«A língua portuguesa usa capulana»: provavelmente a última entrevista de Eduardo White

«A língua portuguesa usa capulana»: provavelmente a última entrevista de Eduardo White «Casámo-nos com a língua portuguesa. A língua portuguesa usa capulana. Como é que se tira a capulana? Roda-se. A língua portuguesa permanecerá indefetivelmente propriedade de quem a fala.(...) A cor da pele identifica o opressor, o colonialista. É um processo que vai demorar o seu tempo, mas que precisa de ser feito. África tem de se encontrar, principalmente Moçambique. A história da Commonwealth é isto. É um processo, as novas gerações ainda vão sentir isto, não vai acabar já. São cinco séculos de colonização, são muitos anos. O algodão, o chá, o chicote ainda aqui estão. É uma forma de dizer “Eu existo”, é uma afirmação.

Cara a cara

27.08.2014 | por Doris Wieser

Conversa com Mia Couto

Conversa com Mia Couto Tal e qual como a escravatura ou a colonização, a corrupção é a continuação de uma relação que tem sempre dois lados. Não há os corruptos de um lado e os honestos do outro. A escravatura foi feita com cumplicidades internas. Havia elites africanas que enriqueceram muito. Esta leitura da história que hoje há é muito simplista. Como há um certo sentimento de culpa dos europeus, ela passa bem. Mas deve ser interrogada, porque criou da parte dos africanos o discurso vitimista, de ser preciso fazer valer na Europa aquilo que perdemos durante séculos. (entrevista de 1998)

Cara a cara

02.09.2013 | por Anabela Mota Ribeiro

O Cão-Tinhoso tinha uns olhos azuis...

O Cão-Tinhoso tinha uns olhos azuis... O Cão-Tinhoso tinha uns olhos azuis que não tinham brilho nenhum, mas eram enormes e estavam sempre cheios de lágrimas, que lhe escorriam pelo focinho. Metiam medo aqueles olhos, assim tão grandes, a olhar como uma pessoa a pedir qualquer coisa sem querer dizer. Eu via todos os dias o Cão-Tinhoso a andar pela sombra do muro em volta do pátio da Escola, a ir para o canto das camas de poeira das galinhas do Senhor Professor. As galinhas nem fugiam, porque ele não se metia com elas, sempre a andar devagar, à procura de uma cama de poeira que não estivesse ocupada. O Cão-Tinhoso passava o tempo todo a dormir, mas às vezes andava, e então eu gostava de o ver, com os ossos todos à mostra no corpo magro. Eu nunca via o Cão-Tinhoso a correr e nem sei mesmo se ele era capaz disso, porque andava todo a tremer, mesmo sem haver frio, fazendo balanço com a cabeça, como os bois e dando uns passos tão malucos que parecia uma carroça velha.

Mukanda

18.11.2012 | por Luís Bernardo Honwana

Manual para Incendiários e Outras Crónicas #2 - PRÉ-PUBLICAÇÃO

Manual para Incendiários e Outras Crónicas #2 - PRÉ-PUBLICAÇÃO "Segundo as últimas notícias, a literatura moçambicana acabou. Um pré-aviso para este fim inglório, agora anunciado, surgiu há cerca de dois anos quando um grupo de jovens decretou a sua morte. Dada a abolição da pena de morte da ordem jurídica e penal do país, a sentença então pronunciada foi alvo de alguma polémica e causou agitação nos potenciais candidatos ao tenebroso corredor." O livro "Manual para Incendiários e Outras Crónicas" é um conjunto de crónicas publicadas entre 2000 e 2009 na imprensa portuguesa e moçambicana (Jornal de Letras, Savana, África Lusófona e Angolé), cujo fio condutor é a ironia do processo de escrita.

Mukanda

04.10.2012 | por Luís Carlos Patraquim

Manual para Incendiários e Outras Crónicas - PRÉ-PUBLICAÇÃO

Manual para Incendiários e Outras Crónicas - PRÉ-PUBLICAÇÃO Este livro é um conjunto de crónicas publicadas entre 2000 e 2009 na imprensa portuguesa e moçambicana (Jornal de Letras, Savana, África Lusófona e Angolé), cujo fio condutor é a ironia do processo de escrita. Repositório humorado das reflexões do autor-cronista sobre a actualidade, Manual para Incendiários e Outras Crónicas prima pelo olhar mordaz e apaixonado sobre a literatura, a identidade moçambicana, a aculturação e a intromissão ocidental. Crónicas desenvoltas que abarcam a Europa, África e as suas gentes, são uma visão destes dois mundos aliada a um vívido humor.

Mukanda

02.10.2012 | por Luís Carlos Patraquim

Onze perguntas para Mia Couto, uma entrevista inspiradora

Onze perguntas para Mia Couto, uma entrevista inspiradora Essa África que eu conheço sobrevive por um espírito de solidariedade, de abertura e de respeito com os outros. A forma que os africanos têm de se abordar, de saber um dos outros é uma coisa genuinamente autêntica. Quando eu estou cumprimentando alguém, quando estou falando com alguém, eu dou espaço para o outro. Então há uma lição de escutar os outros. Eu nunca falo quando o outro está falando, dou espaço, não tenho medo do silêncio, que é uma coisa que acontece aqui. As pessoas estão conversando, de repente há um silêncio, e isso é um peso, é uma coisa da qual temos que nos libertar, é uma ausência. Na África, essa ausência não existe. Nesse silêncio, há sempre alguém que fala. São os mortos. Por exemplo, a relação com o corpo.

Cara a cara

01.09.2011 | por Mia Couto

Como é que se escreve “Choriro”?

Como é que se escreve “Choriro”? Numa perspectiva contemporânea, Nhabezi personifica o projecto político do Ocidente que vem a África “reparar os danos e impactos historicamente causados pelo capitalismo na sua relação colonial com o mundo”. Do ponto de vista estritamente epistemológico, a metáfora aponta para o facto de o Ocidente estar disposto a ajudar a África a resgatar as suas formas de conhecimento e a potenciá-las para o avanço da humanidade.

A ler

18.08.2011 | por Lucilioja Manjate

O Bebé

O Bebé Boémio por excelência, Marhulane conhecia a noite como ninguém. Dormia até o sol se pôr, e, quase que num impulso de mola, saltava para a vida com o nascer do cinzento que o crepúsculo trazia. Exímio guitarrista, desafiava os rasgados agouros das corujas com acordes de labor elevado que arrancava da sua caixa acústica, tão amada como a sua esbelta Margarida, que embora se lamentasse do noctívago homem, a ele não poupava atenções e carinhos. Nisso ela não era austera. E, assim, lá iam levando a vida.

Mukanda

07.04.2011 | por Hilário Matusse

A viagem das palavras, entrevista a Sónia Sultuane, artista moçambicana

A viagem das palavras, entrevista a Sónia Sultuane, artista moçambicana Com ela, as palavras ganharam movimento e embarcaram numa viagem íntima sem fim à vista. Arrancou-as do púlpito sagrado do livro e empoleirou-as num monte de carvão, mergulhou-as no mar, elevou-as ao terraço de um prédio para beberem a inebriante vista da cidade. Numa rota imparável de Moçambique para o mundo, o projecto Walking Words (“palavras que andam”), de Sónia Sultuane, chega brevemente ao Brasil. Artista plástica, poetisa, criadora sob várias formas, Sónia esconde o embaraço de algumas perguntas com um riso tímido, mas emerge com tom firme e resoluto quando a conversa deriva para a política.

Cara a cara

27.03.2011 | por Cristiana Pereira

Entrevista a João Paulo Borges Coelho

Entrevista a João Paulo Borges Coelho A professora brasileira Carmen Tindó Secco entrevista o historiador moçambicano João Paulo Borges Coelho. "Actualmente, conquistamos a paz, e o valor desta é incalculável. Com ela veio um certo desenvolvimento material, mas também todos os problemas que normalmente andam associados àquilo que referimos como neo-liberalismo."

Cara a cara

17.09.2010 | por Carmen Lucia Tindó Secco

"O outro pé da sereia": o diálogo entre história e ficção na representação da África contemporânea

"O outro pé da sereia": o diálogo entre história e ficção na representação da África contemporânea O texto consiste em uma análise de "O outro pé da sereia", de Mia Couto, focalizando o diálogo entre a história e a ficção, no intuito de mostrar o tratamento dado pelo autor às principais questões do mundo contemporâneo: a identidade, o sentido de pertencimento, o pós-colonialismo e o choque entre culturas. Ao fazê-lo, Mia busca desconstruir os arquétipos acerca da África e seus povos.

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31.08.2010 | por Shirley de Souza Gomes Carreira

Sangare Okapi – e a revisitação do corpo literário moçambicano em “Mesmos Barcos”

Sangare Okapi – e a revisitação do corpo literário moçambicano em “Mesmos Barcos” Embora com toda a violência da ditadura salazarista e a indefectível mentira do império ultramarino, os poetas moçambicanos procuraram desconstruir os cânones impostos pelo colonizador europeu enaltecendo, por meio do verbo poético, o chão moçambicano e a pluralidade étnica. Rui Knopfli, Noémia de Sousa, José Craveirinha, Virgílio de Lemos, Fernando Couto e, nos primórdios, no século XIX, Campos Oliveira. A partir de um Índico hibridizado, confluente oriente/ocidente, denota-se a busca identitária.

A ler

09.08.2010 | por Ricardo Riso