Com esta Newsletter do projecto MEMOIRS, a nº 147, damos por concluída um percurso iniciado a 5 de maio de 2018. Ao grupo de investigadores do projecto, às dezenas de colaboradores externos, a todos os artistas que contribuíram com as suas imagens, aos produtores e designers, o profundo agradecimento dos responsáveis pela edição, que de duas coisas estão certos: terem contribuído para a partilha de um bem comum, o conhecimento, e terem-no feito num espírito de serviço público.
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10.01.2022 | por António Pinto Ribeiro
Mais de três anos volvidos, as questões referidas mantêm toda a sua virulência e continuam a alimentar ciclicamente um debate público em que aquilo a que vários têm chamado o inconsciente colonial das sociedades europeias continua muito presente, traduzido numa atitude de recusa dos problemas de uma sociedade multicultural inevitavelmente marcada pela herança pesada do passado colonial.
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27.12.2021 | por António Sousa Ribeiro
Yvone Kane não é uma encenação do fim da ideologia, mas sim o registo da derrota de uma certa ideologia, que considerava a emancipação como uma possibilidade real, em conjunto com uma noção já há muito necessária e inclusiva, de pertença. É sobre o fim dessa utopia em particular que Yvone Kane faz o seu luto e manifesta a sua melancolia que nunca deve ser confundida com qualquer forma de nostalgia que, aliás, rejeita categoricamente.
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15.11.2021 | por Paulo de Medeiros
Passou para as gerações seguintes através das figuras do ex-colonizador e do ex-colonizado. Estas “personagens” reencenam uma complexa fantasmagoria profundamente relacionada com o espectro mais íntimo do subconsciente europeu: o seu fantasma colonial que se manifesta inter alia sob a forma de "transferências de memória" colonial — como racismo, segregação, exclusão, subalternidade – ou sob a forma de "erupções de memória", e assim questiona a essência das sociedades multiculturais europeias, desenhadas pelas heranças coloniais e alimentadas por vagas migratórias.
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31.10.2021 | por Margarida Calafate Ribeiro
Pertenço a uma geração em que se falou do 25 de Abril muito a correr. Aliás, estava nas últimas páginas dos livros de História. Falou-se essencialmente do Mário Soares - que era o que aparecia com algum relevo naquelas páginas. Conhecia a cara do Álvaro Cunhal, um bocadinho mais escondida. E depois quando se falava das colónias, era uma página. Então, a sensação que eu tinha era que aquilo tinha acontecido numa semana e que nós tínhamos sido expulsos de lá e acabou.
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03.10.2021 | por Bruno Sena Martins
Vivemos um tempo em que reconstruir parece ter-se tornado a preocupação central de todos, como acontece de modo geral num pós-guerra. A pandemia faz proliferar planos e ideias de reconstrução, recovery plans, programas de retoma, de reconstrução, de recomeço, de recuperação. É uma reação típica a determinados tempos do fim, quando se viveu uma espécie de fim dos tempos, uma experiência catastrófica ou final que profunda e destrutivamente se abateu sobre um determinado tempo, deixando a posteriori uma intenção - antes de um gesto - de superação do fim ou de reinício, o virar da página.
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18.09.2021 | por Roberto Vecchi
A aldeia era pequena, todos se conheciam, Amande sabia que eu ia falar com outros habitantes. Provavelmente, ao mostrar-me a terrina, quis antecipar-se a eventuais mexericos. Naquele mesmo serão, um outro morador da aldeia, um veterano da guerra da Argélia, confidenciou-me que o pai de Amande ocupou, durante a Segunda Guerra Mundial, funções na administração local que implicavam contactos frequentes com os alemães. E que, à boca pequena, só por causa disso, muitos lhe chamavam «colaboracionista». Mas depois disse que isso fora há muito tempo e que já quase ninguém se lembrava dessas histórias.
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06.09.2021 | por Paulo Faria
Em vez de entender um museu nacional como um repositório de objetos artísticos emblemáticos dos valores da elite ou então da sua fetishização de todos os que exclui e rejeita, os curadores aceitaram integralmente a sua responsabilidade educacional e o seu dever em contribuir para a vida cultural no presente. O que, mesmo assim, não evita de todo de nos deixar com a impressão que o fogo do Purgatório afinal ainda arde e muito há ainda a fazer para o extinguir.
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15.08.2021 | por Paulo de Medeiros
Reescrevi biografias, topografias e narrativas. Quiçá, tentando, sem que o soubesse, desconstruir traumas, conciliar e articular, pelo uso da imaginação, o meu lugar de pertença, esta minha vida repartida entre dois continentes, querendo dar sentido à nostalgia e ao sofrimento sentido pelo avô. Seguindo ao seu lado, enquanto dá as voltas à mística mulemba e diz: “O que fica, fica aqui.”
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22.07.2021 | por Yara Monteiro
A descolonização, iniciada com a resistência dos povos colonizados, teve no 25 de Abril uma data marcante. O golpe feito revolução resulta diretamente da derrota política na guerra. A ele se sucedeu o fim do império em África e um processo revolucionário do qual a democracia portuguesa é herdeira. Neste sentido, uma boa ocasião para debater e estimular novas políticas públicas da memória sobre o passado colonial será, certamente, o próximo ciclo comemorativo do 25 de Abril.
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19.07.2021 | por Miguel Cardina
Entre os dias 5 e 10 de Julho, o projeto Memoirs promove – em parceria com a Brotéria – um curso que quer criar ferramentas para que quem participa nele possa analisar e pensar criticamente a questão pós-colonial em Portugal, na Europa e no mundo. Para isso, partir-se-á de um conjunto de tópicos que tem vindo a preencher e questionar a atualidade do século XXI e as suas relações com o social, o político, o tempo e o espaço.
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06.07.2021 | por Francisco Martins SJ
Para desgosto dos mestres-jardineiros da outrora capital do império, a “inconstância da alma indígena” foi e será a autodeterminação de quem se quer recusar a ser talhado pelo poder colonial-racista. Vale lembrar que os cravos de abril não teriam existido sem essa preciosa determinação.
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22.05.2021 | por Bruno Sena Martins
Num recente texto de opinião, publicado em Outubro de 2020, Ricardo Silva Romero (Bogotá, 1975), um dos mais importantes escritores e colunistas da imprensa da Colômbia hoje, refletia sobre o lugar da sua geração na – infelizmente duradoura – história da violência colombiana.
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10.04.2021 | por Felipe Cammaert
Nunca tivemos acesso a tantos arquivos e documentos como hoje, usando simplesmente um teclado. É desnecessário ir à procura do passado: se quisermos, o passado, nas suas multíplices dobras, está - ainda que no simulacro digital - ao nosso alcance. Está à nossa frente. No entanto, o paradoxo é evidente, pois a facilidade de acesso corresponde não a uma potencialização, mas a uma deterioração da nossa capacidade de reter e entender o passado aproximando-nos dele e de construirmos uma memória menos precária; uma memória que ultrapasse as barreiras das recordações individuais ou das sombras de imagens projetadas nos ecrãs que não remetem para nenhum conhecimento.
Jogos Sem Fronteiras
27.03.2021 | por Roberto Vecchi
É um lugar-comum dizer-se que a produção de memória arrasta consigo, inevitável e concomitantemente, a produção de esquecimento. Há muitas formas de esquecimento, a mais insidiosa das quais é, sem dúvida, a rasura da memória, a reescrita do passado como parte de uma estratégia deliberada de intervenção no presente.
Jogos Sem Fronteiras
28.02.2021 | por António Sousa Ribeiro
Os acontecimentos destes últimos seis anos deram uma maior acuidade às observações de Gilroy. Simultaneamente, tornaram cada vez mais evidente que, não obstante o progresso real alcançado, as tentativas de manter privilégios baseados na desigualdade estrutural e sistémica, no tocante à classe, ao género ou à raça, se tornaram ainda mais obstinadas. Tentativas que vão de mãos dadas com os esforços, inúteis, mas devastadores, de negar a História e impor o apagamento da memória.
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18.02.2021 | por Paulo de Medeiros
A relevância da participação negra em Portugal nas mais diversas áreas – incluindo a música – remonta já a várias centenas de anos, mas raras vezes é articulada nas narrativas públicas dominantes. Não se trata, naturalmente, de os negros em Portugal não terem voz ou não se encontrarem presentes no quotidiano do país. Trata-se, isso sim, muitas vezes, de falarem sem serem considerados, de verem sem serem vistos, de cantarem sem serem escutados – pelo menos, fora de uma esfera cultural tendencialmente mais circunscrita.
Palcos
30.01.2021 | por Inês Nascimento Rodrigues
No dia 30 de junho de 1960, na cerimónia de proclamação de independência do Congo, houve três discursos: do rei Baudouin da Bélgica, antiga potência colonizadora, do Presidente do Congo, Joseph Kasavubu, e de Patrice Lumumba, primeiro-ministro, este último, numa intervenção não prevista no protocolo inicial. Foi um discurso curto de cerca de doze minutos, escrito numa linguagem acessível e incisiva, performativa e visual, um discurso que, como defende o historiador Jean Omasombo Tshonda, “funda o Congo independente”. Os primeiros oito minutos são a mais clara definição do que é o colonialismo do ponto de vista de um continente, de um país, de uma comunidade, de uma pessoa.
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30.01.2021 | por Margarida Calafate Ribeiro
Os pormenores são repugnantes, mas não consigo deixar de sentir um júbilo secreto por ter deparado com mais uma história exemplar do colonialismo, no sentido mais lato da palavra «colonialismo». O colonialismo é fazermos a alguém aquilo que entendemos como «bem», mas que essa pessoa sente como «mal», para que essa pessoa nos possa servir melhor. Reformulo: o colonialismo é instrumentalizarmos o outro, fazendo-lhe bem somente na medida em que esse benefício nos possa beneficiar a nós. Resta dizer que o carácter exemplar de uma história escapa quase sempre ao seu narrador.
Mukanda
16.01.2021 | por Paulo Faria
Eduardo Lourenço foi, sozinho, uma grande família intelectual: filósofo, professor, crítico literário, pensador, mitólogo, crítico de artes, de cinema, ensaísta, precursor da crítica pós-colonial e dos estudos culturais, escritor, homem de letras, só para fornecer uma lista funcional e sempre incompleta. Foi um triunfo não de disciplinas, mas de “indisciplina”, num mundo sempre mais virado para o elogio (preguiçoso) da “especialização”.
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16.01.2021 | por Roberto Vecchi