Assim como o destas pessoas de Bantu, onde sete bailarinos, três moçambicanos e quatro portugueses, cinco homens e duas mulheres, quatro negros e três brancos, se juntaram para entrar em jogo. Vinham com as suas marcas, as suas histórias, os seus ritmos nos pés e na mente. Juntos experimentaram frases rítmicas, improvisaram muito, trocaram de papéis, desconstruíram o que achavam saber, impulsionaram a expressão de cada um e a de um coletivo que se reconfigura entre solos e gestos gregários. Tateando-se, libertando-se, individual e socialmente, os corpos brancos e negros contrastam mas afagam-se.
Palcos
22.01.2024 | por Marta Lança
As letras encapsulam as viagens da palavra:
experimental, preliminar,
que rompem o expectável,
que cobrem o fumo,
onde as palavras em jeito de humor,
sem pudor,
abrem novos caminhos do amar
e do ser amado
Mukanda
19.01.2024 | por Alice Neto de Sousa
Com quantas balas se apaga a trajetória e história de uma ou várias pessoas? Com quantas bombas se apaga a história de comunidades inteiras de centenas ou milhares de pessoas? Com quantos disparos se silenciam vozes que podiam contribuir para o nosso mundo de diversas formas? Saberá alguém quantificar o peso simbólico, psicológico, emocional, cultural da destruição?
A ler
19.01.2024 | por Leopoldina Fekayamãle
Na rua, a vender, tudo se partilhava. O que era de uma estava sob cuidado de todas as outras no mesmo espaço. Havia relações de confiança entre minha mãe e suas companheiras que chegaram a transcender o espaço da rua e perduram por anos. Essas mulheres emprestavam o pouco que tinham quando uma ou outra precisasse de ajuda, praticavam o Ubuntu mesmo sem conhecer a palavra: uma era porque as outras eram. Existiam em coletivo. A solidariedade entre essas mulheres não deixava de ser um ato político na medida em que, juntas, resistiam a um contexto sócio-histórico e político hostil, encontrando ferramentas conjuntas para a sua sobrevivência e das suas famílias.
Corpo
17.01.2024 | por Leopoldina Fekayamãle
Mas vão dizer isso aos habitantes de Marco de Canaveses que mudaram o nome do estádio do Avelino. Ou aos novos países africanos que atiraram para os museus as memórias do passado colonial que renegam. Ou vão dizê-lo aos australianos que criaram uma Comissão destinada a “descolonizar” a nomenclatura topográfica e urbanística racialmente ofensiva. E que já se puseram ao trabalho! É um trabalho pesado? Pois é. E mudar o nome (colonial) de um país mais pesado é. Mas faz-se. Mais pesado ainda seria ter de suportar pelos tempos fora a memória de um passado que oprime.
Cidade
12.01.2024 | por José Lima
A acção do livro é contemporânea ou quase, decorrendo durante o primeiro, e implora-se que último, mandato do Trump, enquanto presidente dos EUA. Em Money, no Mississipi começam a aparecer homens brancos linchados, acompanhados do cadáver de um homem negro, extremamente parecido com Emmett Till, que lhe segura os testículos arrancados. Não é apenas a extrema violência que marca os crimes. O homem negro, visível e comprovadamente morto, tende a desaparecer de uma cena do crime e a aparecer noutra.
A ler
12.01.2024 | por Pedro Goulão
O livro de Margarida Medeiros, ao propor o ensaio como método para uma ciência pública; ao forjar um léxico conceptual para análise do cinema e da fotografia, resgatando a arte como modo de conhecer (e não ilustração de teoria); e sobretudo ao defender implicitamente o animismo como ontologia reparadora, é um livro de uma actualidade pungente. É luto e é luta!
A ler
11.01.2024 | por Inês Beleza Barreiros
Em Angola já tivemos de tudo um pouco em matéria de violência contra a imprensa e os jornalistas, onde se incluem agressões policiais, detenções arbitrárias e ilegais, assassinatos e fogos-postos, mas ainda não tínhamos tido um caso do género e em plena luz do dia. Tudo aconteceu na sequência de uma providência cautelar decidida em finais de novembro do ano passado por um Tribunal de Luanda que foi chamado a arbitrar um conflito societário entre dois irmãos, o Álvaro Sobrinho e o Emanuel, também conhecidos pelos “Madalenos” que é o seu nome de família, em torno da posse da empresa que é, alegadamente, proprietária do Novo Jornal.
A ler
11.01.2024 | por Reginaldo Silva
A música ocupa um espaço na minha vida mas não do ponto de vista profissional, eu nunca seria uma profissional na música, já na educação e no desporto sim. São áreas que me estimulam muito, sinto-me bem, gosto de estar aqui com os jovens e estudantes, discutir com eles, como gosto de estar no desporto, são as relações humanas mais tocantes a que me prendo. Já a música é natural, eu cresci com a música, desde os meus avós, faz parte da minha vida como prazer e convívio.
Cara a cara
05.01.2024 | por Marta Lança
Pior, só a deriva direitista (aliás, é um rumo bem traçado e coerente no alinhamento) do estado de Cabo Verde no âmbito das relações internacionais. Agora fez-se luz sobre aquela parte desse documento redefinidor do posicionamento de Cabo Verde no âmbito das relações externas e que começava por dizer que Cabo Verde se definia ou regia por valores judaico-cristãos. Judaicos, sim, quando se põe do lado de um bárbaro, inumano e continuado morticínio, mas mui pouco ou nada cristãos na assunção do único absoluto, o inegociável valor da vida humana.
A ler
04.01.2024 | por José Luiz Tavares
Haverá quem ache que uma coisa (a esmola que a mão direita dá) redime de certo modo a outra (as vidas destruídas que a mão esquerda tira). E haverá também quem sinta o embaraço que tal dilema lhe impõe. E a que não pode escapar: no nome de uma rua, de uma praça, diante de uma estátua pública que não pode deixar de ver, não pode agora deixar de adivinhar a sombra daqueles milhares de vidas roubadas até aí ignoradas, que agora nos assombram, que, essas, não podemos já deixar de ver, tão presentes como as estátuas do Conde. Do negreiro beneficente.
A ler
01.01.2024 | por José Lima
Quadro “eu é que sou a mais negra”, trazendo ao de cima questões sobre o lugar de fala, sobre o direito (ou não) de reclamar para si a negritude quando a pele, à vista desarmada, não conta essa marca;
Quadro “é estrutural”, usando um saco de boxe, numa clara analogia ao cansaço do argumento que justifica tudo como “estrutural” e as vezes em que essa ideia iliba os indivíduos das suas responsabilidades no quotidiano;
Quadro “a solidão da mulher negra”, uma longa conversa – hilariante e profunda – sobre a constatação de que a maioria dos homens negros que alcançam algum poder (ou fama) acabam quase sempre por escolher mulheres brancas para suas companheiras;
Palcos
30.12.2023 | por Maria Lima / Daniela Lima
As peripécias de Ladislau Magyar têm respaldo nas consequências da inesperada proclamação da independência do Brasil, de 1822, que inflacionou o tráfico de escravos bantu forçando os esclavagistas ocidentais a apearem nas fontes de origem, numa altura em que o desenvolvimento das forças produtivas britânicas prescindia deste mercado, tendo frustrado as expectativas euro-internacionais com a promulgação do final do comércio esclavagista, de 1836. Tendo Portugal resistido até 1856, com paragem no sultão Nova Calabar, do Brasil, o explorador alcançou o estuário do Khongo em 1846, mas desembarcou em Benguela em 1848.
A ler
28.12.2023 | por Armindo Jaime Gomes
Tal como para Filomela privada de voz, poderíamos perguntar que outra hipótese haveria para uma história dos oprimidos que não esse movimento sem fim de tecer e destecer? Matana Roberts, que frequentemente se refere a si própria no plural, pode ser um nome desse movimento. Uma vez mais, um nome que não é bem um nome, mas um artifício. Tal como a história que escutamos nas faixas de Coin Coin não é bem uma história. É talvez uma manifestação do tempo do agora, o Jetztzeit de Benjamin, o instante que baralha a cronologia, aberto à escuta da experiência, e que pode, eventualmente, abrir uma hipótese de ruptura.
A ler
28.12.2023 | por Fernando Ramalho
O status quo nos leva a pensar que não estamos a ser capazes de resolver os nossos problemas. Nem capazes de materializar a justiça social nem permitir a efectivação das liberdades.
Neste contexto, a proposta de imaginarmos uma terceira via faz todo sentido. E nessa festa da imaginação, noutro livro, Mondlane, regresso ao futuro, Severino Ngoenha propõe o resgate do pensamento da figura considerada Arquitecto da Unidade Nacional, entre as possibilidades existentes. E porquê não, para uma terceira via?
A ler
28.12.2023 | por Leonel Matusse Jr.
Tal como os novos velhos políticos percebem que, para ascenderem, devem excitar a comunicação social esfomeada — enquanto regam com álcool as feridas das democracias. E a violência da guerra começa assim, não é? Quando nos viciamos nesse frenesim alucinante do sangue a esguichar a qualquer hora, em qualquer direcção.
Palcos
28.12.2023 | por Francisco Mouta Rúbio
Se o cuidado que um rio manifesta ao mundo for retribuído, poderá viver uma vida longa e saudável. Ao longo da sua vida, o rio vê coisas, aprende coisas e transmite o seu conhecimento a quem quiser ouvir. A história de um rio é também a nossa história; a música que canta também é a nossa. Poderíamos dizer que o passado de um rio é uma lente para o nosso futuro e que a morte de um rio prenuncia a nossa própria morte.
Mukanda
23.12.2023 | por Imani Jacqueline Brown
Se, entre os séculos XV e XIX, Portugal foi um dos principais países esclavagistas, perguntamos com espanto: porque é que só agora ainda não foi edificado o Memorial de Homenagem às Pessoas Escravizadas? Esta ausência dá pistas para se questionar o modo como o país lida com o passado e como tal passado ecoa no racismo sistémico de hoje. A acontecer, a sua concretização vem ainda assinalar um momento em que se está a pensar e a ressignificar a memorialística imperial, aspirando a uma cidade onde todos se sintam representados na capital do país e de um antigo império.
Cidade
22.12.2023 | por Marta Lança
A Lisboa viva das coletividades e das associações, onde uma comunidade solidária e vizinha se reunia para jogar, brincar, cantar, comer e beber, musicar, politizar e conversar, foi transformada em apartamentos de luxo, hotéis ditos de charme, residências para alojamento chamado local, mas que expulsa os locais, ou simplesmente ruínas à espera de um investidor-ainda-melhor-do-que-os-outros.
Cidade
21.12.2023 | por Carla Baptista
Ai noites de Assomada
dos prantos em Fundura
suplicando pelas almas redivivas
pelas vozes exuberantes nos jardins
da Praça Estrela na Praça Camões
na Praça do Rossio na Praça Figueira
no Largo Martim Moniz no bairro da Mouraria
no bairro da Alfama nas colinas da Graça
no Canecão no Conde Barão no Lontra
no Coquenote no Cave Adão
no Monte-Cara lá na Dedês
na Casa de Cabo Verde...
Mukanda
19.12.2023 | por José Luís Hopffer Almada