C.o.n.s.t.r.u.c.t.i.o.n. de Tiago Borges
C.o.n.s.t.r.u.c.t.i.o.n. é uma instalação que actualiza a potência disruptiva do trabalho de Tiago Borges (Luanda, 1973) e os gestos distópicos que têm vindo a marcar a sua produção artística. O uso de materiais low-fi, a disponibilidade em aproximar referências díspares (quase surrealizante) ou a desconstrução da iconografia pop e política dos movimentos de independência africanos remete para projetos anteriores, como por exemplo AfroUfo, que Tiago Borges e Yonamine apresentaram na Bienal de São Paulo (2014).
Porém, se ali a ficção ufologista prevalecia, aqui o comentário é endereçado à ruína da modernidade e à própria história, configurada como tragédia primeiro, e como farsa de seguida (Marx).
Se o mundo continua em crise, a história não se tornou progresso, o capital não supriu as desigualdades, e Deus morreu (Notre-Dame ardeu), o que fazer? Ao invés de alimentar a neurose da culpa que perpassa hoje o Ocidente, o gesto artístico de Tiago Borges vai ao encontro do híbrido e do impuro enquanto marcas dos processos de modernidade não canónicos desenvolvidos fora do eixo Europa-América do Norte. “A pureza é um mito” ou “Incorporo a revolta”, do artista brasileiro Hélio Oiticica, a ironia inscrita no trabalho de Tiago Borges, a luta poética de tantos outros artistas (músicos, hackers, artesãos, designers) da sua geração, celebram a relação entre mistura e modernidade e dão-nos a entender a especificidade das histórias na contramão da História.
C.o.n.s.t.r.u.c.t.i.o.n. reúne signos desarticulados do seu significado oficial e responde ironicamente à ideia de memorial ou monumento. Heráldicas, QR Codes, “souvenirs” políticos e estandartes lembram os despojos de uma batalha, adensam o vocabulário do artista e a sua liberdade criativa, indo muito além de qualquer significado estritamente político.
É esta a pátria impura de Tiago Borges. Entre utopia e alegria, misturando a energia vital e a contestação da norma…. C.o.n.s.t.r.u.c.t.i.o.n.
***Presente na ArcoLisboa 2019 (Feira Internacional de Arte Contemporânea de Lisboa, representado pela galeria Jahmekart Contemporary Art que, com a Cooperfield, de Londres, venceram em ‘ex aequo’ a segunda edição do Prémio Opening, que distingue o melhor pavilhão desta secção.
Tiago Borges. Luanda (1973). Interessa-se pelos sentidos, metáforas e percepção quando justapostos a curtos ensaios metafóricos visuais/provocativos/poéticos sobre memória, história e humanismo. Utilizando frequentemente o espectro finito versus infinito de possibilidades dos médios ao pensamento. Bacharelato em Arquitetura (Universidade de Manchester); Mestre em Design Interativo (Royal College of Art) (continuar a ler)