Esta história ficcional da autoria de Lídia Jorge, passada no Algarve durante o boom imobiliário dos anos 90, agora tornada filme, aborda várias dimensões da realidade portuguesa contemporânea: o desengano pós-revolucionário, a imigração cabo-verdiana, a herança colonialista e o racismo. 50 anos decorridos da Revolução dos Cravos, e num momento político em que os valores democráticos estão constantemente a ser postos à prova, este filme convida a uma reflexão sobre o discurso de Portugal como uma sociedade não racista e sobre o imperativo de respeitar todos os seres humanos independentemente das suas diferenças, quaisquer que elas sejam.
Afroscreen
12.06.2024 | por Patrícia Martinho Ferreira e Laura Caballero Rabanal
Há um traço ancestral latente na articulação do gesto utópico, e no movimento vital desse gesto. Uma estória sobre começos, e sobre fins sempre presentes. Uma conversa, implícita e antiga, com todos os passados que nem como história, subsistem, não tendo sobrevivido aos protocolos de transliteração. Uma faísca anímica, sumiça – a da cedência de controlo sobre o cálculo de probabilidades que constitui o real enquanto tal. Algo movido pelo convívio com a perda, que a traz e carrega consigo – com raiva, orgulho, curiosidade, e carinho.
A ler
12.06.2024 | por Salomé Honório
Documentário forte que não só documenta as dificuldades enfrentadas pelos imigrantes em Barcelona, mas também desafia os espectadores a reconsiderar suas percepções e atitudes em relação à imigração e às políticas sociais, falta muita empatia no mundo e nos dias que vivemos.
Afroscreen
10.06.2024 | por Mariana Ribeiro Mota
Grande parte deste livro foi editado precisamente de “cabeça para baixo”, em Joanesburgo, onde tenho passado algumas temporadas, num novo desafio académico. Isto fez-me pensar na convenção de que no hemisfério norte as pessoas estão “em cima”, enquanto no sul tudo parece acontecer “ao revés”. A verdade é que, como sabemos, segundo as leis da gravidade deste planeta esférico, ninguém está “de pernas para o ar”. Esta constatação é óbvia e factual do ponto de vista da física, mas está longe de ser evidente para todos. O livro apresenta algumas destas evidências.
Cidade
08.06.2024 | por Marta Lança e Paulo Moreira
Sob a pele dos protagonistas Cartola e Aquiles vemo-nos de forma frontal com a experiência de sujeitos que continuam a habitar o território do não pertencer, a despeito de suas presenças já contarem com cinco séculos de existência em Portugal. O texto literário da escritora Djaimilia Almeida ilustra esses limites relacionados à pertença e a complexidade de construir uma subjetividade a partir dos trânsitos, deslocamentos e do não pertencimento.
A ler
06.06.2024 | por Liz Almeida
O país viveu numa situação de ditadura monopartidária assumida nos seus primeiros 17 anos, que também ficou conhecida no discurso oficial com o pomposo nome de “ditadura democrática revolucionária”. Lamentavelmente, a situação prolonga-se até aos dias de hoje embora já com algumas diferenças na sua fachada constitucional e institucional com a existência formal de um regime multipartidário que não alterou, contudo, a natureza do poder absoluto que governa o país com os mesmos vícios de sempre não obstante todo o rejuvenescimento que, a olhos vistos, a elite no poder tem conhecido.
A ler
06.06.2024 | por Reginaldo Silva
A situação atual de África é ainda marcada pelo neocolonialismo. Na maior parte dos países, as nossas elites governantes, monopolizando todos os privilégios, voltaram as costas às realidades nacionais e fixaram os olhos nas antigas metrópoles em busca dos seus serviços, traindo os princípios de liberdade e da soberania do povo, que oprimem quotidianamente, censurando-o, empobrecendo-o, tribalizando-o.
Mukanda
25.05.2024 | por vários
Estos hombres son los que han sido arrancados a la fuerza, llevados contra su voluntad a una cruzada forzada, atados como prisioneros y esclavos. Como observó Cornado (2018), Saramago crea una perspectiva más humana de la Historia, mostrando que esta masa de anónimos también hace parte de los relatos históricos. Y que, por lo tanto, también contribuyeron y hacen parte de la memoria de Portugal, por eso sus historias son narradas desde la seriedad, desde la humanidad y del compromiso, demostrándonos la sensibilidad y la empatía de quien escribe.
A ler
24.05.2024 | por Lorena Leites Rodriguez
Diria que isto, pelo menos, é certo: tudo passa, em Portugal, pelo 25 de Abril. Se o querem desinscrever, cabe a nós o reinscrevermos. Mas, desta vez, finalmente, inscrevendo no 25 de Abril “o país da não-inscrição”, onde também habitam, com a sua Praça do Império, os espectros do extenso e complexo trilho da “presença histórica de Portugal no mundo” (e não serão eles que têm estômago para "antropofagizar" Salazar?). O que se confirma, por outras palavras, é a conclusão geral do Morte e Democracia de José Gil (2023): entramos na era da “espectrologia política”.
A ler
22.05.2024 | por Filipe Ferreira
Toda a exposição resulta de um processo colaborativo. “Grande parte do que está exposto foi feito com a participação das pessoas que generosamente retiraram as fotografias das suas casas para as partilharem connosco”, prossegue. “São pessoas não usam a criatividade no sentido de não terem resultados materiais no seu trabalho, como têm os escritores e os artistas no espaço público, mas que também aqui fizeram, de alguma forma, um trabalho criativo falando sobre as fotografias”.
Vou lá visitar
20.05.2024 | por Mariana Moniz
Em Pérola sem rapariga, os tais largos minutos mudos são, pois, o tempo de uma desfaçatez em que se esborrata a pintura. Recusa-se, primeiro, num frémito, a fixação do rosto, e logo se reencenam as obras-primas do costume: Meisje met de parel, Vermeer; Les demoiselles d’Avignon, Picasso; Las meninas, Velásquez. Os nomes que lembramos são os deles, delas nada sabemos, ficaram-nos os títulos. Talvez por isso, imagino, Filipa e Sara desmancham a pose. Dizem-lhes para não mostrarem os dentes, e elas riem muito. Virá a libertação de um riso nu, despudorado? Urge, afinal, esconjurar o gesto venatório de quem mira, e entreabrir intervalos na ordem dos dias.
Palcos
20.05.2024 | por Inês Galvão
Mais do que criar vídeo musicais, o kuduro visual seria o ousado ato de produzir imagens capazes de interferir com a história de arte. A história de arte que nunca nos foi contada, ou da qual fomos sistematicamente excluídos. Recorrendo à espontaneidade, ao improviso e à rebeldia do kuduro, o artista conquistaria assim o seu lugar ao sol, confrontando todo o sistema hierárquico e conservador da cena artística. Pois, a meu ver, a arte só cumpre o seu verdadeiro papel quando consegue criar rupturas.
Vou lá visitar
17.05.2024 | por Kiluanji Kia Henda
O luto pode ensinar-nos a viver em liberdade. Esta peça convida-nos a tomar a decisão.
Em doze inspirações, que poderiam ser atos poéticos, o público é convidado a respirar palavras e silêncios, espelhos e espaços, dor e busca, encontro e tempo. O espetáculo passa-se todo numa sala, a atriz parece-nos tão próxima que podia ser qualquer um que entra e fica na sala. Ao mesmo tempo, parece-nos tão distante que nos desperta a memória do que todos temos medo de viver. A ausência.
Palcos
16.05.2024 | por Joana Morais e Castro
Identificar um tema consensual para, em Angola, se debater o estado da liberdade de imprensa está muito longe de ser um desafio fácil de ultrapassar pela polarização existente, mas não deixa de ser uma orientação pertinente que podia conduzir-nos a uma outra reflexão sobre o país real nesta data em que existe uma predisposição maior para este tipo de levantamento. A título de sugestão, este consenso até poderia ser tentado no próprio parlamento com a realização de uma plenária anual consagrada exclusivamente ao estado da liberdade de imprensa no país tendo como referência um tópico mais específico.
A ler
14.05.2024 | por Reginaldo Silva
Estou muito contente pela opção que fiz porque ensino literatura, estudos literários e estudos pós-coloniais, que são áreas de grandes questionamentos. Eu não gosto do saber “congelado” ou do saber que não se discute. Não gosto de ideias dogmáticas. Gosto de discutir ideias, considero que existe sempre outra forma de ver o mundo, particularmente na área das humanidades e das ciências sociais, que não são ciências exatas.
Cara a cara
14.05.2024 | por Nélida Brito
No Haiti, as histórias folclóricas e a sabedoria popular passam de boca em boca. Ao final da tarde, quando o sol se acalma e as ruas se enchem de vizinhos, é hora do kont ou de jogar ao krik-krak. No país em convulsão, a tradição oral tão antiga como o mais antigo ancestral marca a pauta dos valores coletivos e da identidade.
A ler
13.05.2024 | por Pedro Cardoso
Com 46 anos, Toy Boy acompanhou as várias fases do país no pós-independência e iniciou atividade artística no pós-guerra civil. O seu trabalho é a expressão da vivência na cidade de Luanda, intrinsecamente ligado ao sofrimento e criatividade que se sente nas ruas. Sintonizado com os movimentos e núcleos artísticos da cidade (como o Elinga Teatro e o Fuckin’ Globo), Toy Boy conta-nos o seu percurso com a sinceridade e a sensibilidade que o caracterizam. Driblando as dificuldades no seu caminho e a exigência da sobrevivência, apropria-se de uma certa pop art, fazendo colagens ou ready-mades, instalações, potenciando materiais reciclados como a ferrugem, mas sobretudo dá corpo e voz às singularidades da vida urbana.
Cara a cara
12.05.2024 | por Marta Lança
E de repente eclodiu o 25 de Abril de 1974, considerado pelo Nhonhô numa entrevista à RTC (Radio-Televisão de Cabo Verde) sobre o seu percurso de vida como “uma autêntica revolução”. E de facto foi a festa infinita que começou com a caça aos informadores e agentes da PIDE/DGS na cidade da Praia, a queima das respectivas viaturas e/ou seu despenhamento no mar a partir do Cruzeiro do Platô, actos nos quais o Nhonhô e os seus amigos estudantes da Assomada residentes na cidade-capital da colónia/província ultramarina portuguesa participaram activamente e continuou com o lançamento de panfletos políticos na vila da Assomada dirigidos aos militares aquartelados no antigo edifício da SAGA e para o qual fui mobilizado pelo Betinho de Nho Bebeto-Alberto Lopes Barbosa, Júnior (sendo essa a primeira acção política, ademais clandestina, de toda a minha vida, depois muito marcada pela intervenção política e cívica, se bem que em larga medida fora do quadro político-partidário), e, logo depois, com a libertação dos presos políticos do Tarrafal, prosseguindo com os frequentes comícios, reuniões, sessões de esclarecimento e manifestações, os saraus culturais e as muitas e acaloradas discussões políticas, nas quais nós, adolescentes, também nos envolvíamos entusiástica e freneticamente.
A ler
10.05.2024 | por José Luís Hopffer Almada
como outros nacionalistas africanos / tais os muito seviciados os muito aliciados / cem presidiários políticos guineenses / como outros emboscados como outros /rebuscados como outros mortificados / patriotas negros mulatos e brancos / dilacerados em diferendos vários / tais os cento e seis prisioneiros / e condenados políticos angolanos
Mukanda
08.05.2024 | por José Luís Hopffer Almada
A premissa inicial para a construção de 'A Flor do Buriti' era refletir sobre a relação dos Krahô com a terra que habitam, num contexto que continua a ser colonialista, opressor e violento, mas esta foi expandida por um escrutínio da representação feminina na comunidade e nas formas de luta que se impunham pelo agravamento das ofensivas, nos anos em que o filme foi rodado: um período especialmente duro para os povos indígenas devido à pandemia de Covid-19 e ao governo de extrema-direita bolsonarista. Sob estas circunstâncias, a resistência teve que ser, necessariamente, reforçada.
Afroscreen
07.05.2024 | por Anabela Roque