Terra Batida, de 15 a 27 novembro - Festival Alkantara
Apresentação da rede e lançamento Jornal Mapa
15.11.2020
Terra Batida é uma rede de pessoas, práticas e saberes em disputa com formas de violência ecológica e políticas de abandono iniciada por Marta Lança e Rita Natálio. O conhecimento singular e local de conflitos socioambientais, aliado à ação em rede, convocam resistência aos abusos extrativos e também pedem cuidado: para especular e fabular, para construir visões e vivências sensoriais entre mundos exauridos e exaustos.
Em 2020, Terra Batida enreda intervenientes das áreas da dança, cinema, performance e artes visuais com cientistas, cooperativas e ativistas com residências nas regiões de Ourique, Castro Verde, Montemor-o-Novo, Aveiro, Ílhavo e Gafanha da Nazaré. Estas residências acompanham contextos específicos para pensar e operar em múltiplas escalas locais, globais e multiespecíficas. Na região alentejana, discute-se desertificação, agricultura superintensiva e a concomitante extração de trabalho migrante, assim como minas desativadas e tóxicas, mares de estufas litorais, a falta de água e de gente, a conservação de espécies, formas de resistência comunitária e a leitura da paisagem segundo o seu povoamento; na região de Aveiro, problematiza-se a erosão acelerada da linha costeira, o tráfego portuário, a subida do nível dos mares e o desaparecimento da ria, garante da biodiversidade e da captação de carbono. Todos estes problemas evidenciam matéria de conflitos sociais, raciais e interespécie, contestando identidades e fronteiras, assim como o centrismo de certos problemas ecológicos a partir da mera contabilidade de vantagens/desvantagens para comunidades humanas.
Ao longo do Alkantara Festival 2020, a rede Terra Batida propõe um conjunto de momentos para partilha de performances, pesquisas e encontros no São Luiz Teatro Municipal.
Neste encontro, participantes das residências da rede Terra Batida falam das suas pesquisas, dúvidas e impasses, Apresenta-se ainda, com o arqueólogo e jornalista Samuel Melro, o número especial do Jornal Mapa feito em colaboração com a rede Terra Batida.
Jornal Mapa
O Mapa é um projeto de comunicação mas também um território de resistência em tempos de guerra. Através da informação, debate e discussão, propõe-se a desenvolver a crítica enquanto alimento do pensamento e de práticas de autonomia e liberdade em todos os aspetos da vida. Não está contido na zona de influência de grupos económicos ou partidos políticos de qualquer cor ou sabor. Mapa publica notícias, reportagens, investigações, crónicas, fotos, ilustrações, banda desenhada, com um olhar atento aos problemas ambientais em territórios próximos e mundiais.
Joana Levi - Rasante
16.11 — 17.11 2020
A partir de um olhar sobre processos de migração, extinção e conservação de aves — propiciado pelas residências do projeto Terra Batida no Alentejo — Joana Levi apresenta Rasante, uma performance-em-processo que se desenrola como uma fábula meditada ou uma meditação fabulada, colocando em jogo perspectivas e conflitos interespécies. Neste jogo, o sedimento das fronteiras hierárquicas estabelecidas entre “Humano” e “Animal” aparece como máquina replicadora de relações coloniais, racionalistas, supremacistas que não cessam de entulhar e aterrar o presente do futuro.
Sílvia das Fadas (com Francisco Janes) - Luz, Clarão, Fulgor
19.11 2020
Luz, Clarão, Fulgor — Augúrios para um Enquadramento Não Hierárquico e Venturoso é um filme que se acende no rastilho do anarquista António Gonçalves Correia e das suas experiências comunais – primeiro, a Comuna da Luz em Vale de Santiago/Odemira (1917-18), e depois a Comuna Clarão, em Albarraque/Sintra (1926). Ao metamorfosear-se em diferentes iterações, antecipa o fulgor de uma desierarquização do olhar e uma pedagogia da terra e da convivialidade na bio-região alentejana.
“Procuramos por augúrios enquanto observamos teimosamente as ruínas de uma comuna. Por exemplo: ‘clima favorável aos errantes’. Caminhamos através dos tempos, registando erraticamente imagens e sons através da espacialidade caleidoscópica do Alentejo, uma região com nome de rio, para além de um rio. Como caminhar oferece encontros inesperados e copresenças, missivas são enviadas de e para as margens. Por exemplo: ‘cultivar órgãos para a alternativa’. Os nossos sentidos são parciais, precários e fragmentários, mas não a nossa orientação: trava-se uma luta quotidiana pelo fulgor e queremos fazer parte dela. Contra um firmamento de desapropriação de terras, corpos e laços sociais, estamos a preparar-nos. Por exemplo: ‘De nível!’ O fulgor é móvel, a comunidade prefigurada é dispersa e diversa. Através de dissenso e associações de afinidade, autonomia e reencantamento, a oferenda do cinema traz em si a potência para florescermos livres de imposições hierárquicas.”
Maria Lúcia Cruz Correia e Vera Mantero - JURISPLÂNCTON
23.11 — 24.11 2020
“Em 2019 o FMI afirmou ter descoberto nas baleias a solução para o excesso de dióxido de carbono na atmosfera. As baleias podem salvar-nos do aquecimento global! Uh, bom, mas, hmm, isso só acontecerá SE os números de baleias nos oceanos voltarem ao que eram antes de as caçarmos intensivamente, pelo menos nos últimos 150 anos… É um grande SE… Conseguiremos convencer as baleias a entrarem num regime de reprodução frenética o mais rapidamente possível para nos salvarem?… Salvar-nos a nós, que as fizemos em fanicos?… Como convencê-las?…”
Neste evento, Maria Lúcia Cruz Correia e Vera Mantero partilham uma pesquisa, num formato performance- debate. Procuram estimular uma consciência em torno de uma ecologia interior e coletiva, a perceção do que são crimes ambientais e a função dos direitos da natureza. São propostos diálogos entre especialistas, juristas, activistas, artistas, guardiões da natureza e a própria natureza. O formato vai ser estranho como o fundo do mar, envolvendo justiça restaurativa, performance, sexo entre baleias, rituais, participação, silêncio e um contrato com o mar.
NOTA: Devido às medidas COVID-19 aplicadas em Portugal e Bélgica, Maria Lúcia Cruz Correia não poderá estar presente ao vivo. Como alternativa, a artista estará presente por videoconferência. A sua proposta enquadra-se num processo maior de pesquisa a decorrer na continuação do projecto Terra Batida e que resultará numa peça performativa de Maria Lúcia Cruz Correia em 2021.
As apresentações contam com a presença da jurista Maria Inês Gameiro e da curadora e pesquisadora Margarida Mendes.
23 nov - Maria Inês Gameiro
24 nov - Margarida Mendes
Ana Rita Teodoro - Leitura de Seres Vegetais
20.11 2020
“Dreams often fail for lack of inspired interpreters.” Yemisi Aribisala
Para onde escoa o encantamento da terra e da paisagem? Onde se fixou a imagem do deserto? Tendemos para uma visão opaca e monocultural? Onde se religa alimento e afeto? É preciso contar outras histórias, é preciso deixar outros seres falarem.
Leitura de seres vegetais: oráculos para o reencantamento da terra é uma proposta em forma de oráculo, onde uma pergunta lhe é colocada. O objetivo não se concentra na adivinhação do futuro, mas na observação atenta da soberania do ser vegetal, que é a sua forma, cor, textura, sabor, cheiro… Procurando por via da conversa e da especulação colectiva resgatar do vegetal, possíveis respostas ou novas perspetivas às nossas perguntas.
A proposta enquadra-se num processo maior de pesquisa, experimentação e conexão a decorrer na continuação da rede Terra Batida — uma rede de pessoas, práticas e saberes em disputa com formas de violência ecológica e políticas de abandono — e que resultará numa peça performativa em 2021. Dentro deste projeto, Ana Rita Teodoro participou numa residência em torno das questões da “terra” no Baixo Alentejo (Ourique, Mértola e Castro Verde). Todos os eventos do Terra Batida no Alkantara Festival são de entrada livre.
O seu foco de interesse situa-se na degradação dos afetos, humanos e não-humanos, associados à paisagem e cultura alentejana. Uma degradação que encontra causa (entre outras) na descaracterização da paisagem alentejana e da sua diversidade pela propagação de monoculturas intensivas e super intensivas - paisagens puramente económicas que beneficiam apenas alguns poucos-ricos.
A partilha desta pesquisa será seguida de uma conversa com a investigadora Teresa Castro, em torno da vegetalidade e alimentação.
Rita Natálio - Fóssil
26.11 — 27.11 2020
Fóssil é a continuação da série de performances-conferência de Rita Natálio iniciadas com Antropocenas (2017, colaboração com João dos Santos Martins) e Geofagia (2018).
Se a figura do zombie foi central para entender o funcionamento do capitalismo e do conceito de biopolítica no século XX, a figura do fóssil - o que é extraído da terra e o que acumula tempo ou história - convida hoje a pensar sobre a crise generalizada que muitas pessoas têm chamado de Antropoceno. Aqui se constrói um fóssil do extrativismo contemporâneo, refletindo sobre como a geologia e os processos que ocorrem “dentro da terra” estão inscritos e se inscrevem na história humana.
Um livro-performance onde a linguagem atravessa diferentes escalas e se expõe à sabotagem.
Fóssil convive com uma série de trabalhos do artista visual Hugo Canoilas e propõe conversas após a performance com João Prates Ruivo, Greve Climática Estudantil e Climáximo.
26 de novembro João Prates Ruivo - “Solos Antropogênicos: fabulando um Instituto dos Solos em Portugal”
27 de novembro Greve Climática Estudantil e Climáximo
Marta Lança - Superintensiva
16.11 — 17.11 2020
Atravessemos um olival de vários tons e intensidades. Este percurso começou a ganhar forma na minha cabeça quando procurava qualidade de vida, isto é, ar e espaço, para criar uma criança. Num monte de cultura de sequeiro, as flores silvestres brotam dentro e fora do murinho de pedra-sobre-pedra. Ourique, capital do porco preto e seus lagartos, secretos, plumas e bochechas. No caminho de carro, vejo estacas branquinhas alinhadas ao estilo cemitério americano. Passados uns meses, sebe-oliveiras atrofiadas no tamanho e na copa, de produção precoce, assistida por herbicidas e agroquímicos. Fecho os vidros ao fumo pestilento do bagaço de azeitona, imagino as partículas tóxicas nas linhas de água, na roupa, nas paredes, nos pulmões. Contrária ao ar contaminado e ao tempo que esboroa, a resiliência da oliveira, guardiã de línguas proféticas e do Mediterrâneo, madrinha dos nossos refugados. Procuro tecer familiaridade, vestígio e estranhamento, numa paisagem de experimentação política, onde há séculos se resiste à pobreza, seca, despovoamento e exploração.
Performance apresentada no contexto do projeto Terra Batida. Marta Lança participou nas várias etapas de residência no Alentejo e em Ílhavo. Este trabalho proveio muito da estadia em Ourique onde se abordou o modelo superintensivo de plantação.
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Datas e Horários
15.11 2020 - 16H | Evento online via zoom
16.11 — 17.11 2020 - 19:30H | Teatro São Luiz - Sala Mário Viegas
16.11 — 17.11 2020 - 19:30H | Teatro São Luiz - Sala Mário Viegas
19.11 2020 - 19H | Teatro São Luiz - Sala Mário Viegas
20.11 2020 - 19H | Teatro São Luiz - Sala Bernardo Sassetti
23.11 — 24.11 2020 - 19H | Teatro São Luiz - Sala Mário Viegas
26.11 — 27.11 2020 - 18:30H | Teatro São Luiz - Sala Bernardo Sassetti
Terra Batida é um evento gratuito mediante levantamento de bilhete.
Para mais informações consulte Alkantara Festival.