Sem assumir a responsabilidade por atos concretos de abusos cometidos, não há autocrítica

Sem assumir a responsabilidade por atos concretos de abusos cometidos, não há autocrítica É difícil aceitar como desculpa a ignorância ou a falta de noção, depois de tanto livro escrito; tanta palestra, tanta aula, tanta oficina, tanto fórum sobre o heteropatriarcado. O texto acaba por provar como Boaventura vem aprendendo seletivamente, e de acordo com seus interesses, as lições das lutas sociais feministas e por direitos humanos. Não aprendeu, por exemplo, o que significa responsabilização. Uma autocrítica vazia de responsabilização é apenas mais um passo de quem tem poder para controlar a narrativa.

Mukanda

08.06.2023 | por várias

O si-mesmo como sujeito imperial Literatura colonial dos anos 1920: o caso de Moçambique - INTRODUÇÃO

O si-mesmo como sujeito imperial Literatura colonial dos anos 1920: o caso de Moçambique - INTRODUÇÃO Os textos em estudo mostram como as noções de «luta de raças» e de seleção das comunidades mais aptas contribuem para a elaboração de uma «estratégia da crueldade» e para o desencadear de fluxos de morte de grande intensidade. O duplo processo de desterritorialização das populações pelas conquistas e da sua reterritorialização com a transformação social do espaço pelo capitalismo colonial tem lugar num contexto político totalitário. A instauração da ditadura racial e a generalização do terror geram a redução dos colonizados a uma condição de servidão económica e sexual. O desejo colonial permite também a emergência de formas de hibridismo social ou cultural e o questionamento da autoridade discursiva, imediatamente contrariados pelo desenvolvimento de uma política de domesticidade colonial.

Mukanda

29.05.2023 | por João Manuel Neves

Nereida Carvalho Delgado prepara um solo sobre abuso sexual de crianças em Cabo Verde

Nereida Carvalho Delgado prepara um solo sobre abuso sexual de crianças em Cabo Verde   Nereida Carvalho Delgado conta-nos um pouco do seu percurso no teatro que começa em 2004 com a companhia Fladu Fla, na Praia, sua terra natal. Muda-se para São Vicente, onde vai estudar Biologia Marinha e onde fica por nove anos, dando continuidade a formações de teatro numa associação italiana, na comunidade onde vivia, Ribeira de Craquinha. Está em Loulé, no contexto do Festival Tanto Mar, a fazer uma residência artística sobre um tema muito difícil mas com a urgência total em ser falado: a violência e abuso de crianças e adolescentes que, em Cabo Verde, dá-se muitas vezes no seio da família.

Cara a cara

27.05.2023 | por Marta Lança

Mediar os imaginários, promover trocas de saberes e práticas, a Mediateca Abotcha inaugura em Malafo

Mediar os imaginários, promover trocas de saberes e práticas, a Mediateca Abotcha inaugura em Malafo Contrariando a ideia do que vem de fora, dos negócios offshore, defendem uma Mediateca Onshore, na terra, e Abotcha, no sentido de “ir para o chão”, valorizar a humildade e a perseverança. Trata-se de uma rede de conhecimento a nível local, entre Sul-Sul e o mundo através das artes performativas, dos meios digitais, da arte, da agro-ecologia, dos saberes tradicionais. Uma Mediateca que se inscreve numa ideia de justiça social, económica e ambiental. Tudo isto envolto na paz e hospitalidade da tabanca de Malafo, maioritariamente balanta, uma das cerca de vinte etnias do país, conhecida precisamente por sua hospitalidade e mestria no domínio do arroz e das construções.

A ler

22.05.2023 | por Marta Lança

Exumações das muitas nomeações da dignidade e das muitas execrações da infâmia

Exumações das muitas nomeações da dignidade e das muitas execrações da infâmia Entretecidos /com o afirmativo com o pró-activo black power das celebrizadas estrelas afro-americanas do gospel dos negro spirituals do hambone do jazz do pattin'juba do rythm and blues do funk da soul music do disco do ragtime do rock‘n roll do tape dance do moon walk das suas vozes roucas dos seus timbres estridentes da sua trovejante pujança da sua psicadélica incandescência

Mukanda

21.05.2023 | por José Luís Hopffer Almada

Antes do Fim

Antes do Fim A repetição também dos dias e a eficiência turístico-económica até tinha feito desaparecer os contadores de estórias e os dactilógrafos desses mercados. Já não eram necessários. Agora servia-se café em cápsulas e chá em saquetas industriais. O progresso tinha chegado até ali e os turistas sentiam-se bem com isso, mais perto de casa. Sem paciência para negociar, cansados do jogo do gato e do rato, do comprador e do vendedor, dessa táctica que molda a cultura de um país, a esses turistas vendia-lhes o pior, mas sempre com a cordialidade mentirosa, conveniente para perpetuar o mito da simpatia marroquina. Uma batalha em forma de diálogo: especulação, silêncios, (des)confiança. Os turistas até achavam pitoresca toda aquela forma arcaica de funcionar de uma economia artesanal com gestos largos e encenados.

Mukanda

17.05.2023 | por Francisco Mouta Rúbio

Chiziane, Lisboa e Conversas!

Chiziane, Lisboa e Conversas! Terminada a pausa, regresso aos meus pais e à sua relação com a língua. Foi-lhes ensinado que não era civilizado falar em umbundo: “uma pessoa que estudou ou que é civilizada não pode mais falar essas nossas línguas, é preciso falar o português”, era essa a frase que o meu pai repetia quando me contava sobre as proibições do seu tempo. Tal como o meu pai e a minha mãe, os meus tios e tias, os seus amigos, e toda a sua geração nascida e criada antes das Independências, foram nalgum momento excluídos, humilhados e segregados quando não falavam o português do modo como lhes diziam que deveriam. Meu pai conta vários episódios de humilhação por causa disso. O que sucedeu na vida dessas pessoas após a Independência é que as feridas não foram saradas, os estragos causados pelo colonialismo não foram solucionados no 11 de novembro, e nós ainda temos conversas por ter e feridas por sarar.

A ler

14.05.2023 | por Leopoldina Fekayamãle

A minha bandeira

A minha bandeira É com este espírito que continuarei a minha caminhada, agora enquanto emigrante de dupla condição: o que regressa mas sobretudo o que parte em busca de uma vida melhor. O que parte também no ensejo de um dia voltar. Se ca bado ca ta birado, como profetiza Eugénio Tavares no seu poema-canção, que hoje evoco, nesta hora di bai. E nada é mais crioulo do que isso.

Mukanda

05.05.2023 | por João Branco

Amo o português quando o Ronaldo tem a bola

Amo o português quando o Ronaldo tem a bola O Ronaldo joga como os poetas falam e escrevem, sem gravatas, sem dizeres, nem lances oficiais, os outros jogam com mecânica como se escrevessem documentos oficiais.

A ler

05.05.2023 | por Fernando Carlos

Kuiam bastante!

Kuiam bastante! Cabo Verde e Guiné-Bissau já nem entram na categoria de rebeldes, são mesmo BANDIDOS! Esqueceram tudo e se entregaram de corpo e alma no kriolo! Conheci um assimilado que um dia me perguntou: mas kriolo não é português mal falado? Ai nha mãe!forti gana dal dôs bafatada… só pá dôdo… Não, kriolo não é português mal falado, kriolo é resistência, reinvenção, subversão e resiliência. Kriolo é a prova de que os antepassados estavam muito a frente mentalmente, apesar de todas as vozes que dizem o contrário.

Mukanda

02.05.2023 | por Aoaní d'Alva

Cholitas Escaladoras, o cume é para todos

Cholitas Escaladoras, o cume é para todos Um grupo de mulheres indígenas bolivianas, as cholitas, desafia, há oito anos, as montanhas geladas do país. A persistente escalada entre pedras e glaciares levou-as já aos picos mais altos da América. A conquista das alturas converteu as “Cholitas Escaladoras” num símbolo potente de resistência cultural, de luta contra a discriminação e de denúncia da violência que as segrega e mata.

Jogos Sem Fronteiras

30.04.2023 | por Pedro Cardoso

Manifestamo-nos por mundos despatriarcais e deshierárquizantes

Manifestamo-nos por mundos despatriarcais e deshierárquizantes A Academia (com A maiúscula e no singular) é para nós um campo de disputa e aí estamos, sem dúvida, posicionadas(os) todos e todas nós que ousamos entrar nele, dialogar com ele, desafiá-lo, habitá-lo e/ou co-construí-lo a partir da prática cotidiana. Muitas(os) de nós ocupamos este espaço por decisão e convicção e sabemos minuto a minuto o que estamos enfrentando. É por isso que o manifesto “Todos sabemos” nos ressoa e interpela quando afirma que o extrativismo epistêmico é estrutural e não apenas um evento isolado na academia. Quando afirma que a Academia é hierárquica e hierarquizadora e que promove a acumulação de poder por aqueles que estão no topo. Muitos deles, nos últimos tempos, têm sido acusados de abuso e assédio moral e sexual.

Mukanda

28.04.2023 | por várias

Djam Neguim artista cabo-verdiano: “Só é possível um futuro em que todes existam de todas as formas”

Djam Neguim artista cabo-verdiano: “Só é possível um futuro em que todes existam de todas as formas” Náná é o sufixo de Funaná, uma dança e música com origens na ilha de Santiago, música forjada, sobretudo por homens no mundo rural onde as mulheres têm um lugar passivo. A proposta de Djam Neguim consiste numa distorção destas "normatizações" da cultura cabo-verdiana, ainda muito rígida. “Com o meu trabalho tento romper com estas representações folclóricas e turísticas”, refere na nossa conversa que aconteceu pelas plataformas digitais.

Cara a cara

28.04.2023 | por André Castro Soares

GIZ, livro de poesia de Gisela Casimiro

GIZ, livro de poesia de Gisela Casimiro O livro mais duro. É o meu único nome, são uns quantos diminutivos, é o que ficou depois de passar pela Erosão. O giz vem do calcário. É o resto de uma pedra enorme que carreguei e ainda carrego, apenas de outra forma. Paisagem e pó.

Mukanda

27.04.2023 | por Gisela Casimiro

Uma comunidade de solidões

Uma comunidade de solidões A solidão, parece desnecessário dizer, é tóxica e terrível para a saúde. Mas é importante manter as coisas em perspetiva. É inadequado comparar a vulgarização da vida sozinho com a “epidemia de solidão”, que é o que os artigos dos jornais escrevem frequentemente em manchetes alarmantes. Os ingleses têm duas palavras para se referirem a dois tipos diferentes de solidão: loneliness — o estado negativo de estar sozinho, caracterizado pela sensação de falta — e solitude — a solidão que se escolhe, se deseja e traz felicidade, que amplia a consciência de si, a disponibilidade para a escuta, a criatividade, o sentido crítico e que reduz o stress.

A ler

26.04.2023 | por Marta Rema

O neo-lusotropicalismo linguístico: críticas à lei que classifica a língua portuguesa como património cultural imaterial de Cabo Verde

O neo-lusotropicalismo linguístico: críticas à lei que classifica a língua portuguesa como património cultural imaterial de Cabo Verde orque num país de parcos recursos como Cabo Verde qualquer lei que sobrestime a língua portuguesa traduzir-se-á, com base num jogo de soma zero, na amplificação de obstáculos a real promoção e oficialização da língua cabo-verdiana. Dito de uma forma mais direta: qualquer recurso, simbólico ou material, canalizado à língua portuguesa traduz-se no correspondente que não é transferido a língua cabo-verdiana.

A ler

26.04.2023 | por Abel Djassi Amado

Vidas em Português, Memória, Identidade e Cidadania na era digital

Vidas em Português, Memória, Identidade e Cidadania na era digital As novas tecnologias da comunicação e da informação fizeram surgir uma esfera de convivialidade baseada no mundo digital. A vida cotidiana foi replicada na rede mundial de computadores, desafiando pesquisadores de distintas áreas do conhecimento a desenvolverem metodologias e conceitos, com vista a compreenderem os impactos políticos, económicos e culturais destas inovações.

A ler

19.04.2023 | por vários

TODAS SABEMOS

TODAS SABEMOS Perante o atual debate público suscitado pela divulgação do capítulo “The walls spoke when no one else would: Autoethnographic notes on sexual-power gatekeeping within avant-garde academia”, publicado no livro Sexual Misconduct in Academia: Informing an Ethics of Care in the University (Routledge 2023), expressamos a nossa total solidariedade para com as autoras e demais vozes vindas a público, assim como para com todas as pessoas sujeitas a abusos de poder e outras formas de violência em contexto académico e fora dele. Este documento é uma contribuição coletiva e inacabada para um debate em curso.

Mukanda

14.04.2023 | por várias

Aerogramas de José Rubira: Guiné Bissau / Montemor-o-Novo 1971-1973

Aerogramas de José Rubira: Guiné Bissau / Montemor-o-Novo 1971-1973 Com o intuito de evidenciar o caráter também epistolar e material destas fotografias, partilhamos, além de uma digitalização da imagem nelas contida, o outro lado destes objectos fotográficos e organizamo-los cronologicamente pela data de envio. Propomos assim um debruçar sobre a sucessão de imagens e palavras que José Joaquim Rubira remeteu, ao longo de quase três anos, aos seus pais, aos seus tios e primos, à sua esposa e à sua filha Clara, que tinha apenas 6 meses quando José partiu de Montemor-o-Novo. José Rubira aparece retratado em todas as imagens.

Afroscreen

07.04.2023 | por Daniela Rodrigues

Entrevista a Kiluanji Kia Henda sobre Plantação, projeto para o Memorial de Homenagem às Pessoas Escravizadas

Entrevista a Kiluanji Kia Henda sobre Plantação, projeto para o Memorial de Homenagem às Pessoas Escravizadas É importante que uma obra pública (sobretudo um memorial) não mostre apenas uma face, mas que se abra a distintas leituras. Trata-se de uma plantação em luto, queimada, que traduz o lado lúgubre e funerário da plantação. E ainda faz homenagem à resistência dos escravizados pelo gesto de queimar a plantação e boicotar o regime de opressão. A plantação é o lugar onde o processo de desumanização ocorre.

Cara a cara

07.04.2023 | por Marta Lança