Evocação a Ruy Duarte de Carvalho em Santarém

Ruy Duarte de Carvalho vai ser homenageado num encontro de familiares e amigos, com uma Exposição documental e biográfica, uma mostra e visionamento dos seus filmes e a análise antropológica da sua filmografia, no próximo dia 23 de Março (quarta-feira), pelas 17 horas, na Escola Secundária Dr. Ginestal Machado.

Ruy Duarte de Carvalho nasceu em Santarém, 22/4/1941, viveu na Quinta da Teixeira, localizada nas Fontainhas e faleceu em 12 de Agosto de 2010, aos 69 anos, na Namíbia, país onde residia. Ao longo da sua vida desempenhou muitos papéis sociais, facto que o tornou uma figura ímpar no panorama do conhecimento e das letras de Angola e, ultrapassando as suas fronteiras, conseguiu o reconhecimento de entidades, investigadores e demais intelectuais um pouco por toda a Europa e Brasil.

Atendendo à sua singular carreira, aos laços que familiares ainda mantêm com o nosso concelho e ao projeto de valores da cidadania e interculturalidade que a Oficina de Teatro da ES Ginestal Machado, está a desenvolver para o corrente ano, uma Comissão abraçou a ideia de promover esta singela homenagem a este scalabitano. Inquieto, andarilho, interventivo, com uma visão do mundo que marcou o caminho da investigação do mais íntimo e profundo das vivências da população de Angola, sobretudo da região Sudoeste, onde investiu a maior parte da sua existência: na investigação, no audiovisual, na prosa, na poesia, na pintura e aguarela, assim era Ruy Duarte de Carvalho…

Assim, no próximo dia 23 de Março (quarta-feira), pelas 17 horas, no auditório da Escola Secundária Dr. Ginestal Machado (ESGM), decorre um encontro de familiares e amigos de Ruy Duarte de Carvalho.

À noite, no Teatro Sá da Bandeira, integrada na programação do Cineclube, haverá uma sessão de cinema com o filme Nelisita (longa metragem premiada em várias Festivais), de forte pendor etnográfico, altura em que a sua obra será comentada pelos oradores, Dr. João Carmo, professor da disciplina de antropologia da imagem, na ES Educação de Santarém (ESES) e por Jaime Araújo, sobrinho do homenageado, conhecedor da obra e actual tradutor dos seus livros para futura edição em Inglaterra.

Do programa consta ainda uma exposição documental e biográfica do autor, na ESGinestal Machado, patente desde Fevereiro e que se prolonga, em Abril, na ESES, através da análise antropológica da sua cinematografia, no âmbito da disciplina de antropologia da imagem, da responsabilidade prof. Maia Carmo.

Este evento é organizado por uma Comissão da qual fazem parte a Oficina de Teatro da referida escola, o Centro Cultural Regional de Santarém, o Cineclube de Santarém e grupo de teatro Teatrinho de Santarém.

Na altura do seu falecimento, estava este grupo a encetar esforços para que Ruy Duarte de Carvalho visitasse esta cidade, para proferir uma palestra na escola Ginestal Machado, onde a sua filha, Eva Carvalho, havia concluído o ensino secundário.

Este scalabitano partiu ainda jovem com a sua família para Moçâmedes, de onde regressou para concluir o curso de regente agrícola. Doutor em Antropologia Social e Etnologia, em Paris, estudou cinema em Londres. Naturalizou-se angolano após a descolonização. Foi premiado no âmbito do cinema e da poesia e também teve actividade como artista plástico.

Leccionou nas Universidades de Luanda, Coimbra, S. Paulo, Paris e Berkeley. Homem de valores e saberes multifacetados, é um modelo do efeito fértil da transculturalidade, numa personalidade irrequieta e sempre disponível para um olhar científico e estético dos espaços que considerava “o lugar dos sinais fecundos, o lugar do arsenal de referências fecundáveis e potencial significante, capaz de actuar como conotador e detonador de criação, é um espaço que se situa fundamentalmente ao sul, quer poética quer civicamente. (…) A minha experiência poética nunca deixa de ser resultante de uma experiência tributária da carga cultural que transporto e do meio em que transito da pele do regente agrícola, cineasta e antropólogo investido num espaço que as circunstancias, pessoais, sociais e históricas determinaram que fosse angolano, no Sul de África e no terceiro Mundo.” (in JL, 1989). A sua obra começou a ser reconhecida no início do segundo milénio; contudo, sempre trabalhou sem objectivo do reconhecimento, mas pela fruição do saber e pela vontade inesgotável de mostrar e traduzir as cosmogonias antropológicas do Homem, fazendo-o de uma forma poética, quer pela harmonia da escrita, quer pelo equilíbrio da imagem sempre realista, capturando o belo, a energia, dos momentos simples, das práticas quotidianas e ritualizadas, traduzindo o embrenhado dinâmico de uma cultura em expansão. Registou e valorizou a cultura tradicional angolana, através de filmes, documentários e fotografia. Da mais cuidada mostra etnográfica fez poesia e ficção, fixou a força e a beleza autóctone em desenhos e pinturas, testemunhas da história dos costumes e crenças.

“É engraçado que agora as pessoas descobriram que eu estou aqui. Mas vivi grande parte da minha vida ali na Maianga” disse à revista Vida, em 2009, por altura de uma homenagem que lhe foi prestada, em Luanda e à qual acorreram intelectuais de todo o mundo.

Por cá também o Centro Cultural de Belém lhe ofereceu um espaço de reconhecimento em 2008, e, em 2010, já após a sua morte, o Festival Internacional de Cinema do Estoril dedicou-lhe um dia inteiro, com a apresentação da sua filmografia.

A Oficina de Teatro da Escola Secundária Dr. Ginestal Machado tem vindo a promover espaços de reflexão e debate sobre a nossa cidade de Santarém. Muitos dizem ser uma cidade despida de motivações e contudo basta um leve olhar para a reconhecermos como berço de gente tão interessante e marcada pela inebriante energia de produzir movimento cultural.

Tal como Ruy Duarte de Carvalho, a procura ou a síntese de identidades irrompe pelas obras de inúmeros actores de genialidades aqui nascidos. A razão do sucesso?Porque daqui se foram, dirão alguns, ou porque aqui nasceram, dirão outros. Muitos scalabitanos coabitam com esta dúvida e não se deixam ficar na nostalgia. Desta forma, a comissão proponente do evento reúne um grupo de gente plena de vontade de repensar os nossos valores, não descorando a necessidade de fazer mover os ânimos citadinos, num crescendo fértil de manifestações genuínas à procura de reconhecimento.

 

organizadores do evento: 

 

Margarida Gabriel, professora de Filosofia, na escola secundária Dr. Ginestal Machado, responsável pelo clube de Teatro desta escola, dentro do qual tenta desenvolver um projecto reactivo á reflexão sobre a cidade, exercício  de cidadania, vantagens da diversidade cultural, construção de identidades.
 
Carlos Oliveira, actor amador, fundador do grupo de Teatro o Teatrinho de Santarém ,do Festival de Teatro para a Infância e Juventude (FI T I J) e Bienal internacional de teatro circo, motivador e criador de outros grupos de teatro e poesia, recentemente homenageado com o premio prestígio personalidade atribuído pela Federação portuguesa de teatros amadores.
 
João Soeiro, finalista do curso de Comunicação e Multimédia, dirigente da Federação Nacional de  de Cineclubes e do Centro Cultural Regional de Santarém.
 
Humberto Nelson Ferrão, professor convidado da Escola Superior de Educação de Santarém, Técnico superior de Sociologia da Cultura na Câmara Municipal de Santarém. dirigente da Animar, e da associações de desenvolvimento local. Dinamizador de grupos associativos nas áreas de folclore, musica, teatro, literatura, cinema. 

 

por vários
Ruy Duarte de Carvalho | 19 Março 2011 | Ruy Duarte Carvalho