Do nosso esforço espiritual

Do nosso esforço espiritual Depois do Egípcio e do Índio, do Grego e do Romano, do Teutónico e do Mongol, o Negro é uma espécie de sétimo filho, nascido com um véu e dotado de uma segunda visão neste mundo americano – um mundo que não lhe concede uma consciência de si verdadeira, mas apenas lhe permite ver-se a si mesmo através da revelação do outro mundo. É uma sensação estranha, esta dupla consciência, esta sensação de estar-se sempre a olhar para si mesmo através dos olhos dos outros, de medir a nossa alma pela bitola de um mundo que nos observa com desprezo trocista e piedade.

Mukanda

15.06.2011 | por William Du Bois

Diário de um regresso ao país natal

Diário de um regresso ao país natal E estes vestígios da minha prodigiosa ascendência! / Aqueles que não inventaram nem a pólvora nem a bússola que nunca souberam domar o vapor ou a electricidade / que não exploraram os mares nem o céu / mas conhecem os mais ínfimos recantos da terra do sofrimento / que das viagens só conheceram as de desenraízamento / que foram amansados com humilhações / que foram domesticados e cristianizados / e contagiados de degeneração / tam-tam de mãos vazias

Mukanda

31.05.2011 | por Aimé Césaire

De Toussaint L’Ouverture a Fidel Castro

De Toussaint L’Ouverture a Fidel Castro O Haiti teve de encontrar um factor de união nacional. Procuraram-no no único local onde poderia ser encontrado, em casa, ou mais precisamente, no seu próprio quintal. Descobriram aquilo que hoje é conhecido como negritude. É a ideologia social predominante entre políticos e intelectuais de toda a África. É tema de acaloradas elucubrações e disputas, sempre que se discute a África e os africanos. Mas, no que respeita à sua origem e evolução, a negritude é caribenha e não poderia ter sido senão caribenha, resultado peculiar da sua história peculiar.

Mukanda

31.05.2011 | por C.L.R. James

A presença africana

A presença africana Um negro das Caraíbas que empreenda uma viagem semelhante a África está menos seguro. A sua relação com esse continente é mais pessoal e mais problemática. Mais pessoal, porque as suas actuais condições de vida e o seu estatuto como homem indicam claramente as razões que levaram os seus antepassados a abandonar aquele continente. Essa emigração não foi um acto voluntário, foi uma deportação comercial cujas consequências deixaram marcas profundas em todos os aspectos da vida das Caraíbas. Estas consequências sentem-se de um modo mais profundo na sua vida pessoal e na sua relação com o ambiente que o rodeia: as políticas raciais e coloniais que constituíram o fundamento e o marco da sua passagem da infância à adolescência. A sua relação com África é mais problemática, porque ao contrário do Americano, ninguém lhe deu a conhecer a história desse continente.

Mukanda

31.05.2011 | por George Lamming

As comunidades

As comunidades  As comunidades estão acima de qualquer suspeita, são incorruptíveis e têm uma visão infalível sobre os destinos da humanidade. É assim que pensam uns tantos missionários dessa nova religião que se chama «desenvolvimento». Uma tropa de associações cívicas serve-se desse conceito santificado e santificante. Essa entidade pura não existe. Felizmente. O que há são entidades humanas, com os defeitos e as virtudes de todas as entidades humanas.

Mukanda

02.04.2011 | por Mia Couto

Inês não é morta

Inês não é morta É sempre escuro no país do futuro porque falta fazê-lo, e ninguém o fará senão nós. Portanto, quanto a Atlânticos e Índicos em todas as suas margens falantes de português, acredito que Inês não é morta. Depende de haver quem fale e quem escute, como podemos escutar Lula Pena e ela ser fado, morna ou Caetano Veloso, sendo única: ela própria.

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01.04.2011 | por Alexandra Lucas Coelho

A Língua Tamazigh

A Língua Tamazigh No mundo berbere ou amazigh nunca existiu normalização e unificação linguística: não existe uma norma instituída da língua tamazight, mesmo no uso literário da mesma. Cada grupo emprega o seu ou os seus falares locais que, contudo, são usados apenas para a comunicação intra-regional. Perante esta situação de fragmentação, que provém fundamentalmente de diferentes derivações étnicas, os dados estruturais fundamentais permanecem os mesmos em todas as variedades: o grau de unidade, nomeadamente gramatical, “dos falares” berberes é de facto impressionante, tendo em conta as distâncias e vicissitudes históricas de cada um.

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29.03.2011 | por Rita Damásio

Uma música com identidade

Uma música com identidade Em 1943 Benguela prospera. Com o famoso caminho-de-ferro a avançar em direcção ao interior africano, a cidade prepara-se para mudar de cara segundo um moderno plano de urbanização. Respira-se progresso. Numa das suas ruas um acontecimento importante está também prestes a acontecer: Dona Ludovina (uma cantadeira de mão cheia, diz-se), esposa de Sebastião José da Costa, um funcionário dos Correios e antigo jornalista, prepara-se para dar à luz uma criança a que dará o nome de Carlos Lamartine. Benguela prepara-se assim para receber, de braços abertos mais um grande filho, que se tornará num senhor grande da música nacional e autor de melodias imortais.

Palcos

18.02.2011 | por Mário Rui Silva

Constelações identitárias

Constelações identitárias A Educação Multicultural e Intercultural surgiu no século XX como resposta a problemas históricos vividos pelas sociedades. Ao longo das últimas décadas procurou-se o reconhecimento das especificidades culturais em cada nível social para promover a igualdade de oportunidades, o respeito mútuo e a integração de todas as pessoas como cidadãos. No entanto, tende muitas vezes a dar ênfase a várias categorias identitárias, usando-as para distinguir os alunos e cidadãos.

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17.01.2011 | por Maria Prata

Viagens (entre)cruzadas

Viagens (entre)cruzadas Interpretar o viajante, na actualidade, decorre de um pensamento multilateral ampliado pela situação geográfica e cultural que existe entre o ponto de partida e o ponto de chegada. A latitude humana que se encontra nas distâncias percorridas entre princípio e fim de um percurso é, para muitos, um agente provocador que resulta num campo de experimentação artística e intelectual, onde a força de espaços inócuos nos leva a partilhas e à construção de conceitos.

Cara a cara

02.01.2011 | por Jorge Rocha

Algumas cidades da África contemporânea e os rituais e experiências no bifronte tradição versus modernidade: Cidade do Cabo, Accra, Kigali (muti, haucá, hutu).

Algumas cidades da África contemporânea e os rituais e experiências no bifronte tradição versus modernidade: Cidade do Cabo, Accra, Kigali (muti, haucá, hutu). Olhar para algumas das cidades da África contemporânea é enfrentar os desdobramentos de sua dilaceração colonial, é atentar para as repercussões que o poder, essa articulação dimensional da dominação, imprime naqueles em que toca. A proporcionalidade da resposta, da interação, está diretamente ligada à sua efusão. Tais vestígios são sempre contundentes, pois se inscrevem na carne como um pontiagudo arabesco de sangue, pus e baba. Ao desespero de sua emergência contrapõe-se em quase tudo, quase tudo, a racionalidade do poder que o encetou. Restarão fios delicados a nos lembrar que esses outros estão atentos às limitações racionalistas de seus algozes inspirados e que depois serão transpirados como suor, como sangue, como nervos.

Cidade

27.11.2010 | por Eduardo Bonzatto

De como se constrói um Europeu

De como se constrói um Europeu Leio com atenção as notícias da chegada de mais e mais emigrantes às “costas da Europa” (qual será a Europa deles? Em que janela a terão desenhado a contraluz?); apercebo-me da sua presença nesta Europa em que vivo, sinto o reforço das leis e a construção dos campos de detenção para os acolher, a sociedade a mudar com a sua presença, a minha presença a mudar com a presença deles, Lisboa a ficar capital Europeia, eu a ficar Europa que não quero ser.

Jogos Sem Fronteiras

11.11.2010 | por Ana Bigotte Vieira

Murmúrios do espio: uma leitura sobre o olhar marginal e exilado da escrita de lídia jorge e suas personagens femininas em "A Costa dos Murmúrios"

Murmúrios do espio: uma leitura sobre o olhar marginal e exilado da escrita de lídia jorge e suas personagens femininas em "A Costa dos Murmúrios" Parte-se do pressuposto que o Romance de Lídia Jorge A costa dos Murmúrios, apresenta uma escrita pós-colonial e um posicionamento político feminino em relação à Guerra Colonial de Portugal na África. Assim, o artigo apresenta um breve resumo da obra, para, em seguida, desenvolver questões sobre o posicionamento social das personagens exiladas; depois comentar a vivência da escritora como mulher e exilada e, finalmente, tecer comentários sobre o seu lugar de fala e propósito da obra. Em suma, o artigo pretende interpretar o texto de Lídia Jorge, considerando sua vivência de exílio e relacioná-la ao seu posicionamento político no momento da escritura do romance.

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27.10.2010 | por Sumaya Machado Lima

"O outro pé da sereia": o diálogo entre história e ficção na representação da África contemporânea

"O outro pé da sereia": o diálogo entre história e ficção na representação da África contemporânea O texto consiste em uma análise de "O outro pé da sereia", de Mia Couto, focalizando o diálogo entre a história e a ficção, no intuito de mostrar o tratamento dado pelo autor às principais questões do mundo contemporâneo: a identidade, o sentido de pertencimento, o pós-colonialismo e o choque entre culturas. Ao fazê-lo, Mia busca desconstruir os arquétipos acerca da África e seus povos.

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31.08.2010 | por Shirley de Souza Gomes Carreira

Os sete sapatos sujos

Os sete sapatos sujos A força de superarmos a nossa condição histórica reside dentro de nós. Saberemos como já soubemos antes conquistar certezas que somos produtores do nosso destino. Teremos mais e mais orgulho em sermos quem somos: moçambicanos construtores de um tempo e de um lugar onde nascemos todos os dias. É por isso que vale a pena aceitarmos descalçar não só os setes mas todos os sapatos que atrasam a nossa marcha colectiva.

Mukanda

25.08.2010 | por Mia Couto

Os processos socio-históricos em acção nas artes contemporâneas africanas

Os processos socio-históricos em acção nas artes contemporâneas africanas Dak’Art deve ampliar o seu público e aliar-se cultural e artisticamente à América do Sul, para inscrever as artes contemporâneas africanas num contexto global, numa abordagem prospectiva cuja aposta é conseguir desbloquear e alargar a esfera de produção e de visibilidade das artes contemporâneas africanas.

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12.08.2010 | por Boubacar Traoré

Sangare Okapi – e a revisitação do corpo literário moçambicano em “Mesmos Barcos”

Sangare Okapi – e a revisitação do corpo literário moçambicano em “Mesmos Barcos” Embora com toda a violência da ditadura salazarista e a indefectível mentira do império ultramarino, os poetas moçambicanos procuraram desconstruir os cânones impostos pelo colonizador europeu enaltecendo, por meio do verbo poético, o chão moçambicano e a pluralidade étnica. Rui Knopfli, Noémia de Sousa, José Craveirinha, Virgílio de Lemos, Fernando Couto e, nos primórdios, no século XIX, Campos Oliveira. A partir de um Índico hibridizado, confluente oriente/ocidente, denota-se a busca identitária.

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09.08.2010 | por Ricardo Riso

Literaturas emergentes, identidades e cânone

Literaturas emergentes, identidades e cânone O conceito de literaturas emergentes surgiu nas últimas décadas como consequência das chamadas teorias pós-coloniais e alargou-se, por influência da poderosa academia norte-americana, tanto às denominadas literaturas de minorias (étnicas, de género, de orientação sexual), como às literaturas formadas no interior dos processos de colonização e descolonização, independentemente das características destes.

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06.07.2010 | por Fátima Mendonça

Reprimindo demónios do passado: a reinserção identitária africana e racial nas representações

Reprimindo demónios do passado: a reinserção identitária africana e racial nas representações Como tem sido produzida a identidade do africano na história, qual é o papel dos media nas novas percepções, representação e discurso sobre os africanos e negros? A globalização cultural traz novos modos de representação identitária que vão para além do que é visível, englobando aspectos simbólicos e de fraternidade em relação às diferentes raças. As identidades visíveis entram num caos globalizado.

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19.06.2010 | por Gerson Geraldo Machevo

África em mim

África em mim Em qualquer lado onde se busque a influência política constata-se um vazio ideológico que castra ou mesmo mantém o país aquém do nosso verdadeiro potencial. Qualquer debate nesse sentido é permeado por falsas questões, negação e verdadeiros "braços de ferro" onde todos perdem. A questão do crioulo é um desses tabus que estamos a criar e que remetem para a questão África vs Europa e da identidade. Falsa questão!

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02.06.2010 | por Amílcar Aristides Monteiro