"Terra de Ninguém", de Salomé Lamas na Berlinale
Uma sala neutra. Terra de ninguém. Um homem sentado numa cadeira conta-nos a sua vida. Na sua juventude foi soldado de uma tropa de elite na guerra colonial em Angola e em Moçambique. Depois do 25 de abril trabalhou como guarda-costas em Portugal, mais tarde como mercenário da CIA em El Salvador, e finalmente como assassino a mando da organização clandestina basca GAL, onde executava pessoas por encomenda. A monstruosidade da crueldade exibida contrasta com o minimalismo formal do filme e a narrativa do protagonista. Imperturbável, ele descreve detalhes brutais, comenta com grande lucidez o pano de fundo da história política, conta anedotas e piadas. Os seus depoimentos são numerados e servem de base para a pesquisa e reflexões da cineasta. Uma aposta num terreno incerto: factos e ficção, memórias e fantasias, confissão e encenação pessoal andam de mão dada, enquanto a credibilidade e identidade avo sempre sendo questionadas. O denso e inquietante protocolo fílmico de uma existência na sombra trona-se num exame multifacetado das bases e dos limites do trabalho documental.
Portugal 2012, 72 Min. (9, 10, 12, 15.2.2013 no Berlinale Forum)
Produção: Luís Urbano, O Som e a Fúria