Fogo Amigo - parte 3

Fogo Amigo - parte 3 Durante muito tempo, aterrorizava-me a cena final de Kids, o filme de Larry Clark, que estreou há 30 anos (1995). Vomitei internamente mas também externamente, tenho quase a certeza, naquela cena cruzada de contaminação: Telly, personagem interpretada por Leo Fitzpatrick, que mais tarde veríamos como Johnny Weeks no The Wire), viola Darcy (Yakira Peguero), adormecida e abandonada no final de uma festa, já depois de sabermos que Jennie, interpretada pela icónica Chloë Sevigny, foi contaminada por Telly e tem HIV. Jennie acaba por colapsar também nessa festa e é violada por Casper, Justin Pierce (skatista e arruaceiro, que morreu em 2000), amigo de Telly, e assim contaminando-o. “What just happened?” é a frase que fecha o filme e que me assombrou durante mesmo muito tempo.

A ler

18.01.2025 | por Patrícia Azevedo da Silva

Fogo Amigo - parte 2

Fogo Amigo - parte 2 O amor – e quando falo de amor também estou a falar de amizade – é político muito para lá desta ideia negociada das contrapartidas, de uma gestão do que se ganha e se perde numa relação de amor, apesar de não haver nada errado com as expectativas de que se ganham coisas numa relação de amor (e se perdem), ou das escolhas que fazemos, conscientes, sobre quem queremos manter na nossa vida. Porque aquela primeira efervescência que nos empurra para o sujeito da nossa admiração pode ou não ser desenvolvida. Pode ou não ser trabalhada: à semelhança das festas do divino, como propõe João Leal, o amor dá muito trabalho.

Mukanda

15.01.2025 | por Patrícia Azevedo da Silva

Fogo Amigo - parte 1

Fogo Amigo - parte 1 O meu adultecer foi uma transição triste: de um lado a rapariga punk que lutava para nunca ser igual (nem a si, nem aos outros), de outro lado a rapariga frágil e aflita que só queria ser acolhida. Já não confrontativa mas em conformidade. Como fazer isto sem ser cúmplice de tudo aquilo contra o que antes me tinha revoltado? Constituí-me num processo contra as instituições e contra um tempo heterossexual, apenas para perceber que o meu ódio à família só seria equiparado à minha necessidade absurda de família. Estudar, trabalhar, viajar, fazer amigas: tudo isto fazia parte de um projecto maior e mais abrangente que era ser mãe.

Vou lá visitar

14.01.2025 | por Patrícia Azevedo da Silva

Sem Título (Carta a A.)

Sem Título (Carta a A.) Para escrever um texto que fala das relações entre arte e luta necessitaria de uma língua estrangeira dentro da própria linguagem, uma língua de saltimbancos que materialize a possibilidade de dançar numa corda bamba e de combater. Ao invés, tenho apenas os trapos de palavras gastas que tento coser à volta dos problemas. Por exemplo, o problema de nem sequer conseguir pensar em atravessar a ponte que liga a arte e a vida, se ela alguma vez existiu, sem cair nos braços da lei. E de não conseguir admitir este estado de coisas sem me deixar cair em cobardia ou depressão.

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19.01.2017 | por Claire Fontaine