados Unidos quando tinha apenas 15 anos. “Ensinou-me a não esperar que as pessoas descobrissem o meu pensamento, mas a exprimir-me por mim próprio. Quando penso nela, vejo-me a mim”, disse uma vez o cantor, numa entrevista. Depois da morte da avó, mudou-se para o Harlem, Nova Iorque, onde ainda habitava. Foi já em Nova Iorque, na Universidade Lincoln, que conheceu outra personalidade importante na sua vida, o poeta e escritor Langston Hughes. Ao longo de quatro décadas, o cantor lançou mais de 20 discos. “We’re New Here”, lançado já este ano, foi o seu último álbum, tratando-se de uma recriação do álbum “I’m New Here” de 2010, concretizada por Jamie xx (do grupo The xx) e Gil Scott-Heron. O trabalho do ano passado foi lançado 16 anos depois do seu último registo de originais e numa altura em que tinha estado envolvido em algumas polémicas com a polícia por pose drogas e violação da liberdade condicional. Era também portador de VIH.
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O responsável pela ressurreição do veterano foi Richard Russell, produtor inglês também responsável pela XL Recordings. Foi ele que percebeu que não valia a pena regressar no modelo soul-funkjazz do passado. Havia que preservar o essencial, a sua voz, mas fazendo-o com uma arquitectura sonora renovada. Richard Russell apresentou-se a Scott-Heron quando este ainda estava na prisão e disse que quando fosse libertado queria produzir um disco com ele. Em Junho de 2007, quando Scott-Heron saiu da prisão Richard Russell contactou-o em Londres e um acordo foi selado. As gravações iniciaram-se em Janeiro de 2008, depois de uma última passagem por uma casa de correcção em Manhattan.O músico esteve em Lisboa e no Porto no ano passado, em Maio.