A curadoria do desconforto

A curadoria do desconforto No seu livro, Applebaum reproduz uma conversa telefónica em que Stenner lhe disse que “a ‘predisposição autoritária’ que identificou não é exactamente a mesma coisa que uma mente fechada.” ​“Seria melhor descrita”, explica, “como uma mente simplória: as pessoas costumam ser atraídas por ideias autoritárias porque a complexidade as incomoda. Não gostam da divisão. Preferem a unidade. Uma ofensiva repentina de diversidade — diversidade de opiniões, diversidade de experiências — deixa-as irritadas. Procuram soluções numa nova linguagem política que as faça sentirem-se mais seguras e protegidas.” Os populistas conhecem bem esta psicologia e é com base nela que constroem as suas tácticas: alimentam o desconforto e o medo e com poucas mensagens, curtas e simples, “vendem” segurança e protecção.

Jogos Sem Fronteiras

12.02.2021 | por Maria Vlachou

Philipp Hartmann: «enquanto existirem pessoas determinadas a lutar pelo cinema, este sobreviverá»

Philipp Hartmann: «enquanto existirem pessoas determinadas a lutar pelo cinema, este sobreviverá» No final o cinema sempre sobrevive. A minha esperança e otimismo, o qual tentei depositar no filme, é que enquanto existirem pessoas determinadas a lutar pelo cinema ou demonstrar o seu grande amor por ele, este sobreviverá. Pode ser um ato de resistência, e seguramente o é, mas espero que seja o caminho do sucesso na luta. Mas agora, com a pandemia, a situação será mais complicada, porque depende do nosso regresso à “normalidade” e de quanto ajuda os Governos estarão dispostos a dar para os proteger, ou os salvaguardar, quem sabe, de uma próxima pandemia.

Cara a cara

12.02.2021 | por Hugo Gomes

As cores do racismo português: do colonialismo à actualidade

As cores do racismo português: do colonialismo à actualidade Se num período inicial os filósofos ou os autores de livros de viagens elaboraram representações raciais, foram depois os médicos e os cientistas, especialmente antropólogos físicos, a contribuir para essa concepção. Algumas das teorias raciais produzidas anteriormente e em outros países foram adaptadas às populações ultramarinas portuguesas. A política definiu categorias e a ciência engendrou estratégias para apoiar. As cores de pele escuras estiveram associadas ao feio e negativo e as claras ao bonito, inteligente e positivo. Umas foram identificadas com quem era dominado e outras com quem dominava.

A ler

11.02.2021 | por Patrícia Ferraz de Matos

Questões raciais no debate cultural

Questões raciais no debate cultural Em que medida a presença de artistas negros apenas em exposições destinadas ao tema não geram uma dupla reificação: uma redução do artista e de sua obra a apenas um aspecto de sua identidade? É suficiente reunir a produção de artistas negros, apenas por sua etnia? Ou, ainda, a redução de uma exposição à discussão racial não acaba por perder de vista uma série de singularidades formais e conceituais diversas, além de especificidades de linguagem e da especificidade desse assunto dentro da produção de cada artista?

Palcos

11.02.2021 | por Leandro Muniz

N’gamabô

N’gamabô É costume ver-se inúmeras pessoas agrupadas na rua durante qualquer horário do dia e da noite simplesmente a falar, trocando ideias ou jogando jogos de mesa. Crianças de todas as idades a praticar desporto durante várias horas seguidas. Crianças construíam bicicletas da madeira desde raiz. Inacreditável. Crianças a brincar com fisgas. Lembro-me de pensar, esta felicidade não tem comparação. Algumas destas diferenças culturais provinham certamente da minha subconsciente postura etnocêntrica, muito forte na adolescência. A viagem ajudou-me a ser mais humilde comigo próprio e com os outros e, além disso, a perceber as diferenças entre seres humanos idênticos mas diferentes em tanta coisa.

A ler

10.02.2021 | por Álvaro Amado

Jean Michel-Basquiat em Como Ser um Artista

Jean Michel-Basquiat em Como Ser um Artista Jean Michel-Basquiat não era um fã de entrevistas e, nas raras ocasiões que se rendeu às mesmas, suas respostas foram breves e um pouco enigmáticas. Apesar disso, as palavras do artista revelam muito sobre as suas inspirações e o seu processo consumidor. Elas oferecem uma janela à sua abordagem, no qual ele fez uma mescla de referências entre história de artes, ruas de Nova Iorque nos anos 80 e o tumulto da cultura pop com a sua herança caribenha e a sua identidade como um jovem homem negro.

Palcos

09.02.2021 | por Alexxa Gotthardt

Desenterrando a esquecida história da escravatura em Lisboa

Desenterrando a esquecida história da escravatura em Lisboa Apesar da importância da escravidão na formação de Portugal e do seu império ultramarino, esta horrenda história da submissão “negra” é completamente abafada na memória pública lisboeta. Em contraste ao (recentemente criado e bem tardio) Museu da História e Cultura Afro-Americana nos EUA ou ao Museu Afro-Brasileiro em São Paulo, Brasil, não há museus deste género ou um memorial público de condenação tal como em Nantes, França. Mais recentemente, apesar de tudo, um museu de escravatura foi criado no histórico mercado negro “Mercado de Escravos” no sul de Portugal, no porto de Lagos, o qual é considerado o primeiro local de troca comercialde escravos africanos na Europa. No entanto, Lisboa permanece ainda largamente calada face ao seu legado de terror branco e cativeiro negro.

Cidade

04.02.2021 | por Yesenia Barragan

Arquivo de Identidade Angolano: uma associação feminista e descolonial

Arquivo de Identidade Angolano: uma associação feminista e descolonial Têm quatro anos de existência e centram o seu trabalho no diálogo e na acção para mais igualdade e justiça das pessoas LGBTQ+ em Luanda. Para isso partem de dinâmicas feministas negras e descoloniais para a criação de redes de acção e solidariedade. Esta abordagem já tem ecos junto das instituições do Estado como o Ministério da Justiça em Angola para a criação de uma agenda pela igualdade e respeito pelos direitos humanos das pessoas LGBTQ+. Líria de Castro é a activista angolana que dirige a AIA e falou-nos dos desafios da organização do colectivo AIA em tempos de pandemia.

Corpo

04.02.2021 | por André Castro Soares

"As festas de quintal, o fazer conversa, a beleza no dançar e no andar", entrevista a André Castro Soares

"As festas de quintal, o fazer conversa, a beleza no dançar e no andar", entrevista a André Castro Soares A kizomba veio nas bagagens dos africanos, que em finais dos anos 90 do século passado fizeram de Lisboa a cidade das suas vidas. A kizomba parece ter vindo do ambiente das festas de quintal de Luanda e Angola, mas claro que veio em jeito de passada de São Vicente ou da Praia, de Cabo Verde. Ao juntarem-se nas discotecas africanas em Lisboa e nas festas africanas nas universidades portuguesas a kizomba começa a entrar no léxico dançante das pessoas que visitavam estes espaços. Muitas das discotecas latinas tinham momentos de kizomba, o que também ajudou a levar o género um pouco à boleia da salsa e da bachata da República Dominicana.

Palcos

04.02.2021 | por Marta Lança

O maravilhoso 1972

O maravilhoso 1972 Este álbum faz-me regressar a um passado sonhado com uma visão e uma identidade muito fortes. Vejo-o como uma das obras mais marcantes da música portuguesa e da cultura de Angola, com uma estética vanguardista que ainda hoje se manifesta global, progressiva e contemporânea em todo o seu esplendor. Sem barreiras ou amarras, assumindo todas as culturas como matriz de todos os tons e ritmos, todas as cores e dialectos, onde a primeira brincadeira de infância, a primeira lembrança, a tradição, surgem traduzidas com alma, honestidade intelectual e pureza estética.

Palcos

02.02.2021 | por Paulo Flores

A história e protagonistas da música afro-portuguesa

A história e protagonistas da música afro-portuguesa A relevância da participação negra em Portugal nas mais diversas áreas – incluindo a música – remonta já a várias centenas de anos, mas raras vezes é articulada nas narrativas públicas dominantes. Não se trata, naturalmente, de os negros em Portugal não terem voz ou não se encontrarem presentes no quotidiano do país. Trata-se, isso sim, muitas vezes, de falarem sem serem considerados, de verem sem serem vistos, de cantarem sem serem escutados – pelo menos, fora de uma esfera cultural tendencialmente mais circunscrita.

Palcos

30.01.2021 | por Inês Nascimento Rodrigues

Patrice Lumumba, 60 Anos Depois

Patrice Lumumba, 60 Anos Depois No dia 30 de junho de 1960, na cerimónia de proclamação de independência do Congo, houve três discursos: do rei Baudouin da Bélgica, antiga potência colonizadora, do Presidente do Congo, Joseph Kasavubu, e de Patrice Lumumba, primeiro-ministro, este último, numa intervenção não prevista no protocolo inicial. Foi um discurso curto de cerca de doze minutos, escrito numa linguagem acessível e incisiva, performativa e visual, um discurso que, como defende o historiador Jean Omasombo Tshonda, “funda o Congo independente”. Os primeiros oito minutos são a mais clara definição do que é o colonialismo do ponto de vista de um continente, de um país, de uma comunidade, de uma pessoa.

A ler

30.01.2021 | por Margarida Calafate Ribeiro

Resenha literária do livro "Metrónomo sem Função"

Resenha literária do livro "Metrónomo sem Função" O metrónomo sem função identifica o tempo indefinido, vago, indeterminado que está na base da narrativa. É a história de uma jovem de província e da fuga da província (para Lisboa e para Amesterdão); de quem decide sair dos limites provincianos de Coimbra nos anos 80-90, da fuga das tradições familiares e culturais conservadoras. É a história de uma jovem rebelde que encontra na música, na escrita e no cinema a sua fuga e sua paixão.

A ler

27.01.2021 | por Luana Loria

Pelas águas sagradas que nos curam: uma conversa com Milena Manfredini

Pelas águas sagradas que nos curam: uma conversa com Milena Manfredini Conversei com a realizadora sobre a sua criação cotidiana com o audiovisual até à sua relação pessoal com os cultos de matriz africana. As narrativas que permeiam a vida de Milena partem da Baixada Fluminense do Rio de Janeiro e desembocam no atlântico, fazendo parte das grandes confluências que têm sido os cinemas negros contemporâneos.

Afroscreen

25.01.2021 | por Marco Aurélio Correa e Milena Manfredini

Logística

Logística As discussões sobre a chamada revolução logística iniciada em meados do século XX exploram as continuidades entre a história da logística como arte militar e a sua história mais recente, enquanto meio de administrar o movimento de pessoas e coisas orientado pelo critério da eficiência económica, nos transportes e na comunicação. Nesta medida, o estudo da logística é ensombrado pela tese da militarização da sociedade.

Jogos Sem Fronteiras

25.01.2021 | por Sandro Mezzadra e Brett Neilson

“O Teatro Viriato ainda é um oásis no país”

“O Teatro Viriato ainda é um oásis no país” Sento-me em qualquer sítio e toda a gente tem uma história com o Teatro Viriato. O Teatro é da cidade. E, ainda assim, sentimos que há novos públicos, há novas energias, novas possibilidades. É isto que um teatro deve ser. É uma casa onde nos encontramos todos, vindos de não sei de onde. Com coisas em comum para partilhar mas também com coisas que nunca tínhamos visto antes. Por vezes incómodas.

Cara a cara

25.01.2021 | por Mariana Carneiro

“Dread inna Inglan”, notas sobre o episódio Lovers Rock

“Dread inna Inglan”, notas sobre o episódio Lovers Rock O Lover’s Rock contribuiu para mudar a percepção da música negra nos média britânicos. Apesar da sua origem transnacional, o Lover’s Rock é visto como um género distintamente britânico. De certa maneira, o Lover’s Rock foi o primeiro género musical pós-colonial a surgir no Reino Unido, ao qual se seguiram outros géneros internacionalmente conhecidos, como o Brit Funk, Acid House, Jungle, UK garage, Dubstep, Grime, ou o UK drill.

Afroscreen

21.01.2021 | por Marcos Cardão

A dignidade é uma substância tão real como a sua própria carne

A dignidade é uma substância tão real como a sua própria carne O trânsito entre duas temperaturas, dois movimentos musicais da atmosfera colados ao corpo. O frio recobre o calor, e o calor absorve o frio, como se fossem duas nuvens epidérmicas. É nesse diálogo, nesse duelo, que a casa se enche de significados imbatíveis. O lugar em que a temperatura somos nós, em que o frio se enche do calor da nossa paz, do nosso sono, da nossa tristeza, do cheiro da nossa fome. Lugar em que o calor desliza sobre os músculos arrefecidos, como uma melodia percorre o silêncio. O lugar a que todos deveriam ter direito no Inverno. Um lugar difícil de aquecer.

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19.01.2021 | por Brassalano Graça

O sal da História na memória da pele

O sal da História na memória da pele Não existe a Praia - Venho como um náufrago trago o sal da História na memória da pele, e espinhas nas pontas dos dedos, o mar não se repete, perscruto-o desde o útero, e escuto-o como o pulsar de um coração alteroso, germinado sob o pulmão de um céu forte, é nessa cintura do horizonte que fixei o tracejado do meu olhar sobre o Mundo, o Azul não é uma cor, é um filtro óptico para a absorção da atmosfera, e da poeira bacteriana nutriente dos ventos do Destino.

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19.01.2021 | por Brassalano Graça

Práticas de Alegoria Política

Práticas de Alegoria Política Que exemplos de solidariedade transnacional e de cruzamentos disciplinares podem inspirar a prática artística e curatorial contemporânea contra os ressurgimentos nacionalistas à escala global? Recordemos o impacto da Guernica (1937) de Picasso produzida durante a Guerra Civil Espanhola, um dos mais consagrados manifestos contra o fascismo e exemplo da “revolta da consciência e da arte face aos desastres que devastavam a Europa.” Guernica demonstra a importância da ação conjunta de atores estatais e não estatais no desarmamento da ideologia fascista. Que práticas de crítica e reflexão artística e que soluções locais e globais, podem as redes de arte contemporânea – artistas, curadores e instituições – promover para a desradicalização de extremistas e fomentar novas sensibilidades ancoradas na linguagem da igualdade e da não discriminação?

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16.01.2021 | por Sofia Lemos