Psicólogos da paz ou traumas de guerra?
Cerca de um milhão (dados em constante mutação) de angolanos morreram na guerra civil. Como convivem os que sobreviveram a esta guerra fatídica com estas memórias traumáticas? Para onde foram estes militares pós guerra? Terão tido o acompanhamento necessário. E as famílias? O que foi feito à volta da humanização dos antigos combatentes? Para quando um investimento sério em «psicólogos da paz» ou mesmo academias e clínicas de especialidade?
A Associação Americana de Psiquiatria incluiu no Manual de Diagnóstico e Estatística de Transtornos Mentais (DSM-5), em 1980, a patologia de Stress Pós-Traumático. Segundo o diagnóstico, está sujeito a stress pós-traumático todo o indivíduo exposto a «…acontecimento ou acontecimentos que envolveram a morte ou o ferimento grave de alguém, ou ameaça de morte ou de ferimento grave (seus ou de outrem); a resposta da pessoa implicou medo intenso, impotência ou horror». Esta patologia foi inserida após a Guerra do Vietnam, verificando as desordens psiquiátricas dos militares. Que memórias patogénicas carregamos nós? Famílias inteiras foram assoladas pela guerra civil de Angola. Este crescente número de violência não estará intrinsecamente ligado aos traumas de guerra? Depressões, fobias, abuso excessivo de álcool e drogas, reações agudas de ansiedade e crises de pânico são algumas das alterações desta patologia. Levando até ao suicídio. Os filmes Thank You For Your Servise, de Jason Hall e o documentário Ward 54, de Monica Maggioni retratam a invalidez moral no regresso a casa. A socialização com mundo fora do contexto de guerra – “Nas neuroses traumáticas, a causa atuante da doença não é o dano físico insignificante, mas o afeto do susto- o trauma psíquico(…)” (Freud, 1987). Em Portugal foi inaugurado o centro de Saúde Mental no Hospital das Forças Armadas (HFAR) : “numa visão humanista e integral das necessidades dos militares das Forças Armadas e família militar e forças de segurança” , lê-se no site das Forças Armadas Portuguesas. Em Angola, o Hospital Psiquiátrico em Luanda não suprime as necessidades de uma intervenção a nível nacional. Contudo, são enormes os casos e relatos de traumas de guerra.
E o que dizer da juventude que assistia a noites de espancamento e tiroteio? Está sentada nas cadeiras das Universidades (ou fora delas). Numa guerra não existem heróis! Vítimas sim. Para lá de um homem sujo e moribundo há uma vítima da guerra. A minha geração corre o risco de ser uma geração sem memória. E nesta luta incessante pelo enquadramento da história, somos confrontados com os relatos orais e as vivências da nossa própria árvore geneológica. Nesta pura e dura constante Utopia. “A geração da Utopia” é permanente, passo a redundância: Numa guerra não existem heróis! (…) Sob trovões e trovoadas, como o Através da chuva de Miguel Gullander. Casas destruídas. Desabamento de pontes, imobilidade automóvel - imobilidade urbana (imobilidade pluvial): ruas alagadas, lixeiras a céu aberto e bairros lamacentos, piscinas sintéticas e a luz que vai e volta…nesta Kaloanda Dream que SEM LUZ GERA DOR. Voltou! Veio! E nunca mais veio…escuridão bailunda! Este é o preço da Paz. Um dia de chuva em Luanda, equivale a um TSUNAMI e a uma crónica atrasada… Psicólogos da Paz, ou Traumas de Guerra? Títulos. São sempre o meu pesadelo e os últimos a chegar.