Apresento a tradução de três cartas/ensaios de Walid Daqqah – que, como todos os seus textos, tiveram de ser libertados da prisão antes de chegarem ao público. Quero, com isso, partilhar um pequeno fragmento da obra do revolucionário palestiniano em português, estando ciente de que o ato de tradução implica transformação. Contudo, como o entendo, essa não é apenas uma transformação do texto, mas também de quem o lê e tem de se libertar das amarras coloniais para o compreender. Se Daqqah imagina e põe em prática a libertação da Palestina nós não podemos apenas ler o texto, mas somos obrigados a imaginar com ele e convidados a agir com ele.
Mukanda
03.08.2024 | por Bruno Costa
Esta visão estrutural da política e da ecologia constitui a lente a partir da qual estas jovens olham e agem sobre as causas locais. Como exemplos, entre os repetidos protestos contra a exploração de combustíveis fósseis, em maio de 2023, as jovens da GCE, em conjunto com outros coletivos, juntaram-se a uma ação de desobediência civil para impedir a chegada de um novo carregamento de gás ao Terminal de Gás Liquefeito do Porto de Sines. Divididas em quatro grupos, as manifestantes conseguiram bloquear, durante sete horas, diversos pontos de acesso ao Terminal e adiar a chegada de gás para a madrugada do dia seguinte.
Jogos Sem Fronteiras
31.07.2024 | por Catarina Leal
'Análise de Alguns Tipos de Resistência' reúne um conjunto de intervenções de Amílcar Cabral, um dos fundadores e líder histórico do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC). Tiveram lugar num seminário de formação de quadros do PAIGC, decorrido entre 19 e 24 de Novembro de 1969 na sede desse partido, em Conacri, cidade capital da República da Guiné (também conhecida como Guiné-Conacri).
A ler
31.07.2024 | por Inês Galvão, José Neves e Rui Lopes
Durante os anos 90, o nosso imaginário da globalização inspirou-se frequentemente na paisagem urbana das grandes capitais ocidentais, mas o mundo de Amílcar Cabral oferece-nos uma visão diferente, onde têm lugar imagens da frente ribeirinha de Xangai, da vista panorâmica de Alger ou das ruas de Moscovo. Uma visão onde as próprias cidades icónicas da globalização celebradas no final dos anos 90 pela cultura política liberal revelam novos sentidos, como é o caso de Nova Iorque, com o seu bairro de Harlem, que uma e outra vez acolheu Fidel Castro e os seus discursos em que citava a palavra de Amílcar Cabral.
Mukanda
28.07.2024 | por José Neves, Victor Barros e Rui Lopes
5 Espaços é um desses raríssimos livros de estreia sem um verso bambo, frouxo, ou uma palavra a menos, revelador de uma poderosíssima voz pessoal, visceralmente radical, sem dívidas nem epígonos, geradora de vocabulários inaugurais, de uma atentíssima e exaustivamente trabalhada oficina poética na consumação de uma linguagem que se não conturba, criadora da sua própria tradição, cuja fulguração só encontro paralelo entre as suas coetâneas Luiza Neto Jorge (1939-1989) e Maria Velho da Costa (1938-2020) de Da Rosa Fixa e Corpo Verde, o que há-de querer dizer alguma coisa num mundo de desatenções fulminantes e videirinhas celebrações impantes da mediocridade vigente e ululante.
A ler
26.07.2024 | por Zetho Cunha Gonçalves
As Universidades de Portugal cobram 5 vezes mais o valor de mensalidades para imigrantes brasileiros. O desconto em medicamentos não existe, mas pagamos os mesmos impostos. Eu já vendi todas as câmeras que trouxe do Brasil e comprei este moleskine em promoção por 5 euros na FNAC. (...) Ou achas que me esqueci dos longos anos na fila da Alfândega? O meu algoz chamava Joana.
Ela coordenava aquele purgatório melhor que Bosch o pintava. Checa-se bagagem, celular, documentos, repete-se perguntas e religiosamente julga-se. Quem checa a história é meu estômago.
Vou lá visitar
25.07.2024 | por
Mais do que uma crítica à desumanização da sociedade capitalista, o texto de Lautréamont mostra como o capitalismo tornou impossível imaginar outro homem que não o homem – para mantermos os mesmos termos – desumanizado. Do que se trataria, então, seria de abandonar a quimera da humanização e de lançar a guerra ao homem, tal como ao seu Criador, à sua cultura, à sua sociedade, à sua poesia. E onde ele, justamente, encontra um potencial mais elevado de exponenciar essa guerra é nos elementos desumanizados, monstruosos, degenerados.
A ler
21.07.2024 | por Fernando Ramalho
Djam Neguin tem investido na criação de imaginários afrofuturistas, onde a africanidade é vista em suas potências futurísticas. Com Ka Bu Skeci Tradison iniciou uma fase de contribuição para imaginários afrocentrados, celebrando corpos e identidades diversas. "Incorporar perspectivas queer amplia a representatividade e subverte narrativas tradicionais, moldando percepções e atitudes", explica o artista que trabalhou sonoridades do continente africano como afrobeat, afropop e amapiano. Autofagias emerge como um manifesto de transformação pessoal e coletiva, celebrando a diversidade e a inovação. Basta para isso colocar os auriculares e deixar-se guiar pelo canto de esperança que surgiu de um tempo de grande aflição.
Palcos
20.07.2024 | por André Soares
O lastro nefasto da política de destruição da floresta amazónica que ignora os seres que a habitam, humanos e não-humanos perdura no tempo. Em determinado momento da viagem, o realizador regista uma conversa entre os indigenistas Candor e Pereira sobre o processo traumático vivido pela população indígena, durante o regime da ditadura militar (1964 – 1985). Jair recorda que em tempos do Plano de Integração Nacional da Amazónia “o contato era mal feito” e Pereira recorda a lógica de então: “Amansa [os indígenas] que lá vai a estrada! Amansa que lá vem não sei o quê…”.
Afroscreen
08.07.2024 | por Anabela Roque
A sentença do Tribunal apresenta-nos outra explicação – a meu ver – desconcertante. A resistência de Cláudia Simões e a reação das pessoas que viram a ocorrência na paragem de autocarro teriam sido de tal forma desestabilizadoras que, em jeito de “descompressão”, Carlos Canha agride violentamente aqueles dois homens. Se a tese da “descompressão” não permite ilibar, ela aligeira a dimensão moral dos atos do agente. Descontrolou-se, agiu sem verdadeira intenção, sem premeditação, “descomprimiu”.
A ler
03.07.2024 | por Cristina Roldão
Fausto de cabelo azeviche viola debaixo do braço, generosidade sempre pronta ao tratar o alheio macio por natureza, tranquilo com um sorriso que resolvia parte das macas, era uma figura que se destacava por incrível que pareça pela sua discrição com a música a tiracolo sempre!
Palcos
03.07.2024 | por Isabel Baptista
Desde o início do século XX foram articuladas formulações sobre a identidade negra na Europa, Estados Unidos e África. Do Pan-africanismo ao New Negro Movement, da Negritude ao Renascimento de Harlem, do projeto Back-to-Africa de Marcus Garvey, ao Rastafari e Black Power, para lá de outros. Pitts faz breves incursões a estes movimentos no seu itinerário de Paris, Amsterdão, Moscovo, Berlim e Estocolmo. O desdobramento e esmiuçar do termo Afropeu é para além dos encontros fortuitos com migrantes negros e de outras etnias, uma viagem de aprendizagem sobre os possíveis significados de uma identidade negra neste começo de século e as suas múltiplas heranças provenientes da literatura e do meio artístico.
A ler
01.07.2024 | por Aida Gomes
Na semana passada, o presidente da Bolívia parou em seco uma tentativa de golpe de Estado. À porta do Palácio Queimado, dedo em riste, Luís Arce disparou um “não vou permitir esta insubordinação!” ao recém-destituído (e agora golpista) comandante das Forças Armadas Bolivianas. Com a economia em picada, uma reserva de lítio apetecível e um braço-de-ferro entre o atual presidente e o eterno Evo Morales, o golpe falhado em La Paz levanta mais dúvidas que respostas. A começar por: foi real?
Jogos Sem Fronteiras
01.07.2024 | por Pedro Cardoso
Este ano é na roça e não na cidade que se dá o primeiro passo da Bienal, a roça onde tudo começou, Água Izé. A história da roça de Água Izé é a história de tantas outras roças, a história que começa com a ocupação colonial das terras, a plantação, a explosão das roças por toda a paisagem das ilhas, a exploração de pessoas e do solo, a história que culmina na independência, no fim do chicote, na nacionalização das roças, e por fim na sua distribuição a privados nos anos 90.
Vou lá visitar
30.06.2024 | por João Moreira da Silva
Durante o tempo que corria lento, shelter-in-place, fui mergulhando nos universos que estas duas mulheres traziam para mim. Nunca mais parei. Quando comecei a escrever este texto, tinha a forte sensação de que haveria algo mais a ligar estas duas mulheres do que a sua força e uma necessidade de construir narrativas quase tão intensa quanto a sua necessidade de destruir outras (narrativas). Entre o luto da minha cadela e uma busca voraz de futuro que me levou a mergulhar de cabeça na tradução do texto Positive Obsession/Obsessão Positiva, de Butler, descobri esta ligação. O que se segue é a história desta descoberta.
Corpo
27.06.2024 | por Patrícia Azevedo da Silva
Quem escreve em língua cabo-verdiana, por ponderada e consciente decisão cultural e identitária, por ser esse o meio através do qual melhor se sente, cria ou se exprime, ou ainda por qualquer secreta ou inconfessável tara, mesmo que só por simples briu di korpu o kabesa ka bale, e não por refúgio ou como muleta, por não dominar convenientemente outra língua, já chegou exatamente onde queria chegar.
A ler
27.06.2024 | por José Luiz Tavares
Eu que vou ter de comer umas duas colheres desta papa antes de ir dormir, porque conheço a fome. A fome vence o sono. Lá pela madrugada, depois da fome instalar o seu governo dentro de nós, é um inferno total. Só quem já experimentou esta situação sabe do que estou à falar. A fome é implacável, a fome não perdoa, causa uma dor de cabeça que só Deus sabe, algo rói o estômago como uma gadanha arrastando o capim, a cabeça fica uôlo uôlô, as pernas ficam bambas, os olhos ficam viano, viano. É o fim! Vemos cada coisa estranhas. Parece que nos encontramos com a morte.
Palcos
24.06.2024 | por Pedro Sequeira de Carvalho
As últimas décadas assistiram a um regresso dos lobos às serras portuguesas, onde o trabalho da conservação vai tomando o lugar de uma oposição ancestral, ao mesmo tempo material e simbólica. Com conceção e direção artística de Bruno Caracol, Ver como um lobo parte da relação entre corpos de lobos e corpos humanos, dos usos dados pela medicina popular a órgãos de lobos (goelas, olhos, ossos) conservados, das imagens das caçadas, aos modelos de previsão de comportamento e de gestão de população usados pela Biologia.
Palcos
24.06.2024 | por vários
Essas pessoas agora sentiam muito ódio, muito medo, muita insegurança e vulnerabilidade. Mas quantos milhares e milhares de negros tinham experimentado isso ao longo dos tempos? Quantos milhares de negros não sentiram a profunda sensação do absurdo daquilo que lhes estava a acontecer? Quantos milhares de negros não sentiram que a sua vida iria de certeza ter um final trágico? Quantos milhares de negros não viveram e morreram fervendo de ódio nas plantações de café, a trabalhar nas minas, ou apanhados pelas armadilhas da tributação que fazia com que de um dia para o outro dessem consigo em São Tomé nas roças de cacau, onde esgotados pelo trabalho do contrato, chegavam por si próprios à conclusão que nunca mais regressariam para a sua família e para a sua terra. Ninguém lhes escutava os gritos e ninguém lhes limpava as lágrimas, durante anos, décadas e séculos, não houve nem consolo, nem misericórdia.
A ler
21.06.2024 | por Cármen Loureiro Rosa
Após o fracasso das tentativas, o nome completo da criança e o hospital onde o aborto seria realizado foi vazado para uma ativista de extrema direita que convocou uma verdadeira caça às bruxas, endossada por uma horda de seguidores. A menina precisou de entrar escondida, no porta-malas de um carro, no hospital no Recife, no Estado de Pernambuco, onde finalmente conseguiu ter seu direito cumprido, porém precisou aderir ao Programa de Apoio e Proteção às Testemunhas, Vítimas e Familiares de Vítimas da Violência (Provita) e mudar de identidade e endereço para ter a oportunidade de viver sem a perseguição de fanáticos religiosos.
Corpo
19.06.2024 | por Gabriella Florenzano